Conversas obtidas pela Polícia Federal revelaram mensagens trocadas entre o ex-assessor da presidência, o tenente-coronel Mauro Cid e duas assessoras de Michelle Bolsonaro , indicando a existência de instruções para o pagamento em dinheiro vivo das despesas da ex-primeira-dama .
Segundo a transcrição dos áudios do WhatsApp, Cid expressou sua preocupação com a possibilidade de o mecanismo ser descoberto.
Os áudios revelam a preocupação de Mauro Cid e mencionam os gastos de Michelle Bolsonaro - que supostamente foram pagos em dinheiro vivo e comparou a situação com o caso envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no Ministério Público do Rio de Janeiro, relacionado à prática de "rachadinha".
"É a mesma coisa do Flávio" , disse Cid, que foi preso recentemente por suspeitas de fraude em cartões de vacinação, ao se referir aos pagamentos em espécie, em uma mensagem para a assessora Giselle dos Santos Carneiro , que trabalhava com a ex-primeira-dama.
Existem suspeitas de que Cid possa ter utilizado recursos públicos do Palácio do Planalto para efetuar os pagamentos de forma ilegal, realizando saques em espécie e depósitos em dinheiro vivo de maneira fragmentada, a fim de dificultar a rastreabilidade das quantias. Abaixo, apresentamos todos os fatos conhecidos até o momento sobre o caso envolvendo a ex-primeira-dama.
Despesas no cartão de crédito
A PF descobriu que Michelle utilizava um cartão de crédito vinculado à conta de Rosimary Cardoso Cordeiro , assessora parlamentar no Senado e amiga de longa data da ex-primeira-dama. Cid pagava a fatura do cartão em dinheiro vivo em uma agência do Banco do Brasil localizada dentro do Palácio do Planalto.
Nos áudios, as assessoras de Michelle, Cintia Borba Nogueira e Giselle dos Santos Carneiro da Silva , discutem com Cid sobre o pagamento das despesas. Ambas afirmam que estão tentando convencer Michelle a parar de usar o cartão de crédito da amiga.
Giselle relata a Mauro Cid que conversou com uma pessoa próxima a Michelle, chamada Adriana, e que a ex-primeira-dama ficou "refletindo", mas que ainda continuaria utilizando o cartão de Rosimary. Mauro Cid responde a Giselle e menciona o nome de Flávio Bolsonaro:
"Giselle, mas ainda não é o ideal, não é verdade? (o uso do cartão de Rosimary). A Cordeiro falou com ela (Michelle), certo? E ela ficou com dúvidas mesmo: 'Ah, é assim? É. É a mesma coisa do Flávio. O problema não é quando! É como deputado, rachadinha, essas coisas'" , respondeu.
Suspeita de que o dinheiro público seja oriunto de recursos públicos
A PF também identificou indícios de que Mauro Cid teria utilizado recursos públicos do Palácio do Planalto de forma ilegal, realizando saques em espécie e depósitos em dinheiro vivo de maneira fracionada, configurando possivelmente uma prática de "rachadinha".
No entanto, o relatório policial ressalta que, com base nos dados analisados, é possível identificar indícios de uso ilegal de recursos em espécie e dificuldade na identificação dos responsáveis pelas transferências, mas não há evidências de que os beneficiários dos pagamentos possuam qualquer relação com a Presidência da República que justifique o recebimento de recursos públicos.
Transferências bancárias em valores fracionados
A troca de áudios também revela que o esquema evitava transferências bancárias, realizando os pagamentos sempre em dinheiro vivo. Em uma mensagem de áudio de Giselle para uma pessoa chamada Vanderlei, a assessora menciona a necessidade de realizar os pagamentos "em depósito":
"Boa noite, Vand e Cintía. A PD (Primeira-dama) disse, eu perguntei a ela se ela queria transferir por Pix, certo? Tanto para Bia. Então, ela disse: não, vamos fazer tudo em depósito, aí peça para o Vanderlei fazer o depósito, nós conseguimos o dinheiro e fazemos o depósito. Mas ela não disse como conseguiu o dinheiro, se o dinheiro está com ela, se pegamos na AJO. Não disse, entendeu? Ela disse que assim não fica registrado nada, vamos fazer o depósito. Então, temos que começar a adotar esse hábito do depósito, certo?" , disse Giselle.
"Caixa paralelo"
Em janeiro, uma reportagem do portal Metrópoles já havia mencionado o ex-assessor como responsável por pagar as despesas do clã presidencial em dinheiro vivo, levantando a suspeita de que Cid operasse uma espécie de "caixa paralelo" por meio de saques dos cartões corporativos. Na época, esse esquema foi negado por Bolsonaro.
PGR defendeu descartar áudios
A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, defendeu o descarte dos áudios e a não quebra do sigilo bancário na investigação sobre os pagamentos em dinheiro vivo das despesas de Michelle.
Em sua manifestação, Lindôra solicitou ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que o material compartilhado com outros dois inquéritos seja retirado e que o caso seja arquivado.
Essas provas foram coletadas pela Polícia Federal com autorização judicial para investigar possíveis irregularidades nas transações realizadas pelos assessores do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Lindôra é próxima do procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado por Bolsonaro para o cargo, e é considerada uma das integrantes da PGR mais alinhadas ao ex-presidente.
Boletos do irmão de Michelle
A PF aponta que a hipótese de desvio de recursos da Presidência foi fortalecida com a identificação de pagamentos de boletos para um irmão da ex-primeira-dama. Em 1º de setembro de 2021, uma das assessoras enviou a Cid um boleto referente ao plano de saúde do irmão de Michelle.
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