Monteiro afirmou que pagou morador de rua para cometer o crime
Hermes de Paula/Agência O Globo
Monteiro afirmou que pagou morador de rua para cometer o crime

Em depoimento ao Conselho de Ética no processo por quebra de decoro parlamentar pelo vereador Gabriel Monteiro (PL) , o ex-editor de vídeos e estudante de Marketing Heitor Monteiro de Nazaré Neto relatou que a equipe multimídia que produzia vídeos — que inclusive eram monetizados nas redes sociais — propôs ao político realizar uma série de produções com mensagens positivas, como de prevenção ao suicídio. 

Gabriel, no entanto, teria se recusado, porque queria abordar pessoas que pareciam ter perfil de "gansos" e que, de preferência, fossem negras. No jargão da polícia, "ganso" é uma referência a suspeitos de envolvimento com o tráfico de drogas.

“Gabriel descreveu os alvos para a gente. Eram pessoas negras, que estavam mais propícias a aceitar esse tipo de situação. Ele via uma pessoa do cabelo colorido, uma pessoa negra, assim sem estar vestida com uma roupa de marca, então era aquele padrão que ele queria que a gente abordasse. Ele intitula como ‘ganso’, padrão ‘ganso’ que ele fala’”, declarou a testemunha.

Em nota divulgada no domingo, a assessoria de Gabriel Monteiro acusa Heitor e outros ex-assessores que o denunciaram como pessoas que teriam sido cooptadas pela chamada "Máfia do Reboque", que o vereador afirma ter desmontado na gestão de estacionamentos e carros-guinchos da cidade. Os advogados da testemunha negam veementemente essa versão.

'O canal dele é porrada, tiro e bomba'

Heitor Monteiro, que primeiro trabalhou como estagiário da produtora de Gabriel e posteriormente ganhou cargo no gabinete na Câmara dos Vereadores, onde continuou a produzir vídeos, afirmou que Gabriel queria forjar as situações por entender que ‘’o canal dele é de porrada, tiro e bomba’’:

“A gente chegava para o Gabriel, por exemplo, e falava: ‘Gabriel, vamos fazer um experimento social de uma pessoa com uma placa escrita que a pessoa está com depressão e precisa de um abraço, e deixar essa pessoa vendada no meio da rua, para ver quem vai tomar a atitude de ir lá abraçar essa pessoa que está com depressão, ou que quer se matar, e tudo mais.’”

As sugestões, porém, declarou a testemunha, não eram atendidas porque o objetivo seria constranger quem seria abordado.

“A gente chegava com essa proposta, e ele dizia: 'Não, que tal a gente botar uma pessoa e essa pessoa, na hora em que for abraçar a pessoa que está sendo abraçada, roube ela?'. Ele sempre tenta adicionar coisas que levem para o lado que possa constranger.”

O ex-assessor contou que em determinadas situações, ele se sentia muito desconfortável, já que entre populares que foi orientado a abordar estavam pessoas que ele já conhecia de vista:

“Eu cresci aqui no Centro da cidade, era morador daqui, antes de me mudar (...) conheço muita gente aqui. Aí, sempre que as gravações eram aqui no Centro, era eu quem fazia as manipulações. Então, teve certo dia o Gabriel pediu para eu abordar uma pessoa que eu conhecia de vista, e eu neguei. Ele ligou e começou a me esculachar, e falou que eu era um soldado”, disse a testemunha.

Os chamados experimentos sociais foram questionados pelos integrantes do Conselho de Ética durante os trabalhos. O ex-assessor Vinicius Hayden Witeze, que dias depois morreria em acidente de trânsito em Teresópolis, declarou em depoimento que a produção dos vídeos que Gabriel monetizava na internet não tinham qualquer base científica ou orientação de especialistas, como psicólogos.

Heitor contou ainda que integrava a equipe que abordou uma criança de 10 anos no Recreio dos Bandeirantes. Segundo ele, Gabriel a levou para lanchar em um shopping, em vídeo que viralizou nas redes sociais. 

O político, que montou uma vaquinha virtual para arrecadar fundos para mãe e filha, é acusado de expor a criança ao orientar sobre o que deveria dizer no vídeo, o que fere o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “A mãe participou à distância (...)”, disse Heitor.

Dois vídeos em que Gabriel aparece com crianças, entre os quais da menina de 10 anos, estão entre os fundamentos da denúncia que motivaram a aprovação por unanimidade pelo Conselho de Ética (sete votos a zero) do relatório do vereador Chico Alencar (PSOL) que propôs a cassação do mandato de Gabriel por quebra de decoro parlamentar. 

Os outros fundamentos são os seguintes: a gravação e divulgação de um vídeo em que aparece mantendo relações sexuais com uma adolescente de 15 anos e devido a agressão de um morador de rua na Lapa, durante a gravação do que alegou ser um "experimento social". 

Por causa do vídeo com a menor, a Justiça declarou medidas protetivas para que Gabriel fique longe da adolescente e a política o denunciou à Justiça.

A previsão é que a proposta do Conselho de Ética seja votada no plenário do Palácio Pedro Ernesto na próxima quinta-feira. Para Gabriel Monteiro perder o cargo, são necessários 34 dos 51 votos favoráveis (2\3 do total). Na prática, 50 estarão aptos para deliberar porque Carlos Bolsonaro (Republicanos) está de licença.

No depoimento que prestou ao Conselho de Ética, a mãe admitiu que nem sempre estava ao lado da filha nas gravações, como afirmou Gabriel. A responsável pela criança também derrubou a versão dada por Gabriel que a criança vendia bala na rua e sequer almoçara naquele dia.

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