Ao chegar na sede da Superintendência da Polícia Federal — após ser preso em casa, nesta quinta-feira, em Nilópolis, durante a Operação Hostes — o vereador do município da Baixada Fluminense Mauro Rogério Nascimento de Jesus (PSD) segurava em uma das mãos uma bíblia. Em seu terceiro mandato no cargo, quando falava em plenário ou com eleitores, sempre citava passagens religiosas, mas quando o assunto era a milícia que comandava na região, Maurinho do Paiol mostrava um lado sanguinário. Ele, inclusive, tinha um acordo e fez uma espécie de consultoria com o falecido miliciano Wellington da Silva Braga, o Ecko, quando este comandava a maior milícia do Rio de Janeiro.
Policial militar da reserva, Maurinho do Paiol conquistou seu primeiro mandato como vereador na cidade em 2012. Desde então, segundo a investigação, chefiava a milícia montada com apoio de alguns companheiros dos tempos de PM. Em 2019, já em seu segundo mandato, o miliciano tinha o objetivo de expandir os negócios de sua quadrilha para municípios vizinhos, como São João de Meriti e Mesquita.
Para isso, procurou o então líder da maior milícia do estado, o Ecko, que tinha como principal ponto de atuação a Zona Oeste da capital. Ambos firmaram uma espécie de aliança e Maurinho realizava algo como uma consultoria, já que pega instruções de como agir e em quais negócios focar para expandir a atuação de seu bando. Ecko, inclusive, enviou homens e armamento para fortalecer o bando em Nilópolis e evitar tentativas de tomada de terreno por grupos rivais.
O reforço ajudou a quadrilha a se expandir para regiões em São João de Meriti, onde controlavam o serviço de fornecimento ilegal de sinais de internet e TV a cabo, o chamado Gatonet, a venda ilícita de cigarros e de botijões de gás, além do serviço de mototáxi. No comando de tudo, Maurinho do Paiol usava do cargo de vereador para, segundo a investigação, coordenar as ações criminosas, inclusive homicídios.
"Eles agiam de diversas maneiras, com informações privilegiadas para garantir que pessoas a eles vinculadas explorassem serviços públicos e privados. O vereador Maurinho é envolvido com a prática de homicídios. Inclusive, ele está envolvido em um inquérito que tramita na Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense. A partir dos elementos, ficou corroborada a participação dele em diversas empreitadas criminosas", disse a promotora do Gaeco, Mariana Segadas.
A participação, como informado pela promotora, pode ser comprovada em escutas telemáticas do vereador, onde ele mostra o lado sanguinário, dizendo que irá mandar matar.
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"Meu irmão, eu só vou te falar uma coisa pra você. Esses caras, quando fizeram uma judaria comigo, é por causa de deus que tem ouvido as orações dos outros (...) e meus irmãos. Por ele sabe que se machucar um da gente f*..., amigo. Vai ter banho de sangue, sabe qual é? Pode até tentar, mas se fizer tá f*... nós somos unidos. É, mas se pegar moleza vai ter que matar os 4. Não adianta matar só um só e ficar ... vou mandar matar e ‘tirar’, e aí? O que tu imagina?", escreveu Maurinho do Paiol em um aplicativo de mensagens, conversando com membros da quadrilha.
Após os contatos com a quadrilha de Ecko, Maurinho passou a ter uma postura quase empresarial no gerenciamento dos negócios ilícitos. Uma de suas exigências era o pagamento correto e devido dos repasses arrecadados com as práticas criminosas. Em uma escuta flagrada pela investigação, dois integrantes da quadrilha, Diego Nunes Rayol e Alessandro Roberto dos Santos Pereira, o Costinha, discutem e cobram outros dois milicianos, Wellington do Nascimento Mello e Felipe da Rocha Dias, sobre o repasse do dinheiro ao chefe.
Rayol: "De novo isso? Seu Felipe e Seu Mello, né. Eles que ficaram com esse dinheiro do Maurinho aí. Na última vez aí que o Maurinho chiou, que foi aquela vez lá que pensaram que o dinheiro passava pela minha mão, Felipe foi lá rapidinho e resolveu. Felipe e Mello. Eles que têm que resolver. Fala pra ele. Tem que chamar logo o Felipe ‘Qual é, Felipe? Tu não tá mandando o dinheiro do Maurinho não, cara?’. Ele falou pra você que tá a quanto tempo já sem seguir o dinheiro dele? Felipe tá assim, tá deixando empurrar com a barriga. Tá deixando o cara reclamar pra depois mandar. Aí atrasa, atrasa, atrasa. O cara reclama. Aí depois manda".
Mello: "É. Esqueci mané. Que o Maurinho também é chato pra “caraca” quando é o dele".
Depois de ser levado para a sede da Superintendência da Polícia Federal, por também ser policial da reserva remunerada, o vereador Maurinho do Paiol foi encaminhado para o Batalhão Prisional Especial da Polícia Militar, onde permanecerá preso.
Em nota, a Câmara Municipal de Nilópolis informou que aguarda comunicado oficial da defesa do vereador e da autoridade judiciária responsável pela investigação para que, de posse das tipificações penais do caso, possamos analisar, sob a ótica do Regimento Interno, eventuais medidas cabíveis.