Petrópolis
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Petrópolis

No terceiro dia após a tempestade que devastou Petrópolis, foi difícil encontrar lugar para esperança na paisagem. Parentes e amigos seguiram na dolorosa peregrinação por informações sobre as vítimas. Da noite de quinta para a manhã de ontem, o total de mortos passou de 117 para 136, como divulgado pela Polícia Civil, ultrapassando as 134 vítimas daquela que, em 1988, era considerada, até então, a maior tragédia na história da cidade serrana. O registro de desaparecidos da Delegacia de Descoberta de Paradeiros (DDPA) quase dobrou: subiu de 116 para 213. Imensos volumes de terra e destroços continuaram a ocupar os socorristas na região e indicam que o tamanho real da tragédia ainda é desconhecido.

Divergências nos números de desaparecidos contribuem para manter o cenário de incerteza. O Ministério Público do Rio tem uma lista própria, com 57 nomes. O salto no total de desaparecidos informado pela DDPA, no entanto, permite supor que a quantidade de óbitos também tende a aumentar. Até ontem à noite, 131 corpos tinham sido identificados — na maioria (81), mulheres.

Em diversos pontos, a população se mobiliza com os recursos que tem. É o caso da Chácara Flora, um dos locais mais afetados pela chuva. Por lá, o acesso continua dificultado pela grande quantidade de destroços que fecham ruas e vielas.

— A minha casa foi derrubada, eu perdi dois filhos, minha mãe foi soterrada. O meu irmão e os vizinhos salvaram a gente. Ficamos quase duas horas soterradas. Os vizinhos tiraram a gente na mão. Tudo quanto é lixo estava em cima da gente — contou a dona de casa Jussara Aparecida Luiz, que só saiu viva porque vizinhos cavaram a terra com as mãos para retirá-la.

Desesperada, sobre os escombros, ela ontem gritava os nomes dos filhos — uma jovem de 18 anos e um menino de 2 — enquanto acompanhava voluntários e bombeiros que tentavam chegar ao local mais crítico:

— Eu só quero tirar meus filhos dali. Meu coração de mãe está falando que é só tirar eles dali. Giulia! Antony!.

Em coletiva ao lado do presidente Jair Bolsonaro, que ontem visitou a cidade, o governador Cláudio Castro afirmou que o número de equipes de buscas (quase 500 bombeiros) é “suficiente”:

— Há um problema sério de trânsito, do local estar instável. Não adianta botar 2, 3, 4 mil pessoas ali como parecem querer. Isso quem manda é a técnica. Estamos com um número suficiente, de acordo com o que a técnica manda. Não adianta querermos encher de gente, pois vai criar mais confusão e dificilmente vamos conseguir ajudar a população.

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Ajuda vem de Cuiabá

Reforços pontuais estão a caminho: a pedido do próprio governo do Rio, 12 bombeiros com quatro cães sairão hoje de Cuiabá, no Mato Grosso, rumo ao município serrano.

Famílias como a do ascensorista Antônio Carlos dos Santos, de 56 anos, vivem angústia sem fim. Parentes correm atrás de seu paradeiro: eles acreditam que Antônio Carlos estava em um dos ônibus que, arrastados pela chuva, afundaram no Rio Quitandinha. Irmão de Antônio Carlos, o pintor Silvio Marcio dos Santos esteve ontem no IML.

— Ele morava no Alto Independência e tinha vindo ao Centro, à igreja católica que frequenta para rezar. Acreditamos que ele estava num daqueles ônibus — contou o pintor, ainda sem notícias. — Já fomos a quatro hospitais. Estamos no IML, mas não sabemos se ele está aqui.

João Souza, de 65 anos, e Maria de Fátima dos Anjos, de 64, foram duas das 17 pessoas enterradas ontem, até o início da tarde, no cemitério municipal. No velório, Regina Lisboa, irmã de Maria, contou ao RJTV, da Rede Globo, que quatro pessoas da família ainda estavam desaparecidas.

Professor do Programa de Pós-Graduação em Segurança e Defesa Civil da Universidade Federal Fluminense (UFF), Elson Antonio do Nascimento acredita que o Estado do Rio deveria reforçar suas equipes de salvamento:

— É importante não promover aglomerações num mesmo local de resgate. Acontece, porém, que Petrópolis tem muitos locais de resgate. Não adianta realizar uma busca intensa em um ponto e não ter recursos suficientes para outro. Para salvar pessoas, é preciso pessoal e equipamento.

Para Gerardo Portela, doutor em gerenciamento de riscos da Coppe/UFRJ, faltou liderança em Petrópolis já no momento em que os sistemas meteorológicos alertaram para a ocorrência de chuvas fortes na região. Para ele, alguma autoridade deveria ter tomado a frente para avisar a população dos riscos. Diante do caos que se instalou na cidade, ele acrescenta:

— Em Petrópolis, houve o colapso absoluto da capacidade de resposta à tragédia.

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