Complexo do Salgueiro: de 5 mortos, 4 não têm antecedentes por tráfico de drogas

Corpos encontrados na localidade da Palmeira, no Complexo do Salgueiro, foram levados para o Instituto Médico-Legal (IML), onde estão sendo reconhecidos por familiares

Foto: Marcos Porto/Agência O Dia
Corpos encontrados em área de mangue no Complexo do Salgueiro foram retirados pelos próprios moradores e envolvidos em lençóis brancos

Pelos menos a metade dos homens mortos durante uma  ação da Polícia Militar na localidade da Palmeira, no Complexo do Salgueiro, não tem anotações criminais por tráfico de drogas. Dos oito corpos encontrados por moradores em uma região de mangue na comunidade e levados para o Instituto Médico-Legal (IML), cinco já foram reconhecidos por familiares. Desses, apenas um era investigado em um inquérito. O delegado Bruno Cleuder, titular da Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá (DHNSGI), abriu um inquérito e o Ministério Público Rio, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada do Núcleo Niterói e São Gonçalo, instaurou um Procedimento Investigatório Criminal para investigar o caso.

Dos cinco identificados, apenas Rafael Menezes Alves, de 28 anos, figura como testemunha e envolvido em uma investigação que apurava tráfico e corrupção de menores. David Wilson de Oliveira, de 23; Kaua Brener Gonçalves, de 17; e Jhonata Klando Pacheco Sodré, de 28, não aparecem como autores ou envolvidos em nenhum outro crime. Já Elio da Silva Araújo, de 52 anos, respondeu a um processo por esbulho possessório, que foi extinto em 2013.

As mortes ocorreram um dia após o sargento da PM Leandro Rumbelsperger da Silva, de 40 anos, ser assassinado, durante um patrulhamento no Complexo do Salgueiro. Segundo o tenente-coronel Major Blaz, a grande maioria dos mortos estavam vestidos com roupas ou itens de camuflagem:

— As primeiras informações dão conta de que esses mortos, em sua grande maioria, estão com roupa camufladas. Fardas de combate, cinto de guarnição, coldres. Essas informações vão de acordo com que os policiais do Bome afirmaram. Já tive acesso a essas imagens, que são muito fortes, e que co-substanciam essa fala. Já temos um criminoso identificado - vulgarmente conhecido como 2k e era foragido da Justiça. A perícia que realmente fará a identificação positiva desses corpos. Sem ser a senhora na última sexta não há nenhuma informação nesse sentido (de moradores feridos ou mortos).

— Todo mundo gostava dele. Era um irmão bom. Não entendemos o que aconteceu. Minha mãe está a base de remédios com essa tragédia — disse a estudante Kailane Jully Gonçalves, de 15 anos irmã de Kauã.

A funcionária pública Cleonice da Silva Araujo, de 56 anos, veio de Maricá, para acompanhar a retirada do corpo do irmão, Élio da Silva Araujo.

— Aqui ninguém tinha nada contra ele. Se fosse um tiro eu até aceitava. Mas eles degolaram o meu irmão. Infelizmente, a justiça funciona assim. Ele morava aqui há 10 anos. Enquanto continuarem assim, muitas vítimas serão mortas desse jeito — disse.

Já desempregada Milena Menezes Damasceno, de 35 anos, irmã de Rafael Menezes Alves, diz que o rapaz trabalhava como ajudante de pedreiro:

— Meu irmão era nascido e criado aqui. Ele era ajudante de pedreiro e estava na rua quando tudo aconteceu. Ele estava bebendo com os amigos quando os policiais arrastaram ele e fizeram isso.

Investigação

Ao tomar conhecimento dos fatos, o procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos, noticiou à 2ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada do Núcleo Niterói e São Gonçalo, que foi ao local para colher informações preliminares e instaurou um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) para investigar a operação realizada no Complexo do Salgueiro. Um perito integrante do quadro técnico da instituição também foi designado ao Instituto Médico-Legal para acompanhar o exame dos corpos.

"O PIC também vai analisar eventuais violações a direitos praticados quando da execução da operação, tendo sido a ação regularmente comunicada pela Polícia Militar ao MP. A instituição conta com estruturas para prestar apoio a eventuais testemunhas e receber relatos de moradores e entidades sociais que possam colaborar com as apurações. Registra que há um plantão permanente (21 2215-7003 telefone e Whatsapp Business) criado para o recebimento de denúncias, registros audiovisuais e demais informações em caráter de urgência acerca de violações a direitos praticadas no âmbito de operações policiais no Estado do Rio de Janeiro", informou o MPRJ, em nota.

O órgão disse ainda que "adotará todas as medidas cabíveis para o regular desempenho de suas atribuições, visando ao esclarecimentos dos fatos e na apuração dos eventuais ilícitos praticados".