O relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL), disse que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mentiu em seu discurso na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Na sessão da CPI, Renan chamou Bolsonaro "golpista do cercadinho" e de "figura rudimentar, anacrônica e transitória", e afirmou que o discurso mostrou a "República do cercadinho". É uma referência ao grupo de apoiadores de Bolsonaro que costumam se juntar num cercadinho na entrada do Palácio da Alvorada, com quem presidente costuma conversar. Nesses encontros, Bolsonaro não se expõe a críticas e encontra uma plateia simpática a suas ideias.
O relator da CPI fez referência a outros episódios ocorridos em Nova York, onde fica a sede da ONU, como a impossibilidade de Bolsonaro frequentar restaurantes por não estar vacinado, e protestos contra o presidente.
"Verificamos na prática que vergonha definitiva desconhece limites. Os vexames na ONU do presidente da República vão desde vaias, puxadinhos, proibição de acesso por falta de vacinação, advertências públicas do prefeito de Nova York, e a negação universal das vacinas diante do primeiro ministro do Reino Unido. O discurso lamentavelmente pífio na Assembleia mostra ao mundo a República do cercadinho, uma vergonha para todos os brasileiros, a exumação da insignificância", disse Renan.
O relator da CPI continuou:
"Único líder do G20 não vacinado, Bolsonaro repetiu seu papel de figura rudimentar, anacrônica e transitória, e propagador de mentiras. Seu discurso foi uma mentira só do começo ao fim. O Brasil perdeu a credibilidade internacional."
Depois, Renan citou alguns pontos específicos do discurso. Bolsonaro negou por exemplo casos de corrupção no governo.
"E a corrupção negada por ele na ONU foi comprovada em diversas oportunidades na CPI, como propinas [na negociação de vacinas]", disse Renan, acrescentando: "Diante de mais de 20 irregularidades reveladas pela CPI, o governo foi ao final coagido a rescindir o contrato."
Bolsonaro voltou defendeu o tratamento precoce, mesmo que os remédios usados não tenham eficácia comprada.
"Na contramão do mundo, da ciência, pregou para todo o mundo tratamento precoce, responsável por muitas mortes o Brasil", afirmou o relator da CPI.
Boslonaro disse ainda que milhões de brasileiros foram às manifestações de Sete de Setembro, de apoio ao governo.
"Bolsonaro também mentiu sobre a participação de milhões na manifestação de Sete de Setembro. Não foram mais do que 30 mil pessoas, e hoje sabemos a que custo. O golpista do cercadinho repetiu seu negacionismo e sua limitação cognitiva para todo mundo. A frieza nas reações após dez minutos de fake news sobre o Brasil foi eloquente sobre a sua irrelevância", concluiu Renan.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), também criticou o discurso. Ele lembrou experiências mal sucedidas no Brasil de tratamento precoce, como o aplicativo Tratecov do Ministério da Saúde e a operadora de plano de saúde Prevent Senior. E disse que só Deus para mudar a cabeça de Bolsonaro.
"Hoje, uma das coisas mais tristes, mais lamentáveis, depois de assistir o que aconteceu na minha cidade, Manaus, em que o Tratecov foi utilizado com o povo do Amazonas como cobaia, ver o que a Prevent Senior fez com seus pacientes, o presidente ir ao órgão mais importante do mundo e, ao mundo, defender o tratamento precoce. Eu acho que pouco ou quase nada podemos fazer sobre isso", disse Omar.
Em seguida, acrescentou:
"É inadmissível que o chefe da nação de 220 milhões de brasileiros se contraponha à ciência mundial sem nunca ter passado perto de uma faculdade de medicina, ouvindo pitaqueiros, gabinetes paralelos, e nos envergonhar perante o mundo defendendo algo que nenhum cidadão do mundo defende. Mas o nosso presidente nos dá de presente hoje, depois de quase 600 mil mortes, baseados em tratamento precoce, em imunização e rebanho, e ele faz um discurso nesse sentido. Aí, como diria pessoas que eu conheço, em quem tenho muita fé, só Deus para mudar a cabeça de um ser humano que fala em tratamento precoce quando o mundo fala em vacina."