Três testemunhas foram ouvidas na última segunda-feira (16), no início da sessão do Júri do processo contra cinco policiais acusados pelos 13 homicídios no episódio que ficou conhecido Chacina da Nova Brasília, no Complexo do Alemão, no município do Rio de Janeiro , em outubro de 1994. A chacina tinha sido arquivada pelo Ministério Público do Estado.
A denúncia foi aceita pelo 1º Tribunal do Júri da Capital em 2013, após o caso ser desarquivado por decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que condenou o Estado brasileiro a prosseguir com as investigações, que tinham sido paralisadas.
Em novembro de 2018, os réus Rubens de Souza Bretas, José Luiz Silva dos Santos, Carlos Coelho Macedo, Ricardo Gonçalves Martins e Paulo Roberto Wilson da Silva foram pronunciados por homicídio duplamente qualificado. O sexto réu, o PM Plínio Alberto dos Santos Oliveira, teve extinta a punibilidade por ter falecido.
A sessão é presidida pela juíza Simone de Faria Ferraz. A chacina teria sido cometida como uma represália a um ataque à delegacia de Bonsucesso, onde um policial civil foi atingido por um tiro de fuzil e perdeu uma das pernas. Homens armados passaram de carro atirando e atingiram o policial, que estava na porta da delegacia. Mais de 50 policiais civis e militares teriam participado da represália.
Testemunhas
A primeira testemunha de acusação, que tinha 17 anos na época, afirmou que acordou com o barulho de tiros e helicópteros de madrugada. Ela estava na casa de uma amiga, invadida por policiais que perseguiam um morador, que conseguiu fugir.
Os policiais então passaram a agredir com pedaços de madeira tirados de uma cama as três pessoas que estavam na casa, além de abusar sexualmente das duas mulheres que estavam no local. Na sessão, a vítima reconheceu um dos policiais, após um pedido de reconhecimento feito pelo Ministério Público e deferido pela magistrada.
A segunda testemunha, que estava na mesma casa, era moradora do Engenho da Rainha e tinha ido à Nova Brasília para um baile. Ela contou ter sido agredida e abusada por um policial apelidado de “Rambo” ou “Turco”, que seria Rubens de Souza Bretas e que os agentes levaram sapatos e uma TV da casa, amarrados num lençol.
A mulher, também adolescente à época, acordou com os tiros, mas só soube das mortes de manhã, quando, numa padaria, foi informada de que três homens tinham sido mortos numa casa próxima. Entre os mortos, estava Adriano, namorado da testemunha.
As duas mulheres ficaram com hematomas e lesões decorrentes da tortura. Elas contaram terem ido ao hospital Salgado Filho pela manhã cuidar dos ferimentos. O processo pelos crimes de estupro e atentado violento ao pudor tramita em segredo de Justiça na 35ª Vara Criminal do Rio de Janeiro.
Defesa
O delegado José Secundino foi à primeira testemunha de defesa a depor. Ele disse conhecer todos os réus e contou não ter participado da operação nem dos confrontos. Secundino era plantonista da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) há menos de um ano quando da chacina e foi o primeiro a chegar ao local.
Posteriormente, foi substituído pelo delegado titular Maurício Moreira, que depois seria exonerado por causa da coordenação da operação, que resultou na chacina. Secundino afirmou não ter visto os corpos colocados em uma praça, onde tinha escrito em uma das paredes: “Senhor, obrigado por mais um dia”.