O presidente do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), o desembargador Cláudio Tavares, indeferiu, na manhã deste domingo, o pedido da defesa da pré-candidata à prefeitura carioca Cristiane Brasil (PTB) de relaxamento de prisão. Os advogados de Cristiane ainda pediram que, no caso de ela não ser solta, que a prisão preventiva fosse substituída por prisão domiciliar ou monitoramento por tornozeleira eletrônica. Tavares negou ambos os pedidos.
Christiane foi presa na segunda fase da Operação Catarata, do Ministério Público do Rio (MPRJ), acusada de receber propina em dinheiro quando comandou a Secretaria Municipal de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida e de usar sua influência política, mesmo depois de deixar a pasta, segundo o empresário Bruno Selem, que fez um acordo de delação premiada homologado pelo Tribunal de Justiça.
No habeas corpus, a defesa de Cristiane, além de alegar que os fatos seriam antigos, argumentou que ela está em acompanhamento médico de psiquiatria desde fevereiro de 2018, sendo inclusive diagnosticada com "transtorno misto depressivo ansioso". Segundo os advogados, ela faz uso de remédios neurológicos como Rivotril, Prisma e Lexapro.
Em sua decisão, o desembargador Cláudio Tavares ponderou que o sistema prisional fluminense estava tomando todos os cuidados para que os detentos tenham um tratamento saúde adequado, principalmente neste período de pandemia e explica: "De igual sorte, é sabido que a Seap (Secretaria de Estadual de Administração Penitenciária) vem aplicando protocolo de biossegurança à população interna de suas unidades, verbi gratia, isolamento inicial, uso de máscaras, face shield e monitoramento de sintomas e temperatura. Ademais, a paciente estaria exposta à fortuita contaminação no ambiente liberto de igual sorte. O STJ já firmou entendimento que, individualmente analisada, a pandemia não é causa hábil a permitir a substituição da prisão preventiva por domiciliar ou outras medidas cautelares”.
Também foi alegado pelos advogados Luiz Gustavo Pereira da Cunha, Rodrigo Mazoni Curcio Ribeiro, Fernanda Reis Carvalho e Rafael Faria, que assinam o pedido, que o Tribunal de Justiça do Rio estava demorando a julgar o habeas corpus impetrado pela defesa. Por isso, eles entraram com uma petição no Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o tribunal fluminense. A medida fez que, na sexta-feira, o ministro Ilan Paciornik, determinasse que o TJ-RJ julgasse, no prazo de 24 horas, se a prisão dela deveria ser mantida ou não.
O assunto também foi explicado pelo presidente do TJRJ que determinou que o habeas corpus de Cristiane fosse redistribuído, por sorteio, a um desembargador. Cláudio Tavares apenas julgou no fim de semana, porque o STJ determinou que o caso fosse decidido em 24 horas. Como o desembargador do plantão judiciário não era integrante do Órgão Especial, como pedia o ministro Paciornik, o presidente do TJRJ precisou analisar o caso de emergência.
Ao longo da semana, caberá ao novo julgador sorteado decidir se mantém ou não a ex-deputada presa. O relator designado ainda irá verificar se o processo da Operação Catarata se manterá na segunda instância ou na primeira.
A decisão inicial pela prisão de Cristiane, do ex-secretário de Educação do Estado Pedro Fernandes e outros três presos tinha sido proferida pela juíza da 26ª Vara Criminal, Ana Helena Mota Lima Valle. Ela também aceitou a denúncia contra outros 20 alvos da operação, realizada na semana passada. O caso, no entanto, foi para o desembargador Marco Antonio Ibrahim, que integra o Órgão Especial do TJRJ, responsável pela homologação do acordo de colaboração premiada de Bruno Selem. No jargão jurídico, Ibrahim estaria prevento, ou seja, teria que julgar o caso por já ter proferido decisão no processo e porque havia pessoas com foro por prerrogativa de função, no caso, Pedro Fernandes, então secretário de Educação do Estado.
Contudo, com a exoneração de Fernandes na quinta-feira, surgiu uma nova dúvida: se o caso permaneceria na segunda instância ou voltaria para a juíza Ana Helena Valle. O novo desembargador deverá decidir isso.
O que Cláudio Tavares levou em conta para manter a prisão
Para decidir pela manutenção da prisão preventiva de Cristiane Brasil o desembargador observou “o que dos autos consta dá conta que a organização criminosa, hodiernamente, encontra-se ainda operando a engrenagem de desalijo espúrio de disponibilidades financeiras do Estado do Rio de Janeiro, já que a empresa SERVLOG teve o contrato com a Fundação Leão XIII renovado em 2019. (...) Analisando-se o que consta da petição acostada, apura-se que há robusto panorama probatório superficial de que a paciente exerceu pressão política para auferir rendimentos dos contratos cartelizados, e, valeu-se da sua condição de detentora de cargo de secretariado de município e deputada federal para garantir o sucesso da empreitada criminosa.”
Além disso, o presidente do tribunal fluminense explica: “o capítulo da colaboração premiada homologada judicialmente dá conta da constante ingerência da paciente na celebração dos contratos e indicação de pessoas da organização à cargos de controle do certame para garantir a vitória das empresas nas licitações.” Deduz-se, portanto, que “a custódia cautelar se mostra imprescindível para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal. (...) Some-se a isso, os indicativos que apontam para o grau de estabilidade da organização criminosa e do caráter em série da quantidade de delitos supostamente praticados.”
Diz ainda a decisão: “No caso dos autos identifica-se a continuidade delitiva a justificar a medida extrema, dito de outra forma, ainda que os fatos se prolonguem até o início de 2019, a reiteração criminosa é factível revestindo as prisões de contemporaneidade. (...) Note-se que muitas das testemunhas arroladas pelo MPERJ são pessoas comuns não detentoras de cargo público de cunho policial, pelo que é razoável presumir, face influência política, principalmente da paciente, que macularia a prova a ser produzida.”
Leia trecho da decisão
"Trata-se de petição da lavra dos Drs. LUIZ GUSTAVO PEREIRA DA CUNHA, RODRIGO MAZONI CURCIO RIBEIRO, FERNANDA REIS CARVALHO e RAFAEL FARIA aforada perante o Exmº Sr. Desembargador plantonista em favor de CRISTIANE BRASIL FRANCISCO, requererendo seja dado imediato cumprimento à decisão proferida pelo eminente Ministro Joel Ilan Paciornik nos autos do HC nº 614.291/RJ.
Segundo narram, que a decisão do Exmº Sr Ministro Joel Ilan Paciornik teria determinado que o título prisional da paciente fosse analisado em 24horas, prazo o qual já se esgotara.
Que a autoridade detentora de foro por prerrogativa que justificou a avocação dos autos fora exonerada do cargo de Secretário de Estado.
A paciente fora presa, preventivamente, no dia 11.09.2020 em virtude de decreto prisional exarado pelo Juízo da 26ª Vara Criminal da Comarca da Capital, para resguardo da ordem pública e a instrução criminal, por força da segunda fase da chamada “Operação Catarata”.
Que os fatos constantes da denúncia não seriam contemporâneos, bem como inexistentes elementos concretos que indicassem a necessidade da prisão, pelo que, no dia 11.09.2020, requereram a revogação da prisão cautelar ao Juízo prolator.
Que o Juízo teria determinado vista dos autos ao Ministério Público, e, até a presente data não houve análise dos pedidos.
Foi impetrado Habeas Corpus, em 14/09/2020, distribuído ao Exmº Sr. Desembargador Luciano Silva Barreto que requisitou informações à autoridade coatora.
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Que o Exmº Sr. Desembargador Marco Antonio Ibrahim, que integra o Órgão Especial do TJRJ, entendeu ser prevento para a análise dos fatos, uma vez que homologara acordo de colaboração premiada que subsidiou a denúncia, avocou a ação penal e todas as medidas cautelares vinculadas.
Em função da avocação informada, o Exmº Sr. Desembargador Luciano Barreto extinguiu sem mérito o Habeas Corpus primitivamente aforado.
Requereu-se ao relator do Órgão Especial o relaxamento da prisão eis que decretada por autoridade incompetente, entretanto, S. Exª declarou- seu impedido por foro íntimo.
Até a presente data a paciente não teve seu pedido apreciado, pelo que aforou, junto ao STJ, Habeas Corpus, tendo sido determinado que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro proceda a imediata redistribuição da Ação Penal n. 0145722-88.2019.8.19.0001, bem como que realize, em 24 horas, o exame da prisão preventiva da paciente.
Não estariam presentes os requisitos que ensejam a decretação da prisão preventiva uma vez que os fatos que fundamentaram o decreto cautelar não seriam contemporâneos eis que datam de quase dois anos.
Em 30 de julho de 2019, fora deflagrada a dita Operação Catarata”, onde foram cumpridos mandados de busca e apreensão e prisão temporária em face dos então investigados. Dentre os mesmos não figuraria a paciente.
Em 11 de setembro de 2020, foi requerida a decretação da prisão preventiva da paciente não fundamentado em qualquer fato novo posterior às cautelares indicadas.
O pedido foi fundamentado em suposta necessidade de garantia da ordem pública e da instrução processual.
Que não foi observado o princípio da contemporaneidade com violação ao disposto no art. 315, §1º do CPP.
Que os fundamentos utilizados para justificar os requisitos do decreto prisional seriam genéricos e abstratos.
Que a própria denúncia reconhece que a paciente não teria mais influência na organização e já não exerce cargo público há quase dois anos.
Que a prisão decretada seria desproporcional.
Não houve fundamentação dos motivos pelos quais não foram decretadas medidas cautelares substitutivas à prisão.
Não foi levada em consideração a recomendação 62 do CNJ.
Que a paciente se encontra em acompanhamento médico de psiquiatria desde fevereiro de 2018, sendo diagnosticada com “transtorno misto depressivo ansioso”, lhe sendo prescrita a utilização de Lexapro (20mg), Rivotril – 3 gotas pela manhã, Rivotril – 3 gotas à tarde, Rivotril – 3 gotas e Prisma (3g) – 2 comp à noite.
Que a paciente seria candidata ao cargo majoritário na eleição municipal que se avizinha, e, a prisão teria caráter político.
Assim, pretendem o relaxamento da prisão, e, sucessivamente, a revogação da prisão preventiva, a substituição de sua prisão em medidas cautelares, a conversão em prisão domiciliar ou monitoramento eletrônico.
Acosta documentos às fls. 18/397, quais sejam cópia da decisão prolatada pelo STJ, cópia da petição inicial de Habeas Corpus aforado junto à 5ª Câmara Criminal do TJRJ, instrumento de mandato, decisão no bojo do HC da 5ª Câmara Criminal, decisão no âmbito do Órgão Especial do TJRJ avocando a ação de primeiro grau, comunicação da avocação ao Exmº Relator da 5ª Câmara, decisão de extinção sem resolução do HC, pedido de relaxamento de prisão no Órgão Especial, decisão de homologação de colaboração premiada, termo de declaração de Bruno Campos Selem, cópia da denúncia, cópia da decisão que decretou a prisão e cópia de pedido de revogação.
É o relatório,
Passo a decidir.
Inicialmente, cabe registrar que, em se tratando de remédio heroico, não se aplica, o princípio da regularidade formal. Há a fungibilidade plena no que tange à pedidos de avaliação de títulos prisionais dado que mesmo não apresentando, a peça inaugural, o nomem iuris Habeas Corpus, da sua leitura indubitavelmente, se conclui tratar-se da indicada ação constitucional. "