A Justiça do Distrito Federal negou os pedidos do Ministério Público para que o acampamento bolsonarista intitulado "Os 300 do Brasil" seja desmontado e para que seus integrantes passem por uma revista, com busca e apreensão de armas de fogo ilegais. A Justiça também negou a solicitação para que manifestações desses grupos radicais de apoio ao presidente Jair Bolsonaro sejam proibidas. São esses grupos que estão à frente de atos contra a democracia realizados em Brasília, com pedidos de golpe militar e fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso Nacional. O MP do DF vai recorrer da decisão judicial.
A ação civil pública, protocolada às 14h10m de ontem, pede, em caráter de urgência, o fim do acampamento bolsonarista, além de uma revista para verificar se há armas de fogo com os manifestantes e a busca e apreensão de armas em situação irregular. Os promotores de Justiça Flávio Augusto Milhomem e Nísio Tostes Filho, com atuação na 3ª Promotoria de Justiça Militar do DF, chamam o grupo de "milícia armada" e colocam como ré na ação a ativista Sara Fernanda Giromini, de 27 anos, que se autodenomina Sara Winter. Ela é a porta-voz do acampamento. Os promotores pedem ainda que o governo do DF proíba a aglomeração de pessoas para a realização de manifestações na capital, em atendimento aos decretos locais que buscam garantir o isolamento social e barrar a propagação do novo coronavírus.
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Os "300 do Brasil" são formados por apoiadores radicais de Bolsonaro. Os organizadores oferecem a esses apoiadores alojamento, comida e "treinamento com especialistas em revolução não violenta e táticas de guerra de informação". Um acampamento secreto foi montado para alojar e treinar essas pessoas. O grupo tem apoio de parlamentares, especialmente das deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF) e Caroline de Toni (PSL-SC). Kicis, inclusive, já fez a interlocução do grupo com o secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, para tratar de interesses do grupo. Um assessor da deputada integra o movimento. Sara Giromini, que ocupou em 2019 um cargo de confiança no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, a convite da ministra Damares Alves, é quem está à frente do acampamento. Ela já atuou no grupo feminista ucraniano Femen e hoje se diz ex-feminista, bandeira com a qual ganha dinheiro em palestras.
Na decisão tomada a 0h07m desta quinta-feira, o juiz Paulo Afonso Carmona, da 7ª Vara da Fazenda Pública do DF, afirma que o grupo bolsonarista pode estar cometendo o crime de constituição de milícia privada, previsto no Código Penal, com pena de quatro a oito anos de prisão. O magistrado diz, porém, que a esfera cível não é a adequada para tratar de crimes.
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"Este juízo não tem competência para determinar medidas de natureza criminal, como busca e apreensão, revista pessoal, apreensão de armas de fogo irregulares e condução do infrator para delegacia de polícia." O crime de milícia privada deve ser investigado em Juízo Criminal, segundo o juiz, que rejeitou o pedido do MP. Já a proibição de manifestações, conforme Carmona, afronta a Constituição Federal.
"A tutela do direito à vida e à saúde não pode excluir totalmente - ao menos no momento atual - o exercício dos direitos também fundamentais de manifestação do pensamento, de liberdade de locomoção e de reunião", escreve na decisão.
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Sobre o pedido para que manifestantes que desrespeitam as regras de isolamento social sejam levados à delegacia, o juiz diz que isso só seria possível em um cenário de "lockdown", medida não adotada no DF.
"Eventual determinação judicial genérica conduziria a possibilidade de a PM efetuar a detenção de quaisquer pessoas que se aglomerem no espaço público por qualquer motivo, mesmo que casualmente, o que configuraria medida adequada somente em uma situação de lockdown, assim entendida como a medida mais drástica em que há o bloqueio total e temporário de determinado perímetro por profissionais de segurança, no qual ninguém sai ou entra sem expressa autorização, como foi adotado na China, Itália ou Espanha"