Após sair do governo, o ex-ministro da Justiça Sergio Moro prestou depoimento à Polícia Federal, no dia 2 de março, reiterando acusações e apresentou novas provas contra Jair Bolsonaro sobre a suposta tentativa de interferência na órgão. Nesta segunda-feira, Maurício Ramagem, ex-diretor-geral da PF, afirmou que o presidente queria alguém "com mais afinidade" no comando da instituilçao, como contou a colunista Bela Megale. Já o diretor da Abin, Alexandre Ramagem, barrado ao ser indicado para comandar a PF, negou ter "intimidade" com o presidente.
Os depoimentos foram motivados por inquérito aberto pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), a pedido da Procuradoria Geral da República.
Confira a versão de cada um relatada nos depoimentos:
Alexandre Ramagem
O diretor da Abin negou ter “intimidade pessoal” com o presidente Jair Bolsonaro e seus filhos e disse foi “desqualificado” por Sergio Moro por não fazer parte do núcleo de delegados da Polícia Federal próximos ao ex-ministro. No entanto, Ramagem pondera que “mesmo se assim o tivesse não seria motivo para desprezar" seu currículo de trabalhos pela PF.
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Ele aponta como “motivo da sua desqualificação [...] o fato deste não integrar o núcleo restrito de delegados de PF próximos ao então ministro Sergio Moro, uma vez que, diante dos fatos ora relatados, não haveria um impedimento objetivo que pudesse conduzir à rejeição de seu nome”. Ramagem diz que Moro “fez questão” de desqualificá-lo como opção para o posto de diretor-geral da PF “apenas como subterfúgio para indicação própria sua de pessoas vinculadas ao seu núcleo diretivo de sua exclusiva escolha”
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Sobre uma foto em que aparece ao lado do vereador Carlos Bolsonaro, negou qualquer amizade com os filhos do presidente. Segundo o delegado, a imagem é de um réveillon de 2018 para 2019 e “Carlos passou no local para saudar os policiais pelo trabalho executado”.
Maurício Valeixo
O ex-diretor- geral da Polícia Federal afirmou aos investigadores que Jair Bolsonaro gostaria de ter no comando do órgão alguém com “mais afinidade” e que por o presidente teria decidido demiti-l Relatou que recebeu, na noite de 23 de abril, um telefonema do próprio Bolsonaro, que comunicou sua exoneração, e que ele não apresentou objeção ao fato de constar “a pedido” na exoneração. Mas ao contrário do que registrava seu decreto de exoneração assinado pelo presidente, ele nunca pediu formalmente deixar o cargo.
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Valeixo afirmou ainda que nunca recebeu pedidos por parte de Bolsonaro de interferências em investigações ou de acesso a inquéritos sigilosos. Ele admitiu que em duas ocasiões tratou com Bolsonaro sobre investigações — uma sobre o inquérito da facada e outra sobre o caso do porteiro, aquele que atribuiu a Bolsonaro a autorização para um suspeito de assassinar a vereadora Marielle Franco entrar no condomínio onde o presidente morava, no Rio.
Valeixo também afirmou que foi informado pelo próprio presidente Jair Bolsonaro de que seria substituído por diretor de Abin, Alexandre Ramagem . “Respondeu que foi informado pelo próprio presidente da República sobre a intenção de nomear Alexandre Ramagem e que essa substituição se daria por uma questão de afinidade”, diz o documento obtido por “O GLOBO”.
Sergio Moro
Segundo o relato do ex-ministro da Justiça, Jair Bolsonaro ameaçou demití-lo em uma reunião do conselho de ministros do governo federal, no dia 22 de abril, caso ele não concordasse com uma nova substituição do superintendente da Polícia Federal no Rio. A reunião foi gravada pelo Planalto. Bolsonaro teria manifestado sua insatisfação com a falta de acesso a informações de inteligência da PF. Foi essa reunião que deflagrou a crise resultante no pedido de demissão do então ministro da Justiça no dia 24 de abril.
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Bolsonaro teria afirmado expressamente que "queria" a Superintendência do Rio sob sua influência, sem explicar seus interesses específicos nesse cargo. E que uma mensagem recebida do presidente tinha mais ou menos o seguinte teor: 'Moro você tem 27 Superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro'", relatou no depoimento.
O ex-ministro disse também que as reclamações do presidente não eram verdadeiras e que ele repassava informações não-sigilosas a Bolsonaro sobre a deflagração de operações da PF, mas apenas depois que as buscas e prisões eram cumpridas. Ele entregou seu celular para a PF extrair cópias das conversas relevantes para a investigação. O ex-ministro, entretanto, não guardava diálogos antigos, por ter receio de ser alvo de novos ataques hacker.