Em despacho dado na última sexta-feira, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que a Polícia Federal (PF) não pode abrir sozinha um inquérito contra parlamentar da CPI da Covid. Ele é o relator de um pedido da CPI para suspender uma investigação aberta pela PF para apurar o vazamento de documentos sigilosos repassados pela corporação à comissão. Fachin, porém, ainda não tomou uma decisão e vai esperar uma resposta da própria PF antes de determinar a suspensão ou não do inquérito.
Há duas semanas, a PF soltou uma nota dizendo que apuraria o vazamento de documentos que fazem parte de duas investigações em andamento relacionadas à compra da vacina Covaxin. A CPI recorreu ao STF argumentando que tal inquérito acabaria investigando senadores, uma vez que o vazamento, pelo exposto pela PF, teria ocorrido na comissão. Parlamentares, porém, só podem ser investigados com autorização do STF.
"A partir dos elementos fáticos trazidos aos autos, seria muito difícil imaginar que a investigação noticiada poderia não envolver um Senador da República. Ao citar a divulgação pela imprensa de documentos sobre os quais teria sido demandado sigilo à CPI da pandemia, referida nota aparenta reduzir o universo de investigados ao conjunto de pessoas que trabalham na Comissão. Conjunto esse, com as vênias do truísmo, composto também, e de forma necessária, por Senadores da República", diz trecho da decisão de Fachin.
O ministro do STF disse que argumentação da CPI tem "elevado rigor lógico-argumentativo" e "coerência com o corpo de precedentes que informam a jurisprudência dominante deste Supremo Tribunal Federal". Ele escreveu também que não há "espaço razoável para dúvida" quanto à iniciativa de um inquérito contra integrantes do Congresso, que é do Ministério Público Federal (MPF), ou quanto à "proibição de que a Polícia Federal inaugure de ofício inquérito policial para apurar a conduta de parlamentares federais". Por outro lado, Fachin considerou ser indispensável que a PF preste esclarecimentos para poder tomar uma decisão.
As duas investigações foram enviadas pela PF à CPI após requerimento da comissão. Em nota em 4 de agosto, a PF afirmou que enviou a íntegra dos dois inquéritos e os depoimentos de oito pessoas gravados em vídeo e sem qualquer edição: "Em obediência às disposições processuais penais e com o objetivo de resguardar o andamento das investigações, a Polícia Federal solicitou à comissão parlamentar o necessário sigilo das oitivas".
No mesmo dia, alguns senadores da CPI reagiram à abertura da investigação pela PF e anunciaram que acionariam o STF.
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"Temos que dar uma basta nisso", disse Fabiano Contarato (Rede-ES) em 4 de agosto.
"A Polícia Federal não abriu inquérito no caso Precisa. Só abriu quatro meses depois por causa da CPI. A Polícia Federal manda para cá depoimentos incompletos, com suspeita de edição, conforme denunciado aqui pelo senador Rogério Carvalho. O ministro da Justiça, eu acho que deve ser chamar Anderson Torres. Não consta que ele se chama Franz Gürtner [ministro da Justiça nazista]. Então o ministro da Justiça, no alvorecer dessa CPI, dá uma entrevista intimidando, dizendo qual investigação deveria ocorrer aqui. Isso equipara-se a transformar a honrosa Polícia Federal em polícia política. Eles tenham claro", acrescentou o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que ainda fez uma referência às polícias políticas da Alemanha nazista, da Alemanha Oriental e da União Soviética: "Não permitiremos que Jair Bolsonaro transforme a Polícia Federal em Gestapo, Stasi ou KGB".
"Eu gostaria de lamentar o comportamento da Polícia Federal. Eu fui ministro da Justiça. Chefiava a Polícia Federal. Conheço a competência da Polícia Federal. E sei que todos que tentaram utilizar ou aparelhar a Polícia Federal de algum forma deram com os burros n'água. Não vão conseguir. Podem adestrar algumas pessoas", disse o relator na CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), completando: "Vamos até o fim e ninguém vai nos intimidar".
"A PF quer intimidar parlamentares, testemunhas e pessoas que queiram colaborar com a CPI. É uma tentativa de utilização política de um órgão que deve ser, efetivamente, um órgão de Estado. O presidente do Congresso Nacional, o presidente do Senado Federal tem que dar uma resposta política à altura. Se de um lado nós vamos tomar medidas judiciais cabíveis, politicamente temos que responder duramente ao ministro da Justiça, ao presidente da República e ao diretor-geral da Polícia Federal. Isso é coisa que só acontecia na época da Ditadura", disse Humberto Costa (PT-PE).