Bolsonaro pode ferir lei ao inaugurar escola com seu nome
José Dias/PR
Bolsonaro pode ferir lei ao inaugurar escola com seu nome

A decisão do presidente Jair Bolsonaro de exonerar, em junho, os 11 peritos que integravam o grupo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) fez com que pelo menos cinco viagens do grupo previstas para serem realizadas em julho deste ano não ocorressem.

Nessas viagens , o grupo iria fazer vistorias sobre as condições de funcionamento de unidades estatais de internação. Na terça-feira (13), o governo recorreu de uma decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro que determinou a reintegração dos peritos.

Um documento obtido pelo GLOBO mostra que, de acordo com o planejamento feito pelo grupo no início do ano e que teria sido entregue à equipe da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, pelo menos cinco viagens previstas em julho deixaram de ser realizadas.

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Dessas viagens, uma seria destinada a vistoriar as condições de presídios em um determinado estado; duas seriam para a apresentação de relatórios já elaborados pelo grupo e outras duas seriam para monitorar se os estados estavam cumprindo as recomendações feitas pelo mecanismo.

A consequência prática da não realização dessas viagens é que vistorias a presídios e reuniões em estados que vinham sendo fiscalizados pelo mecanismo acabaram não acontecendo.

No dia 11 de junho, o Diário Oficial da União (DOU) publicou um decreto assinado por Bolsonaro exonerando os 11 peritos que faziam parte do grupo e extinguindo os cargos comissionados que garantiam as suas remunerações. À época, entidades em defesa dos direitos humanos argumentaram que a extinção dos cargos comprometeria o trabalho do grupo.

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O governo Bolsonaro , por outro lado, defendeu que a extinção dos cargos representaria uma economia de recursos e argumentou que o grupo continuaria a funcionar, mas de forma voluntária. O recurso apresentado após a decisão da Justiça Federal do Rio, na terça-feira, ainda não foi julgado.

Trabalho 'minado'

O documento obtido pelo GLOBO não identifica o destino das missões porque eles são sigilosos e só eram informados ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH), às vésperas da ida a campo. A ideia é manter o sigilo sobre os destinos para não prejudicar a fiscalização e não colocar a vida dos peritos em risco.

Para o coordenador do mecanismo, Daniel Melo, a realização das viagens vinha sendo prejudicada desde o início do governo, mas situação ficou pior depois da exoneração do grupo, assinada por Bolsonaro .

“A exoneração deu início a todo o prejuízo dessa agenda que a gente tinha previsto. Uma vez que a gente foi exonerado do cargo que nos remunerava e perdemos o apoio, institucional, administrativo e estrutural, ficou impossível colocar isso em prática”, afirma Melo.

Desde junho, os peritos ficaram sem acesso a sistemas informatizados do governo e sofreram restrições para acessar as instalações do ministério. Melo diz que o trabalho do grupo vem sendo “minado” pelo governo .

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“A gente está com nosso trabalho minado e impossibilitado de concretizar até o reconhecimento e cumprimento da liminar para que a gente possa retomar as atividades a todo vapor”, diz o coordenador. 

Melo diz que além das viagens de julho, há outras previstas para os meses de agosto e setembro que estão em xeque. Isso porque, para que as missões sejam realizadas, é preciso que as passagens e diárias sejam solicitadas ao ministério com pelo menos um mês de antecedência. Como a decisão de reintegrar o grupo ainda não foi cumprida, essa demora dificultaria a execução do plano inicial.

Decisão criticada


A decisão de exonerar os peritos do mecanismo foi criticada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em ação movida por ela contra o governo junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Para Dodge , o mecanismo foi capaz de antever as condições precárias nas quais detentos do Amazonas viviam em 2016 meses antes do primeiro massacre em unidades prisionais do estado ocorrer, em janeiro de 2017, matando 55 presos.

Em 2019, um novo massacre aconteceu no mesmo Estado, matando 57 detentos.No plano internacional, o subcomitê da Organização das Nações Unidas ( ONU ) para prevenção da tortura chamou a Missão Permanente do Brasil em Genebra para dar explicações sobre o episódio.

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O MMFDH foi questionado pela reportagem sobre o que levou à não realização das viagens do grupo. Por e-mail, a assessoria de imprensa do ministério disse que as informações sobre o assunto deveriam ser fornecidas pelos próprios peritos .

“[As questões] devem ser destinadas aos próprios membros do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), a quem compete o planejamento de viagens e visitas técnicas”, diz um trecho da resposta.

O ministério disse ainda que o papel do órgão era apenas o de prestar apoio “técnico, financeiro e administrativo” ao mecanismo.


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