Gustavo Petro
Reprodução: Redes Sociais
Gustavo Petro

O coronel reformado José Luis Esparza foi um dos militares mais importantes na histórica Operação Jaque, que em fevereiro de 2012 resgatou, entre outros reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Ingrid Betancourt, que, este ano, o convidou para ser seu companheiro de chapa presidencial.

Esparza, afastado do Exército em 2021 sem explicação e em meio a tensões políticas entre o agora ex-presidente Iván Duque e seu sucessor, Gustavo Petro, conhece como poucos o mundo militar colombiano e assegura, sem rodeios, que a chegada da esquerda ao poder pela primeira vez na História do país causa temor e inquietação entre seus colegas, ativos e reformados.

Em entrevista ao GLOBO, ele declarou temer que Petro busque causar divisões dentro das Forças Armadas, que a partir de agora o terão como comandante em chefe. Uma nova realidade difícil de digerir para muitos, levando em consideração que, na década de 80, Petro pertenceu ao movimento guerrilheiro M-19.

"As tentativas de politizar as Forças Armadas nunca dão certo, temos uma disciplina e uma tradição civilista. Isso deve ficar claro", afirma o coronel que, como muitos de seus colegas, acha que é preciso dar tempo a Petro para mostrar a que veio.

"Fui criticado por dizer que, se a situação se deteriorar, os militares poderiam reagir. Mas não vejo por que tanta crítica, as Forças Armadas são o árbitro da democracia", afirma Esparza, especialista em inteligência militar.

O mundo militar está tenso e expectante. Enquanto Petro tiver expressivo apoio popular — o presidente chega ao poder com aprovação entre 61% e 64% —, os quartéis deverão permanecer tranquilos.

A Colômbia não tem tradição de golpes militares, mas, entre membros ativos e reformados das Forças Armadas, um dos exemplos que costuma ser comentado é o do ex-presidente da Bolívia Evo Morales, que renunciou em novembro de 2019 sob forte pressão das forças policiais e militares.

Militares como Esparza defendem com unhas e dentes as Forças Armadas de seu país — em seu caso apesar, até mesmo, de uma expulsão sem explicação oficial e que causou profundo mal-estar entre seus colegas — e não escondem a preocupação pela guinada política que representa Petro.

Em julho passado, o general Eduardo Zapateiro, ex-chefe do Exército, solicitou deixar o cargo antes mesmo da posse, num claro gesto que buscou evitar a convivência com o novo presidente.

Em entrevista à revista Semana, Zapateiro afirmou que “não vou qualificar nenhum colombiano, estou de saída”. Na mesma entrevista, revelou a mensagem que deu a seus subordinados: “Respeitamos a Constituição e a lei.”

O novo governo colombiano já se reuniu com organizações de militares reformados e, também, da ativa. O veterano político Iván Velázquez, que sempre teve diálogo fluido com grupos guerrilheiros, foi o escolhido por Petro para assumir o comando da pasta da Defesa.

Ele tem dado passos diplomáticos, declarando ter entre seus objetivos melhorar a imagem das forças de segurança do país, prejudicadas por revelações da Comissão da Verdade — que confirmou o assassinato de 6.402 civis, identificados como guerrilheiros nos chamados falsos positivos — e pela repressão à onda de protestos em 2020.

Petro e seu ministro da Defesa confiam em encontrar a maneira de conviver com militares de várias gerações, que foram treinados para enfrentar inimigos internos, com os quais tanto o novo presidente quanto Velázquez mantêm um bom diálogo.

Um dos projetos do novo governo é a chamada Paz Total, que pretende alcançar diversos acordos com grupos narcotraficantes, dissidentes das Farc, o Exército de Liberação Nacional (ELN) e todos os que quiserem negociar. Se para as Forças Armadas foi difícil aceitar o entendimento com as Farc, em 2016, a Paz Total de Petro poderia desatar enorme resistências no mundo militar.

"Petro tem um discurso de luta de classes e pode tentar usá-lo para dividir as Forças Armadas. Se isso acontecer, haverá tensão", frisa o coronel.

O novo governo tem a expectativa de despolitizar as Forças Armadas que há décadas estão alinhadas com a direita colombiana. Existem projetos ainda embrionários que visam eliminar círculos de poder no mundo militar, com o claro objetivo de neutralizar grupos opositores que poderiam tornar-se uma ameaça.

Petro e seus ministros insistem em negar a tensão, mas ela está no ar e antecipa um relacionamento complexo entre um ex-guerrilheiro e os que, em muitos casos, ainda o consideram um inimigo.

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