Punitivismo x garantismo: a diferença entre as turmas do STF

Primeira Turma tende a decisões mais rigorosas; Segunda privilegia garantias processuais

A divisão interna busca agilizar processos, evitando que temas de menor complexidade sobrecarreguem o Plenário
Foto: Arquivo
A divisão interna busca agilizar processos, evitando que temas de menor complexidade sobrecarreguem o Plenário

O STF (Supremo Tribunal Federal) se divide em duas turmas para agilizar julgamentos que não exigem a participação de todos os onze ministros, como ações penais comuns e recursos ordinários.

Cada turma conta com cinco integrantes, enquanto o presidente da Corte, atualmente Edson Fachin, não participa de nenhuma delas.

Veja mais: Fux pede para deixar a Primeira Turma do STF

Atualmente, a Primeira Turma é formada por Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Flávio Dino(presidente).

A Segunda Turma reúne Gilmar Mendes (presidente), Dias Toffoli, Nunes Marques e André Mendonça. O quinto membro era Luís Roberto Barroso, que se aposentou na semana passada.

A presidência das turmas segue rodízio anual baseado na antiguidade dos ministros.

A divisão interna busca desafogar o Plenário, responsável por julgamentos de maior relevância, como ações sobre inconstitucionalidade de leis ou conflitos entre turmas.

Embora ambas tenham competências formais equivalentes, análises históricas indicam tendências distintas em suas decisões criminais.


Diferenças das turmas

A Primeira Turma é associada a uma postura mais punitiva, priorizando a aplicação da lei penal e a repressão a crimes, especialmente casos de corrupção ou crimes de colarinho branco.

Durante a Operação Lava Jato, ministros como Luiz Fux e Alexandre de Moraes frequentemente votaram pela manutenção de prisões preventivas e condenações, refletindo rigor processual.

A Segunda Turma, por sua vez, é considerada mais garantista, com decisões que reforçam o devido processo legal, a presunção de inocência e a revisão de prisões preventivas.

Ministros como Gilmar Mendes e Dias Toffoli concederam habeas corpus e anularam decisões consideradas excessivas, como prisões prolongadas sem julgamento final.

O professor de Direito Daniel Carlos observa que “historicamente, há uma divisão entre as turmas para que os ministros mais parecidos em suas análises fiquem juntos. Durante a Lava Jato, esse comportamento ficou mais nítido, porque a Primeira Turma é mais punitiva e a Segunda Turma garantista”.

Ele acrescenta que, apesar das tendências, a classificação não é rígida: ministros podem adotar posturas diferentes dependendo do caso, e divergências entre turmas são resolvidas pelo Plenário.

Mudanças

Primeira Turma do STF julgou núcleo 4 da tentativa de golpe
Foto: Rosinei Coutinho/STF
Primeira Turma do STF julgou núcleo 4 da tentativa de golpe


Mudanças recentes na composição das turmas também influenciam essas tendências.

A aposentadoria de ministros como Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski e a chegada de novos integrantes, como André Mendonça, Nunes Marques, Cristiano Zanin e Flávio Dino, alteram o equilíbrio das decisões.

Zanin e Dino, na Primeira Turma, podem reforçar posturas mais rigorosas em determinados casos, enquanto Nunes Marques e Mendonça, na Segunda Turma, mantêm decisões voltadas ao garantismo processual.

Um exemplo recente é o pedido de transferência de Luiz Fux da Primeira para a Segunda Turma.

Fux, que votou pela absolvição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em julgamento da chamada trama golpista, argumentando que atos preparatórios não configuram crime, buscaria integrar uma turma historicamente mais alinhada a garantias processuais.

Daniel Carlos explica: “Com o julgamento da trama do golpe, ficou evidente o desconforto dos votos de Fux em relação aos colegas da Primeira Turma. Ele, que sempre teve perfil punitivista, passou a se comportar como garantista. Nada mais natural então que peça essa modificação”.

Rotina

As turmas se reúnem regularmente às terças-feiras, enquanto o Plenário se reúne às quartas e quintas.

A organização em turmas permite ao STF manter fluxo contínuo de decisões, equilibrando a celeridade processual com a preservação das garantias legais, e assegura que o Plenário continue a atuar em casos de relevância constitucional.