Moraes vota para condenar Bolsonaro; veja os principais pontos

Ministro falou por mais de 4h durante o terceiro dia de julgamento

Moraes faz leitura do seu voto
Foto: Reprodução/TV Justiça
Moraes faz leitura do seu voto

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta terça-feira (9) o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)  e de outros sete aliados  suspeitos de tramar um golpe de Estado . O ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, votou a favor da condenação.

O magistrado ocupou toda a primeira parte da sessão com seu voto. Ele rebateu as alegações das defesas dos réus, analisou o mérito do processo e fez uma retrospectiva de todas as provas reunidas no inquérito.

Em vários momentos, se referiu a Bolsonaro como "líder de organização criminosa", cujo objetivo era assegurar a perpetuação no poder, independentemente do resultado das eleições.

O ex-presidente não compareceu à sessão. De acordo com o advogado Paulo Bueno, Bolsonaro enfrenta "limitações médicas" que o impedem de sair de casa.

Após a manifestação de Moraes, a ordem de votação prevista é: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Se houver maioria pela condenação, os ministros passarão à fase seguinte, quando serão definidas as penas dos réus. A expectativa é de que a análise seja concluída até sexta-feira (12).

Moraes rejeita contestações das defesas

Moraes rebateu uma série de questionamentos levantados pelos advogados dos réus nas defesas apresentadas semana passada.

Os advogados alegaram que o STF não seria competente para julgar o caso, que houve falta de provas e, ao mesmo tempo, excesso de documentos no processo. Além disso, eles pediram a anulação da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Para o relator, as alegações são improcedentes. Ele defendeu a validade da colaboração de Cid e que não houve irregularidades no acordo, tampouco coação, como alguns advogados disseram.

Divergência com Luiz Fux

O voto de Moraes foi interrompido duas vezes por Luiz Fux. Na primeira, ele ressaltou que, ao votar, fará questão de se manifestar sobre os pontos levantados pelas defesas, embora eles já tenham sido apreciados anteriormente. Moraes rebateu que todas as questões preliminares já haviam sido rejeitadas, a maioria de forma unânime.

No segundo momento, o ministro Flávio Dino pediu para falar durante a votação de Moraes e recebeu autorização. Após o término da fala de Dino, Fux pediu a palavra e lembrou que havia sido combinado que outros ministros não seriam interrompidos durante o voto.

"Seu presidente, conforme combinamos, os ministros votariam direto, sem intervenções de outros colegas. Muito embora tenha sido muito própria essa intervenção do ministro Flávio Dino. Eu gostaria de cumprir aquilo que combinamos no momento em que eu votar" , disse.

Moraes afirmou que havia autorizado a interrupção, e Fux destacou que se referia ao seu próprio voto, que será proferido entre hoje e amanhã. Dino, então, disse que não pedirá interrupções durante o voto do colega.

Moraes diz que "não há dúvida" sobre a tentativa de golpe

O ministro relator disse que o julgamento não discute se houve ou não tentativa de golpe, mas sim a autoria dos réus.

"De julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023, essa organização criminosa, de forma permanente e organizada, praticou vários atos executórios contra o Estado Democrático de Direito", disse.

O ministro relembrou discursos e transmissões ao vivo do ex-presidente, nas quais atacava o STF e questionava o sistema eletrônico de votação. Essas anotações eram reforçadas por documentos e anotações reunidos pelos aliados do ex-presidente, como Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin, e o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

Lives, 7 de setembro e milícias digitais

O relator relembrou o discurso de Bolsonaro em 7 de setembro de 2021, quando atacou ministros do Supremo. Moraes classificou a fala como uma "grave ameaça" contra o Judiciário.

"Isso não é conversa de bar. Isso é um presidente da República, na data da independência, insuflando milhares de pessoas contra o Supremo", disse.

Moraes também citou a atuação das chamadas “milícias digitais”, que ajudaram a disseminar as informações falsas divulgadas por Bolsonaro em lives, sobretudo sobre fraudes eleitorais.

Segundo o ministro, não eram atos isolados, mas parte de uma estratégia organizada para desacreditar o sistema de votação e preparar o terreno para uma ruptura institucional.

Abin paralela

Em outro momento, Moraes acusou o grupo de utilizar a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) como "célula clandestina" de espionagem. Segundo ele, ministros do Supremo, como Luiz Fux, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso, foram monitorados.

O relator também citou as declarações do ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, de que a Justiça Eleitoral era tratada como "inimiga a ser vencida, derrubada e extirpada". Para Moraes, a postura evidencia o crime imputado pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

Operação da PRF

O ministro citou que milhares de pessoas foram impedidas de votar no segundo turno devido a uma operação da Polícia Rodoviária Federal. Esse impedimento aconteceu, segundo a PF, especialmente em cidades do Nordeste, onde a base eleitoral de Lula (PT) é maior.

"Esse fato foi tão acintoso, foi tão acintoso em relação à democracia. Não houve pudor na consumação desse ato executório, que centenas de pessoas, no dia do segundo turno das eleições, postaram vídeos que estavam sendo impedidos pela Polícia Rodoviária Federal de chegar aos locais de votação", declarou.

Moraes critica Bolsonaro e réus e detalha escalada golpista

Moraes reforçou que o grupo liderado por Bolsonaro ignorou princípios democráticos e colocou o Brasil à beira de um retrocesso de 20 anos, próximo a uma ditadura.

Ele destacou que a tentativa de golpe envolveu diversas ações coordenadas. Uma delas seria o atentado no Aeroporto de Guarulhos, que poderia ter matado centenas de pessoas.


O ministro também citou os acampamentos ilegais e a pressão contra posse de eleitos, que culminaram nos atos de 8 de janeiro.

Punhal verde e amarelo

Após mais de três horas de sessão, o ministro citou o plano "Punhal Verde e Amarelo", que seria o plano elaborado pelos aliados de Bolsonaro para assassinar o próprio Moraes, além do presidente Lula e o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin.

Segundo Moraes, o plano está amplamente comprovado nos autos do processo. O relator disse que o material não foi feito de forma clandestina, mas impresso no Palácio do Planalto, na sede do governo brasileiro, enquanto Bolsonaro estava presente no local, conforme apontado pela PF.

Minuta do golpe

O ministro citou o documento apontado com a minuta de um golpe de Estado. Ele destacou que não há dúvidas sobre o envolvimento de Bolsonaro, que teria discutido os pontos centrais do texto em reuniões com comandantes das Forças Armadas.

"Esse núcleo central começou a burilar, se não pela primeira vez, mas aí começou realmente a redigir o que talvez fosse a redação final do decreto golpista",  diz.

Moraes ainda diferenciou o golpe de Estado em si do crime de golpe de Estado. Segundo ele, tanto o crime de golpe de Estado quanto o de abolição do Estado Democrático de Direito têm como elemento caracterizador a tentativa, ou seja, apenas tentar já é considerado crime.

Moraes finaliza o voto

Após mais de 4 horas e 30 minutos na análise do mérito do processo, Moraes declarou que os réus praticaram todas as infrações penais descritas na denúncia da Procuradoria-Geral da República, sinalizando que pedirá a condenação de todos os acusados.

"Os réus tentaram, com emprego de grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais, em especial o Poder Judiciário brasileiro" , afirmou.

"Diante de tudo exposto, voto no sentido da procedência total da ação penal para condenar os réus Almir Garnier Santos, Anderson Gustavo Torres, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, Mauro César Barbosa Cid, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e Walter Souza Braga Netto pela prática das condutas de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para vítima e deterioração do patrimônio tombado ", disse.

"Em relação a Jair Messias Bolsonaro, pelas mesmas infrações já descritas, e a imputação específica de liderar a organização criminosa. E condeno o réu Alexandre Rodrigues Ramagem pela prática das condutas de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado", prosseguiu.