Depois de dois dias de motim, Hugo Motta (Republicanos-PB), conseguiu reassumir a cadeira de presidente da Câmara.
Passou no meio dos bolsonaristas rebelados depois de uma longa reunião com os líderes dos partidos e anunciou, perto das 22h, que a democracia não se negocia.
Parecia simular o gesto dos soldados norte-americanos que fincaram a bandeira do país no topo da colina de Iwo Jima quando os inimigos japoneses capitularam na Segunda Guerra. Só que com a flâmula do Congresso.
Foi aplaudido pelos dois lados em conflito.
Pelos governistas quando disse que a baderna tinha limites.
E pelos bolsonaristas quando fez loas à capacidade do diálogo na Casa e sinalizou que topa conversar sobre qualquer tema “sem preconceitos”.
Mas a pauta da turma que pede pacificação é uma declaração de guerra: anistia aos golpistas de 8 de janeiro (entre eles Jair Bolsonaro, agora com uma tornozeleira e em prisão domiciliar), o fim do foro privilegiado e o impeachment de Alexandre de Moraes.
Este último é assunto do Senado, também ocupado por bolsonaristas desde a volta ao recesso.
Lá o presidente Davi Alcolumbre (União-AP) promete jogar mais duro, mas nunca se sabe. O próprio partido dele já tinha indicado que engrossaria o motim bolsonarista até a oposição ser entendida.
Antes de voltar à sua cadeira, Hugo Motta havia ameaçado punir os rebelados com a suspensão do mandato.
Foi emparedado com a ameaça de que ele e Alcolumbre poderiam entrar na mira das sanções dos Estados Unidos, assim como Alexandre de Moraes.
O discurso ambíguo do sucessor de Arthur Lira (PP-AL), o negociador do sequestro, deixa entrever que a anistia ganhou sobrevida para que o Congresso voltasse à normalidade.
Normalidade aqui é licença poética.
Não deve haver maior termômetro do adoecimento de um país quando a agenda parlamentar é sequestrada para que pessoas que invadiram e quebraram o próprio Parlamento fiquem livres da punição.
Tudo para que o chefe da gangue ganhe liberdade e siga ameaçando normalmente as instituições do país que se negam a dobrar a espinha para ele.
Ao dar abertura para que essa pauta seja discutida, Motta contradiz o próprio discurso. Fica parecendo que democracia está à venda, sim.
*Este texto não reflete necessariamente a opinião do Portal iG