Diante da iminência de votação do PDL, os ministros Haddad e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), voltaram a defender o decreto que aumentou o IOF
MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL
Diante da iminência de votação do PDL, os ministros Haddad e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), voltaram a defender o decreto que aumentou o IOF

O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta(Republicanos), pautou, para esta quarta-feira (25), a votação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que derruba o decreto do governo que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

O deputado anunciou, por meio de publicação nas redes sociais, que a pauta desta tarde vai incluir a matéria que susta o reajuste do tributo e, com isso, causou desconforto entre a base governista. 

“Fomos pegos de surpresa por um Twitter [atual X], às 23h35. É preciso ter previsibilidade, deveria ter sido chamada uma reunião no colégio de líderes. Hoje é uma sessão virtual, a maior parte dos deputados não está aqui. Um tema dessa importância, dessa gravidade” , disse o líder do Partido dos Trabalhadores ( PT) na Câmara, deputado Lindbergh Farias.

O parlamentar demonstrou contrariedade à decisão de Motta de pauta o projeto e criticou a decisão do presidente da Casa de designar o deputado Coronel Chrisóstomo(PL) como relator da matéria. “Designar o Coronel Chrisóstomo como relator, um bolsonarista histriônico, chega a parecer uma provocação desnecessária” , opinou o líder. 

“Nós temos que ter maturidade. Temas econômicos têm que ter previsibilidade, é o mínimo. E a gente sabe o que vai acontecer agora, a questão é muito concreta: a derrubada desse decreto do IOF significa contingenciamento imediato de R$ 12 bilhões a mais. Já havia tido um contingenciamento de R$ 20 bilhões e um bloqueio de R$ 10 bilhões” , alertou Farias. 

Para o deputado, a parcela mais pobre da população vai pagar por esse contingenciamento adicional, que será adotado caso a movimentação de pautar a derrubada do aumento em uma semana de Congresso vazio seja bem-sucedida. “Novamente estão querendo colocar a conta nos mais pobres. Vamos cortar programa social, cortar da educação, da saúde, do Minha Casa, Minha vida” , afirmou o líder do PT. 

Segundo Lindbergh Farias, ocorreu uma reunião entre representantes do Legislativo e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no domingo (22), em que as partes teriam entrado em um acordo. Entretanto, o governo foi surpreendido com a decisão de pautar o PDL nesta quarta-feira. “A derrubada do decreto do presidente Lula sobre o IOF vai afetar o povo brasileiro. Teremos que fazer cortes em programas sociais e em direitos dos trabalhadores. Nós queremos que os ricos paguem a conta” , disse o deputado. 

Diante da iminência de votação do PDL, os ministros Haddad e Gleisi Hoffmann(PT), voltaram a defender o decreto que aumentou o IOF. “O decreto do IOF corrige uma injustiça: combate a evasão de impostos dos mais ricos para equilibrar as contas públicas e garantir os direitos sociais dos trabalhadores" , argumentou o ministro da Fazenda.

"A derrubada dessa medida exigiria novos bloqueios e contingenciamentos no Orçamento, prejudicando programas sociais e investimentos importantes para o país, afetando inclusive a execução das emendas parlamentares. É hora de pensar primeiro no país, que precisa continuar crescendo e buscando justiça social e tributária" , acrescentou Hoffmann.

Ao saber da inclusão na pauta do dia, o Executivo se articulou para tentar reverter a situação. Às pressas, os líderes do governo realizaram uma reunião no Palácio do Planalto na manhã desta quarta-feira para debater o tema e pediram a Motta que convocasse uma reunião de líderes a fim de discutir a votação, mas o pedido foi negado. 

Por outro lado, a oposição comemorou a decisão de Motta de pautar o PDL 314/2025. O líder do Partido Liberal (PL) na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL), comemorou a inclusão do projeto na pauta do dia e a relatoria concedida à sigla. “O PL ganha um presente, a chance histórica de reduzir impostos abusivos como o IOF e aliviar o bolso de quem trabalha e produz” , disse o deputado. 

O PDL foi uma iniciativa do deputado Zucco (PL), líder da oposição na Câmara. A bancada contrária ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem pressionado para votar o projeto. No último dia 16, os parlamentares aprovaram o requerimento de urgência para a matéria, o que acelerou a tramitação. 

De acordo com Cavalcante, o governo teve uma janela de oportunidade para agir após a aprovação da urgência, mas não apresentou saídas para a alta do IOF, o que forçou o Congresso a pautar a derrubada do decreto. “Nós estamos diante de um governo inerte, um governo que não reage, um governo analógico, que não deu nenhum tipo de resposta desde a votação da urgência” , destacou. 

“Nós votaremos hoje e eu tenho certeza que passaremos dos 310 votos, porque a urgência já teve 346, mas tem alguns partidos que não estão muito convictos quanto ao mérito. Nós teremos mais de 310 votos e daremos uma resposta aos brasileiros” , avaliou o líder do PL. 

O líder Lindbergh Farias está tentando mudar essa expectativa de placar. O deputado convocou a população para uma ação nas redes sociais, com a hashtag "Ricos Paguem a Conta". Apesar disso, o parlamentar falou que o governo já dá como certa a derrubada do decreto e que o gesto de nomear Chrisóstomo como relator demonstra que “não tem espaço nenhum para qualquer tipo de diálogo”. 

Ao Portal iG, o deputado Chrisóstomo disse estar construindo um parecer do PDL do IOF em defesa dos mais pobres. “Defendo não incidir mais impostos no agronegócio, nas passagens áreas, nos automóveis, no pão de cada dia, no bolsa família, no orçamento da educação, no combustível, no gás de cozinha, crédito rural e outros” , declarou. 

“Quero uma relatoria que atenda a economia e deixe os brasileiros mais tranquilos pagando menos impostos. Os brasileiros precisam de paz e uma vida melhor planejada” , alegou o deputado ao iG

Entenda o imbróglio 

Em 22 de maio, o presidente Lula assinou um decreto que reajustou as alíquotas do IOF. Com a decisão, o IOF passou a variar conforme o tipo de operação e o perfil do contribuinte. Nas compras internacionais com cartão de crédito, débito e pré-pago, por exemplo, a alíquota subiu para 3,5%. A mesma taxa passa a valer para a compra de moeda estrangeira em espécie. A justificativa do governo é unificar as cobranças e evitar distorções entre operações de mesma natureza.

Também houve mudança para quem investe em previdência privada. Planos do tipo VGBL com aportes mensais acima de R$ 50 mil passaram a pagar 5% de IOF. Segundo o governo, a ideia é evitar que pessoas com altíssima renda usem esse tipo de aplicação como forma de pagar menos imposto, o que acaba distorcendo o objetivo original do benefício previdenciário.

Já para as empresas, a alíquota na contratação de empréstimos subiu de 0,38% para 0,95%, e a cobrança diária passou de 0,0041% para 0,0082%, com teto anual de 3,95%. No caso do Simples Nacional, o teto subiu de 0,88% para 1,95% ao ano.

Apesar dos reajustes, algumas operações continuam isentas do imposto ou com alíquota zero. É o caso de financiamentos habitacionais, crédito estudantil, empréstimos ligados à exportação, programas de geração de emprego e renda, entre outros.

O governo também havia aplicado um aumento do imposto para os investimentos no exterior. Entretanto, no mesmo dia em que foi anunciado o reajuste, a Fazenda voltou atrás desse trecho do decreto. O receio era de que parecesse uma forma de controlar a saída de recursos do Brasil, o que poderia gerar desconfiança no mercado e prejudicar a imagem do país entre investidores. 

Além do IOF, o governo também anunciou um contingenciamento de R$ 30 bilhões. Essa é uma estratégia que bloqueia temporariamente parte dos gastos previstos no orçamento. Isso acontece quando a arrecadação de receitas, como impostos e contribuições, está abaixo do esperado ou quando há risco de descumprir as metas fiscais, como o teto de gastos. 

Ou seja, com a medida, o governo pode segurar o dinheiro que já estava autorizado para ser gasto, adiando ou limitando sua liberação. O objetivo é manter o equilíbrio das contas públicas e evitar que se gaste mais do que arrecada. 

Segundo a Fazenda, o aumento do IOF e o contingenciamento foram necessários para  garantir o cumprimento da meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias e respeitar o novo arcabouço fiscal, que limita o crescimento real das despesas a 2,5% ao ano. Segundo o Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, enviado pelo Executivo ao Congresso, o crescimento de gastos obrigatórios e a frustração de receitas por causa da falta de compensação da desoneração da folha de pagamento fizeram a estimativa total de déficit primário para 2025 aumentar de R$ 29,5 bilhões para R$ 97 bilhões.

O que mais impactou o déficit, segundo o governo, foi a perda causada pelas despesas como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a queda de R$ 67,5 bilhões na arrecadação, sendo mais de R$ 20 bilhões causados pela desoneração da folha. 

Entretanto, desde que publicou o decreto, o governo tem sido alvo de críticas. Para entidades e parlamentares, a decisão afeta, principalmente, micro e pequenas empresas, o que prejudica o setor produtivo do país. O aumento também gerou uma tensão entre o Executivo e o Legislativo, que passou a pressionar o Planalto por uma alternativa ao aumento. 

Com isso, o governo  publicou, no último dia 11 de junho, um conjunto de medidas, que foram alinhadas com o Congresso Nacional, com foco em corrigir distorções, construir isonomia tributária e manter o equilíbrio fiscal do Brasil. As ações foram tratadas entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre. As conversas também envolveram líderes da Câmara e do Senado.

O pacote incluiu uma Medida Provisória (MP) e um novo decreto do IOF  com alíquotas reduzidas. Mesmo que tenha sido alinhado entre o Congresso e o Executivo, o conjunto de medidas não foi suficiente para conter o avanço do PDL que derruba os efeitos do ato do governo que aumentou o IOF e foi justamente isso que causou espanto entre a base governista.

Pacote proposto pelo governo

A MP 1.303/2025 propõe uma série de mudanças na tributação com o objetivo declarado de corrigir distorções, ampliar a isonomia entre os contribuintes e reforçar o equilíbrio fiscal do país.

Entre os principais pontos, está a previsão de incidência do Imposto de Renda sobre investimentos que, até agora, eram isentos. Isso inclui produtos como LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), LCI (Letra de Crédito Imobiliário), CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures incentivadas. Nessas novas emissões, a alíquota será de 5%.

Para os títulos que já são tributados, o governo propõe uma “harmonização tributária”, estabelecendo uma alíquota fixa de 17,5%, independentemente do tempo em que o investimento for mantido — o que elimina a atual tabela regressiva, que beneficiava aplicações de longo prazo com impostos menores. Essa mesma alíquota passa a valer para criptoativos, que deixam de ter isenção nas transações de até R$ 35 mil. Já a caderneta de poupança segue fora da mudança e permanece isenta.

A MP também altera a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de instituições financeiras. Antes, havia uma gradação de alíquotas (9%, 15% e 20%). Agora, a menor faixa é extinta. Seguradoras, casas de câmbio, instituições de pagamento e sociedades de crédito imobiliário passarão a recolher 15%. Já bancos, sociedades de crédito e instituições de financiamento continuarão sujeitos à alíquota de 20%.

Outra frente da MP é a elevação da carga tributária sobre as apostas esportivas. A alíquota sobre o faturamento das chamadas "bets" sobe de 12% para 18%. Esse percentual não é aplicado sobre os prêmios pagos aos apostadores, mas sim sobre o GGR — receita bruta das empresas, calculada pela diferença entre o total apostado e o valor pago em prêmios e impostos.

A medida também traz dispositivos voltados ao combate a fraudes tributárias. Passam a ser consideradas indevidas, por exemplo, as compensações feitas com documentos de arrecadação inexistentes ou os créditos de PIS/Cofins que não tenham relação direta com a atividade econômica da empresa.

No que diz respeito às despesas públicas, a MP promove ajustes com foco no novo arcabouço fiscal. Um dos pontos é a inclusão do programa Pé-de-Meia — voltado à permanência de estudantes no ensino médio — no piso constitucional da educação. A proposta ainda limita o auxílio-doença a 30 dias quando o benefício for concedido sem perícia médica e estabelece que o pagamento do seguro-defeso a pescadores artesanais fique restrito à dotação orçamentária prevista no início de cada ano.

Além disso, o presidente Lula assinou um novo decreto que modifica as alíquotas do IOF, com o objetivo de simplificar regras, atender demandas do setor produtivo e reduzir distorções entre diferentes instituições financeiras. Uma das principais alterações diz respeito ao crédito tomado por pessoas jurídicas, cuja alíquota fixa do imposto foi reduzida de 0,95% para 0,38%. 

Já nas operações conhecidas como “risco sacado” — quando uma empresa antecipa pagamentos a fornecedores por meio de uma instituição financeira —, a alíquota fixa foi extinta, permanecendo apenas a alíquota diária de 0,0082%. Isso representa, na prática, uma queda de aproximadamente 80% na tributação dessa modalidade de crédito, atendendo a pleitos do setor privado.

Outra mudança relevante trata da aquisição de cotas de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). Para tornar mais equilibrada a tributação entre instituições diferentes que oferecem produtos semelhantes, o decreto estabelece uma alíquota fixa de 0,38% nessas operações.

No caso dos aportes em planos de previdência do tipo VGBL, as novas regras introduzem um critério de limite de isenção por valor aplicado. Até o fim de 2025, o IOF incidirá apenas sobre os valores que excederem R$ 300 mil aplicados em uma mesma seguradora. Essa regra facilita a operacionalização pelas entidades do setor, já que desobriga o cruzamento de dados entre diferentes instituições. 

A partir de 1º de janeiro de 2026, o limite será ampliado para R$ 600 mil, independentemente de os aportes estarem distribuídos em uma ou várias seguradoras. Além disso, as contribuições patronais feitas a esse tipo de fundo passarão a ser isentas de IOF. O governo destaca que mais de 99% dos aplicadores não ultrapassam o teto de R$ 600 mil ao ano e, por isso, não serão impactados pelas novas exigências.

No que diz respeito ao IOF câmbio, o decreto estabelece a isenção do imposto para o retorno de investimentos diretos estrangeiros feitos no Brasil. Essa medida alinha a tributação ao que já ocorre com investimentos estrangeiros no mercado financeiro e de capitais, contribuindo para tornar o ambiente de negócios mais atrativo e competitivo.

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