O Supremo Tribunal Federal ( STF ) formou maioria e derrubou o orçamento secreto do Congresso Nacional nesta segunda-feira (19). Com 6 votos favoráveis o veto a medida e 5 contrários, a Corte considerou as ' emendas do relator ' um instrumento inconstitucional.
Para os ministros, as emendas não têm critérios claros ou transparência. Com o voto do ministro Ricardo Lewandowski, o placar ficou em 6 a 5 para derrubar o instrumento, mesmo após a Casa ter aprovado, na última semana, uma determinação que trouxe uma série de mudanças às regras do dispositivo , com o objetivo de torná-lo mais transparente.
O que é o orçamento secreto?
O orçamento secreto é uma fatia do Orçamento-Geral da União que tem verbas do orçamento público destinadas a projetos definidos por parlamentares. No entanto, esse encaminhamento não é público, portanto apresenta falta de transparência do trânsito do dinheiro.
Essa emenda foi criada em 2019, quando o Congresso ampliou o poder do relator, que passou a liberar valores do Orçamento, em geral, a pedido de deputados e senadores.
A proposta aconteceu no final do mesmo ano pelo hoje ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência e então ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos. A medida foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro e seguiu para o Congresso quando foi aprovada em votação.
O que foi analisado pelo STF?
A Corte analisou quatro ações, apresentadas pelo PV, PSOL, Cidadania e PSB, que questionaram a constitucionalidade das emendas do relator do orçamento secreto.
Até a última quinta-feira (15) 9 dos 11 ministros votaram, terminando com 5 a 4 para tornar a medida inconstitucional . Os ministro Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes pediram mais tempo para análise e a votação só foi retomada na manhã desta segunda-feira, concluindo que o instrumento era inconstitucional por 6 votos a 5.
Como os ministros votaram?
A primeira a votar foi Rosa Weber , relatora do caso e presidente da Corte. A ministra votou na quarta-feira e se posicionou contra o orçamento secreto. Ela afirmou que as emendas desafiam os princípios da impessoalidade, da transparência e da publicidade.
"A controvérsia sobre o orçamento secreto não se restringe, entretanto, à exorbitância aos valores designados ao relator geral do orçamento em cotejo com os valores destinados às demais emendas. Mais alarmante do que a amplitude do orçamento Federal posto sob o domínio de um único parlamentar, somente as negociações em torno do destino a ser dado a esses recursos", afirmou Weber na leitura do voto.
Já André Mendonça votou pela constitucionalidade do orçamento secreto. Ele foi o segundo ministro a votar, o primeiro nesta quinta-feira, e exigiu critérios que garantam a transparência às emendas.
"O tratamento de transparência e publicidade na RP9 não pode diferir das emendas individuais e de bancada", ressaltou no seu discurso. Ele sugeriu ainda que seja estabelecido um prazo de 60 dias para que as novas regras de transparências sejam instituídas.
O terceiro ministro da Corte a votar foi Nunes Marques . Assim como Mendonça, ele se posicionou a favor das emendas do relator, mas apresentando ressalvas sobre as atuais normas de transparência.
“Não creio que um tema com tantas facetas possa ser resolvido em um processo judicial. Ainda mais quando o argumento principal é o favorecimento de grupos. O Congresso é composto de grupos políticos e pode ocorrer de um grupo ou outro ser favorecido”, declarou Marques, ministro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao STF.
O quarto a votar, o ministro Alexandre de Moraes , votou para que as emendas de relator continuem. No entanto, ele defendeu critérios de proporcionalidade, identificação da origem e destino das verbas e maior transparência.
"Essa origem ficou sem transparência, tanto ficou sem transparência que, no momento em que se faz uma pergunta à Câmara, ao Congresso: essa emenda, vem de quê, o que indicou ao relator? Com todo esforço que foi feito pelo presidente do Senado, da Câmara, nós chegamos, salvo engano, em torno de 72% na câmara e 85% no Senado de identificação ao longo de um ano", disse Moraes.
O ministro Edson Fachin foi o quinto a votar e concordou com Weber, votando pela inconstitucionalidade da emenda. Segundo ele, o destino das emenda não é identificável.
“O que nós estamos tratando é de uma alocação racional dos recursos nacionais, que deve ser levada a efeito à luz da Constituição. O RP9 [emendas de relator] presta contas à origem e ao destino? Mesmo nos votos divergentes, fica evidenciado, a resposta é negativa. Esse indicador não cumpre as regras constitucionais”, disse Fachin.
O ministro Luís Roberto Barroso , o sexto votante, também optou pelo fim da emenda. Ele citou um "toma lá dá cá" nas relações entre o poder Executivo e o Congresso.
"Numa democracia e numa República não existe alocação de recursos públicos sem clara indicação sobre de onde provém a proposta e para onde chega o dinheiro e se chega o dinheiro. O orçamento não pode evidentemente ser secreto em nenhuma de suas dimensões”, afirmou Barroso.
O sétimo ministro a votar, Luiz Fux , também acompanhou a relatora. Ele defendeu que o orçamento precisa ser "publicizado".
“Isso não pode ser secreto, tem que ser publicizado como exige a própria Constituição Federal”, argumentou. “Se não há fundamento constitucional e se não há essa transparência, com dinheiro público o segredo não é a alma do negócio", disse Fux.
O oitavo voto desta quinta-feira (15) foi de Dias Toffoli , que votou pela manutenção das emendas de relator, não pela derrubada do orçamento secreto.
"Entendo que é necessário e se impõe regulamentação específica, que são a cargo dos poderes Legislativo e Executivo, para que as emendas de relator atendam aos preceitos e comandos impositivos da nossa constituição", declarou o ministro.
A ministra Cármen Lúcia , última a votar na quinta-feira, optou pela inconstitucionalidade da medida secreta. A magistrada foi na linha de Fux e defendeu que o orçamento seja público.
"Nós temos uma República e não uma entidade estatal de nome de segredo. Segredo é dado ao sagrado, as coisas do Estado e do povo tem de ser de conhecimento e ciência do povo", disse a ministra.
Nesta segunda-feira, o ministro Ricardo Lewandowski votou também pela inconstitucionalidade do orçamento.
Ele disse que apesar da resolução do Congresso ter apresentado "avanços significativos" para a aplicação do orçamento secreto, estabelecendo critérios mais objetivos na distribuição da verba entre os parlamentares, ela não foi suficiente para sanar os "vícios de constitucionalidade" do instrumento.
O último a votar foi o decano da Corte, ministro Gilmar Mendes . Ele afirmou que com as emendas do relator, a própria função do Legislativo se perde e votou pela manutenção delas, divergindo de Weber.
“Com o protagonismo das emendas do relator-geral, corre-se o risco de as emendas passarem a programar a administração pública, ditando-lhe as prioridades”, afirmou o ministro. “Passa a se adotar um modelo de parlamentarismo ou semipresidencialismo sem as características de um novo regime de governo", declarou Mendes.
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