Um ano e oito meses após o início da vacinação contra Covid-19 no país e após pesquisas comprovarem sua eficácia contra o vírus, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a questionar a imunização contra a doença. Em entrevista ao podcast “Flow” nesta segunda-feira, o titular do Palácio do Planalto admitiu ter recebido orientações da equipe de campanha para evitar o assunto, pois poderia perder eleitores, mas disse não se importar e que prefere o que diz ser, segundo ele, "a verdade".
Pesquisas mostram a queda no número de mortes têm acompanhado o avanço da vacinação. Bolsonaro diz não ter se vacinado, embora tenha imposto sigilo de cem anos em sua carteira de vacinação.
"O pessoal me recomenda: ‘não toque nesse assunto’. Poxa, eu tenho que valar a verdade para o pessoal. Não quer votar mais em mim, lamento, né, posso fazer o quê? Eu tenho que falar a verdade", disse Bolsonaro.
O presidente foi questionado pelo apresentador se o que ele dizia não influenciava a população a rejeitar a vacina. A entrevista, exibida no YouTube, destacava na legenda: “Lembre-se de pesquisar tudo o que foi dito neste programa”. O apresentador disse que a mensagem será exibida em todas as entrevistas com candidatos à Presidência.
"Eu não tomei vacina. Me recomendaram até a tomar uma água destilada. Eu não vou. Posso enganar a você, mas não vou enganar a mim. Influencia alguns (a não tomar a vacina). Não é que a minha palavra tá valendo, eles foram ler a bula", disse.
Bolsonaro citou estudos que apontam a perda de eficácia da vacina da Pfizer. O Ministério da Saúde, porém, recomenda a aplicação de quarta dose para adultos a partir de 40 anos, imunossuprimidos e profissionais de saúde quatro meses após a terceira dose.
O presidente também disse que os imunizantes aplicados em crianças a partir de 3 anos são para uma cepa que não existe mais. No dia 19 de julho, o Ministério da Saúde orientou a aplicação de Coronavac para crianças de 3 e 4 anos por limitação de doses. Apesar disso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou o imunizante para o público a partir de 3 anos.
Um dos estudos que subsidiou a decisão da Anvisa foi o Projeto Curumim, desenvolvido pelo centro de pesquisa clínica do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam), da Ufes, em parceria com o Instituto René Rachou (Fiocruz Minas). O material revelou que a CoronaVac gerou de três a quatro vezes mais anticorpos neutralizantes no grupo de 3 a 5 anos em relação aos adultos. Na comparação com o público de 6 a 17 anos, o número de células de defesa dobrou.
Apesar das críticas, Bolsonaro disse que as doses dos imunizantes seguirão sendo disponibilizadas: "Tem gente que quer tomar a terceira, quarta dose. Sem problema nenhum, enquanto quiser tomar, vamos dar a vacina. Agora, respeite quem não quer tomar a vacina", disse.
A entrevista durou mais de 5 horas e foi acompanhada por mais de 500 mil pessoas no canal oficial do "Flow Podcast".
Varíola dos macacos
Na conversa, Bolsonaro também defendeu que as pessoas também tenham liberdade para se vacinar contra a varíola dos macacos. O Brasil já tem mais de 2 mil casos da doença.
No país, é esperado o recebimento de 50 mil doses de vacina por meio da compra conjunta de países americanos organizada pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). De acordo com o Ministério da Saúde, é prevista a entrega de pouco mais de 20 mil doses na primeira remessa, em setembro, e as demais em novembro.
"Ta aí agora a questão do macaco, varíola do macaco. Já estão se falando em vacina, vai tomar, não vai, quem pega, quem não pega, não vou falar aqui, segundo a OMS falou que vai dar um curto circuito geral, tá certo? Você tem que ter a liberdade, meu Deus do Céu".
Na entrevista, Bolsonaro disse não ter interesse em anistia ou imunidade após o fim do seu mandato. Uma Proposta de Emenda à Constituição que dá o cargo de senador vitalício para ex-presidente.
"Já li isso daí. Não estou interessado nisso. Vão falar que eu estaria pedindo arrego, peidou na farofa. Não, não estou interessado nisso, não quero essa imunidade, quero meu país democrático", disse o presidente.
Na conversa, Bolsonaro disse ser uma “imoralidade” ter recebido o auxílio-moradia da Câmara de Deputados mesmo com um apartamento em Brasília, mas afirmou que não é ilegal.
"Recebi auxílio moradia, sim, não é ilegal, pode ser imoral. Mas eu vivia do meu salário, tinha outras despesas", justificou.
O titular do Palácio do Planalto rejeitou o nome de “PEC Kamizaze” dado à Proposta de Emenda à Constituição que permitiu o governo Bolsonaro aumentar o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$600 às vésperas da eleição.
"Não é Kamikaze. Não é PEC boca de urna. Vai ver com o pobre na ponta da linha que teve inflação majorada agora nos produtos alimentícios, por exemplo, por causa da pandemia e da guerra, o que ele achou dos 600. Vai falar para o mais humilde o que ele achou? A inflação foi alta nos alimentos. Agora, fizemos com responsabilidade", disse o presidente.
Bolsonaro também afirmou que não havia "clima" para aprovar a PEC no último ano. "Não tinha clima para fazer ano passado. [...] A gente vai fazer no momento certo".
Na entrevista, Bolsonaro foi questionado sobre a legalização das drogas, uma pauta frequente do programa, em que um dos apresentadores costumava acender um cigarro semelhante ao de maconha enquanto conversava com os convidados, o presidente disse ser contrário e afirmou não acreditar que essa pauta avance no Congresso.
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