PGR estuda abrir investigação contra governadores por hospitais de campanha
Subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo, aliada de Aras, enviou esclarecimentos sobre hospitais de campanha para 'assessoria criminal'
BRASÍLIA — Em meio ao avanço da CPI da Covid contra o presidente Jair Bolsonaro, a Procuradoria-Geral da República (PGR) vai analisar se há elementos para a abertura de novas frentes de investigação contra os governadores por causa dos hospitais de campanha.
A informação consta em um ofício da subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo, que é bolsonarista e pessoa de confiança do procurador-geral da República Augusto Aras. Após ter solicitado aos 27 governadores informações sobre a montagem e desmobilização dos hospitais de campanha, Lindôra determinou o envio de todo o material para a "assessoria criminal do gabinete do procurador-geral da República no Superior Tribunal de Justiça (STJ)". Essa assessoria é comandada pela própria Lindôra e é responsável por conduzir as investigações criminais contra os governadores, que possuem foro privilegiado perante o STJ.
Quando solicitou os esclarecimentos, a PGR pediu que os ofícios sobre os hospitais de campanha fossem assinados pelos próprios governadores e não por secretários de Estado, o que poderia fornecer elementos para a abertura de investigação diretamente contra eles.
No ofício, Lindôra também determinou o envio do material colhido junto aos governadores para todas as unidades estaduais do Ministério Público Federal avaliarem "providências que entenderem cabíveis".
"Dessa forma e considerando que essa Câmara de Coordenação e Revisão conseguiu reunir informações referentes à matéria, determino o encaminhamento dessas informações às respectivas unidades do Ministério Público Federal nos Estados, para conhecimento e providências que entender cabíveis na atuação no enfrentamento da crise do COVID-19, bem como à Assessoria Criminal do Gabinete do Procurador-Geral da República no Superior Tribunal de Justiça", escreveu no ofício, assinado na semana passada.
Como revelou a colunista Bela Megale, o Palácio do Planalto tem apostado em ações de Aras para abastecer a ala governista na CPI da Covid, que tentam focar a investigação nos governadores e tirar o presidente Jair Bolsonaro da mira da comissão.
Os ofícios enviados pela PGR provocaram revolta nos governadores, que chegaram a apresentar uma representação contra Lindôra ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
'Fim da pandemia'
Diante do aumento dos casos da Covid-19 no início de março, a PGR decidiu expedir ofícios aos governadores perguntando sobre os hospitais de campanha. O primeiro pacote de ofícios foi enviado no dia 12 de março por Lindôra Araújo, na condição de integrante do Gabinete Integrado de Acompanhamento à Epidemia do Coronavírus-19, órgão criado por Aras para acompanhar a pandemia. Os ofícios pediam a lista dos hospitais de campanha em funcionamento e questionava os governadores sobre a eventual desativação das estruturas.
Após as respostas, Lindôra decidiu enviar novos ofícios pedindo esclarecimentos complementares. De forma mais incisiva, fazia uma acusação genérica enviada a todos os 27 governadores: "Esclareça-se ainda por que os Excelentíssimos(as) senhores(as) Governadores(as) entenderam que ocorreu o fim da pandemia de COVID-19 entre setembro e outubro de 2020 com a consequente desativação dos referidos hospitais".
Essa afirmação, na verdade, havia sido feita em dezembro pelo presidente Jair Bolsonaro, quando ele declarou que o Brasil estava vivendo "o finalzinho da pandemia". A PGR, entretanto, não solicitou esclarecimentos a Bolsonaro a respeito do assunto, apenas aos governadores.
Nas respostas, diversos gestores rebateram Lindôra e disseram que nunca concluíram que a pandemia havia acabado. Em linhas gerais, os governadores responderam que os hospitais de campanha foram desativados em um momento no qual não havia mais demanda. Outros disseram que não chegaram a desativar as estruturas.
Pelo menos dois governos estaduais, do Amapá e de Goiás, acusaram diretamente o Ministério da Saúde e o governo federal de responsabilidade em problemas envolvendo hospitais de campanha, mas a PGR não sinalizou a tomada de alguma medida para investigar a responsabilidade da gestão federal sobre o assunto.
O governo do Amapá informou que "solicitou ao Ministério da Defesa, através do ofício 032/GOV, e ao Ministério da Saúde, por meio do ofício 042/GOV, ambos em anexo, a instalação de hospitais de campanha no Estado, sem que tal pleito tenha sido atendido".
Já o governo de Goiás relatou que pediu ao Ministério da Saúde a prorrogação da estrutura do Hospital de Campanha de Águas Lindas, único montado com apoio do governo federal, mas que o pedido não foi atendido. No ofício enviado à PGR, a gestão estadual afirma que apresentou estudos técnicos apontando a necessidade de manter o funcionamento do hospital, mas que a gestão do então ministro Eduardo Pazuello não acolheu o pleito.
"Necessário pontuar, para que não pairem dúvidas acerca de tema tão relevante, que o Governo do Estado de Goiás mediante Ofício nº 9256/2020–SES, apresentou estudo técnico ao Ministério da Saúde, solicitando a manutenção do Hospital de Campanha de Águas Lindas de Goiás pelo menos até a data de 30.12.2020, sem prejuízo de posterior prorrogação. Em resposta o Ministério da Saúde emitiu parecer técnico indeferindo o pedido de manutenção do HCamp de Águas Lindas", diz o ofício do governo de Goiás.