Entenda os efeitos da decisão do STF sobre Lula para outros casos da Lava-Jato
Aplicação não é automática, mas pode encorajar defesas a também pedirem a anulação de processos
RIO — A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a condenação de processos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no âmbito da Lava-Jato não tem extensão automática sobre outros casos da operação.
Professor de Direito da FGV Rio, Michael Mohallem explica que não se trata de uma tese jurídica, uma jurisprudência, que se extrapola e passa a ser utilizada como precedente pela Justiça. Ele enfatiza que o julgamento de Lula cristaliza um entendimento de que é preciso ficar clara a conexão com a Petrobras para que o processo fique na 13ª Vara de Curitiba.
Entendimento semelhante, segundo Mohallem, se aplica a suspeição de Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá. Entendeu-se que o ex-juiz é suspeito apenas em relação a Lula, sem que a medida afete a princípio outros réus.
— Cada caso e réu tem sua própria discussão. Não há uma transposição. Não é igual a uma tese jurídica que passa a ser aplicada a vários casos — ressalta o pesquisador da FGV.
Ainda assim, a decisão sobre a competência da Lava-Jato em Curitiba abre caminho para que esse mesmo tipo de questionamento seja feito nos demais processos. Condenados pela Justiça de Curitiba podem lançar mão do argumento de falta de competência em processos que não tenham relação direta com a Petrobras. Como no caso de Lula, as ações penais podem ser remetidas para a Justiça de outro estado, que decidirá se aproveita ou não os atos instrutórios do processo. Mohallem pondera, no entanto, que o argumento não é facilmente transposto. É preciso ficar evidente a falta de relação com casos de corrupção na Petrobras.
Alguns réus da Lava-Jato já haviam questionado a competência da 13ª Vara de Curitiba antes da decisão de Fachin. Segundo o jornal "Folha de S. Paulo", o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-ministro José Dirceu devem buscar decisão semelhante com pedidos de anulação de condenações do tribunal de primeira instância.
Em março, antes da decisão monocrática de Fachin sobre Lula, o ministro do STF já havia acatado razões semelhantes para declarar que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para analisar ilícitos envolvendo a Transpetro. A decisão ocorreu em recurso movido pela defesa dos empresários Germán Efromovich e José Efromovich, que respondem na Justiça pelo suposto pagamento de propina e lavagem de dinheiro envolvendo contratos do estaleiro Eisa com a empresa subsidiária da Petrobras. Fachin decidiu remeter o caso também à Justiça Federal do DF.
Caso Queiroz
A argumentação de Fachin sobre a incompetência da Justiça Federal em Curitiba já tem sido usada como argumento em casos fora da Lava-Jato. Um exemplo foi o pedido da defesa de Fabrício Queiroz, ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), para que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomasse a discussão sobre a soltura de Queiroz e da mulher dele, Márcia de Oliveira Aguiar.
Os advogados defenderam uma analogia entre os casos de Queiroz e o de Lula para conquistar a nulidade das prisões. O argumento foi que elas foram determinadas por um juiz de primeira instância incompetente para avaliar o caso. Os ministros do STJ não acataram, porém, o argumento. Isso porque os magistrados entenderam que o juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do TJ fluminense, responsável pelo processo, foi competente para julgá-los até que o TJ do Rio reavaliasse a competência do caso.
A Quinta turma do STJ revogou as prisões, mas por outro motivo. Os ministros entenderam que o decreto de prisão de Queiroz já tem mais de nove meses sem ter sido ratificado, o que descumpre a atual exigência estabelecida na Lei Anticrime, que estabelece revisão de prisões preventivas a cada 90 dias.