PEC da Imunidade: por falta de acordo, votação do texto na Câmara é adiada

Relatora retirou maioria dos pontos polêmicos para atender demandas do PT e tentar garantir 308 votos necessários para aprovação; entretanto, como não houve garantias de que o projeto seria aceito, definição ficou para esta sexta-feira

Foto: Najara Araujo/ Agência Câmara
Sessão da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira, 25, presidida pelo presidente Arthur Lira (PP-AL)



A Câmara dos Deputados adiou, na noite desta quinta-feira, a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da imunidade parlamentar . O objetivo da proposta é proteger deputados e senadores de situações semelhantes à de Daniel Silveira (PSL-RJ), bolsonarista preso na semana passada.

Sem garantias de que o texto fosse aprovado, mesmo após modificações negociadas entre partidos, o tema deve ficar para análise na manhã desta sexta-feira (26).

A PEC foi alterada para atender o PT . O partido se queixou de um trecho que impedia deputados e senadores de serem responsabilizados na justiça cível ou criminal por suas opiniões e discursos. Deputados do Centrão retiraram esse trecho da proposta. A alteração não foi votada ainda.

Após a relatora do texto, Margarete Coelho (PP-PI), anunciar que cedeu neste ponto, deputados do PSL anunciaram que iriam votar contra a PEC. Líderes do Centrão já consideravam que a maioria estava frágil. Com o desembarque do PSL , a possibilidade de derrota na votação se concretizou.

Tramitando em regime excepcional, a PEC teve a sua constitucionalidade aprovada na quarta-feira , um dia depois de vir a público. Em seguida, a PEC poderá ser apreciado em segundo turno. O passo seguinte é o envio ao Senado, onde também será analisado em dois turnos.

Alterações

Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
PEC da Imunidade foi aprovada por 304 votos na votação sobre admissibilidade

Para conseguir maioria folgada — são necessários 308 votos para a aprovação —, a relatora do texto, Margarete Coelho (PP-PI), fez diversas alterações de última hora. Em parecer protocolado nesta tarde, a deputada reduziu a quantidade de pontos polêmicos.

Parlamentares só podem ser presos em flagrante e por crimes inafiançáveis. Na primeira versão, a PEC esclarecia que os crimes inafiançáveis seriam apenas os citados expressamente na Constituição . A redação foi alterada para incluir todos os crimes inafiançáveis "na forma da lei", o que permite interpretação mais ampla, que contempla inclusive o caso de Daniel Silveira.

Foi retirada uma medida que alterava as condições de inelegibilidade . A Lei da Ficha Limpa exige apenas condenação por "órgão colegiado" para tornar um político inelegível. A redação anterior da PEC colocava a exigência de uma condenação "em duplo grau de jurisdição", o que é mais restritivo. Ao ler o relatório em plenário, Margarete Coelho afirmou que esse assunto voltará a ser debatido em grupo de trabalho que discute uma reforma eleitoral. 

"Tal circunstância impõe cautela e prudência por parte deste Congresso Nacional no presente momento. A temática deve ser objeto de debate oportunamente, qual seja, nas discussões acerca da reforma política, do Novo Código Eleitoral e da criação do Código de Processo Eleitoral", discursou a deputada.

Outra alteração é no ponto que criava um recurso ordinário dentro do Supremo Tribunal Federal ( STF ), o que foi criticado por juristas — políticos condenados no STF em primeira instância poderiam recorrer, no mérito da causa, ao próprio STF. Isso também não entrou no texto. A relatora, porém, também defendeu a discussão do tema em outra oportunidade.

"O Congresso Nacional tem um encontro marcado com a positivação, em sede constitucional, do duplo grau de jurisdição, notadamente porque há restrições ilegítimas ao exercício de liberdades fundamentais", defendeu Margarete Coelho.

Para tornar a PEC mais palatável, também foi retirado o ponto que vedava decisões contra parlamentares, como busca e apreensão , durante o plantão forense.

Foi alterado ainda o trecho que previa que busca e apreensão seria de competência exclusiva do Supremo nas dependências do Congresso e nas residências dos parlamentares. Agora, a PEC cria essa limitação apenas para buscas dentro da Câmara e do Senado , e não nas casas de deputados e senadores. 

Sem passar por comissões e adotando ritmo a toque de caixa, parlamentares do centrão tentam votar em dois turnos o texto ainda nesta quinta-feira. Eles querem aproveitar a "temperatura" do caso, provocado pela prisão de Silveira .

Em reunião de líderes, partidos alinhados ao  presidente Arthur Lira (PP-AL) deram aval às mudanças no conteúdo da PEC original. A primeira versão só foi apresentada há dois dias. No início da sessão desta quinta-feira, Lira saiu de plenário para ir a São Paulo. Coube a seu vice, Marcelo Ramos (PL-AM), dar seguimento aos trabalhos. Mais cedo, Lira negou que a proposta fosse uma "blindagem". Segundo ele, o texto não concede inviolabilidade plena aos parlamentares.

"A Câmara teve comportamento de deixar isso claro: inviolabilidade com relação a imunidade parlamentar não será plena quando for contra a democracia. A Câmara fez corte na perna e deixou isso claro. Lógico que isso precisa, por falha do Legislativo, ser remediado. E qual remédio para esclarecer um assunto que deixou STF sem alternativa de posicionamento? Regulamentar o artigo que fala de imunidade parlamentar quanto à sua voz e seu voto", disse Lira. 

Pontos da PEC original foram preservados. O texto prevê, por exemplo, a proibição do afastamento temporário de parlamentares do Congresso, somente podendo ser decretada a perda do mandato nos casos já previstos em lei. Algumas hipóteses para isso ocorrer envolvem questões eleitorais, criminais ou quebra de decoro.

O afastamento da  deputada Flordelis (PSD-RJ) da Câmara, determinado pela Justiça do Rio na terça-feira, não poderia mais ocorrer pelas novas regras.

Outra ponto relevante da PEC é estabelecer o foro privilegiado apenas "para crimes cometidos no exercício do cargo e relacionados ao mandato", que inclui na Constituição o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal (STF). A alteração mantém, portanto, ações sobre fatos anteriores ao cargo dos deputados e senadores nas instâncias inferiores.

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) criticaram na quarta-feira, em caráter reservado, a primeira versão da proposta. Os magistrados consideraram o texto uma resposta casuística para o caso Daniel Silveira.

PT diverge de trecho sobre crime de opinião

Durante a votação, deputados de PT , PSOL, Cidadania e Novo criticaram a forma com que a PEC tramitou, a toque de caixa. A bancada do PT divergiu de um ponto considerado essencial no caso Silveira: sobre a quem caberia julgar parlamentares por declarações e opiniões.

Pela proposta original, apenas o Conselho de Ética poderia aplicar sanções por falas de parlamentares. A medida, portanto, excluiria qualquer julgamento por parte do Judiciário. Quando deputado federal, o hoje presidente Jair Bolsonaro foi absolvido no Conselho de Ética por ofensas à deputada Maria do Rosário (PT-RS). Posteriormente, ele veio a ser condenado judicialmente.

O PT relembrou o caso ao se posicionar contra a alteração. A relatora da PEC, Margarete Coelho, acatou a sugestão e sugeriu uma modificação no texto durante a votação, preservando o artigo 53 da Constituição. Coelho pediu que, com a alteração, os petistas apoiassem a aprovação da PEC .