O deputado federal Marco Feliciano (sem partido), de São Paulo, afirmou no Twitter que um decreto de Wilson Witzel (PSC/RJ) "tornou ilícito qualquer padre ou pastor pregar que homossexualismo é pecado". No entanto, a lei que o governador do Rio regulamenta diz que a punição não se aplica "às instituições religiosas".
Segundo Feliciano, que também é pastor, Witzel "fez o que nenhum esquerdopata teve coragem até hoje".
O decreto a que Marco Feliciano se refere no post regulamenta a lei 7.041, que "estabelece penalidades administrativas aos estabelecimentos e agentes públicos ou privados que discriminam pessoas por preconceito de sexo, identidade de gênero ou orientação sexual".
Segundo o texto do decreto, podem ser punidos "estabelecimento público, comercial e industrial, entidades, representações,associações, fundações, sociedades civis ou de prestação de serviços" por atos de seusagentes, proprietários ou preposto que "discriminem pessoas em função de sexo, identidade degênero ou orientação sexual, ou contra elas adotem atos de coação ou violência, física ouverbal ou omissão de socorro".
A punição pode ser adevertência, multa de R$ 19 mil a R$ 78,5 mil, suspensão ou até a cassação da inscrição estadual — necessária para um estabelecimento comercial funcionar legalmente.
No entanto, a lei 7.041, aprovada em 2015, explicita que ela "não se aplica às instituições religiosas, templos religiosos, locais de culto, casas paroquiais, seminários religiosos, liturgias, crença, pregações religiosas, publicações e manifestação pacífica de pensamento".
O texto ainda discreve diferentes tipos de discriminação, como negar, impedir ou dificultar o acesso a espaços como hospitais, hotéis, transporte público, entre outros.
Claudio Nascimento, coordenador executivo do Grupo Arco-Íris de Cidadania LGBTI e diretor de Políticas Públicas da Aliança Nacional LGBTI, participou da construção do texto da lei e afirma que o STF já tratou desse tema.
Você viu?
— A decisão que criminalizou a homofobia deixou resguardada o direito de livre expressão das religiões, de seus dogmas e crenças, mas explicitou que isso não pode ser confudido com incitação à violencia e à discriminação — afirmou Claudio Nascimento, que presidiu, entre 2007 a 2017, o Conselho Estadual da População LGBT e o programa Rio Sem Homofobia, do governo estadual.
O termo "homossexualismo" utilizado por Feliciano é considerado ofensivo para a comunidade LGBT pelo sufixo 'ismo', usado para indicar patologias.
Até 1990, a Organização Mundial de Saúde considerava a homossexualidade como doença e, na lista de doenças mentais, estava o “homossexualismo”. O deputado e pastor é um dos defensores do que ele chema de "cura gay".
O governador Wilson Witzel foi procurado, mas ainda não respondeu às questões da reportagem.
Histórico da lei
Em 2000, o estado do Rio aprovou lei similar, mas que foi derrubada em 2013. Na época, opositores alegaram que ela tinha "vício de iniciativa". Por prever punições a servidores públicos, deveria ter sido apresentada pelo Poder Executivo. No entanto, havia sido criada pelo deputado Carlos Minc.
Naquele mesmo ano, a lei 7.041 foi escrita por Minc e Claudio articulados com o então governador Sérgio Cabral. Em 2013, político que hoje está preso enviou a matéria à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), que aprovou o texto em 2015.
No entanto, faltava ainda a regulamentação — que só saiu agora, em fevereiro de 2020, após quatro audiências públicas realizadas desde 2019 com representantes do Conselho Estadual da População LGBT e do governo estadual.
O decreto de Witzel apresenta todas as etapas para que o processo administrativo se inicie, com possibilidade de defesa do acusado até o pedido de recurso, que deverá ser analisado pela Secretaria de Estado de DesenvolvimentoSocial e Direitos Humanos.