STF começa a decidir nesta quinta-feira se prisões após condenações em segunda instância são constitucionais
Nelson Jr./SCO/STF
STF começa a decidir nesta quinta-feira se prisões após condenações em segunda instância são constitucionais

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgam, nesta quinta-feira (17), a partir das 14h, as ações apresentadas pelos partidos PCdoB e Patriota sobre a possibilidade de prisão em segunda instância, ou seja, antes de se esgotarem todos os recursos possíveis. Desde 2016, o entendimento majoritário na Corte é de que a pena pode ser executada após decisão em segunda instância. A orientação agora poderá mudar. Existe a possibilidade de que o réu possa aguardar em liberdade por mais tempo. O julgamento será realizado em plenário, com os onze ministros.

Hoje, o entendimento do tribunal é que réus presos após condenação em segunda instância  possam ser submetidos ao cumprimento antecipado da pena. Se o plenário mudar de posição, as prisões voltariam a ser decretadas somente depois de analisados todos os recursos judiciais ao alcance do réu, como terceira instância e trânsito em julgado.

Leia também: Às vésperas de julgamento no STF, Moro defende prisão em segunda instância

Rosa Weber mais uma vez estará no centro da decisão sobre a prisão em segunda instância
Carlos Moura/SCO/STF - 7.5.19
Rosa Weber mais uma vez estará no centro da decisão sobre a prisão em segunda instância

Em abril do ano passado, em julgamento que durou mais de dez horas, o plenário do Supremo decidiu, em votação apertada, negar um habeas corpus da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que alegava ser inconstitucional a prisão sem que fossem esgotadas todas as instâncias. Na época, seis ministros votaram a favor da prisão após condenação em segunda instância: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia, enquanto cinco eram contra: Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli.

Naquela oportunidade, o voto de Rosa Weber era o mais esperado, já que a ministra tem, por característica, não emitir suas opiniões sobre as decisões antes do julgamento e o placar apontava para cinco ministros a favor e outros cinco contrários.

Presos famosos que podem ser beneficiados

Mais uma vez o voto de Rosa Weber pode ser decisivo, já que a ministra deu indícios de que, agora, em uma decisão final sobre o tema e não de exclusividade de apenas um réu, possa ter um novo entendimento. A aproximação do atual presidente do STF , Dias Toffoli, com o governo federal, porém, também pode trazer um voto diferente do dado no ano passado.

Leia também: STF deve julgar no mesmo dia prisões em 2ª instância e tese sobre delatores

"A presidência de Toffoli à frente do Supremo tem buscado uma segurança institucional, sem enfrentamentos dramáticos às pautas políticas mais sensíveis, não sendo muito esperado que ele colocasse as ações em pauta sem alguma certeza do resultado. Especula-se que por volta de dois dos votos hoje no Supremo podem representar o famoso swing vote sobre esse tema, não se espera um placar muito folgado, muito menos que o julgamento termine logo nessa quinta-feira", opina o advogado criminalista Leonardo Avilar.

Apoiado no ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro , o governo federal defende a manutenção das prisões após condenações em segunda instância. Em abril, a Advocacia-Geral da União emitiu uma nota dizendo aguardar o trânsito em julgado (quando já não cabe mais recursos) para que um réu comece a cumprir pena é um modelo "hipergarantista".

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), porém, rebate a manifestação. Em estudo enviado à Câmara, a instituição defende que a medida é inconstitucional por supostamente ferir o princípio da presunção de inocência e defende que, caso o STF reafirme sua posição a favor do cumprimento antecipado da pena, o Congresso deve impor regras.

Para Tânia de Oliveira, da executiva nacional da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), a garantia da presunção de inocência é uma conquista histórica, não só da Constituição brasileira, mas das sociedades democráticas do mundo.

“No Brasil, o cidadão entra no processo do sistema penal brasileiro culpado. Cabe a ele provar sua inocência. É uma perigosa inversão de valores. A presunção de inocência relativizada pelas decisões da nossa Corte Suprema, nos fez assumir essa bandeira de que defender esse princípio é defender minimamente as garantias do processo penal constitucional”, explica.

E se os ministros modificarem o entendimento?

4.895 mandados de prisão foram expedidos por tribunais de segunda instância no Brasil
shutterstock
4.895 mandados de prisão foram expedidos por tribunais de segunda instância no Brasil

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), caso os ministros mudem de ideia, 4.895 presos em segunda instância no Brasil serão beneficiados e voltarão para a liberdade. O próprio órgão, porém, faz uma ressalva. Dependendo do caso, mesmo com uma decisão do STF favorável, o juiz do caso poderá decretar uma ordem de prisão cautelar.

Segundo o CNJ , os 4.895 mandados de prisão foram expedidos pelos Tribunais Regionais Federais (TRFs) e Tribunais de Justiça (TJs) dos estados, que compõem a segunda instância. Mas não deu detalhes, como o período em que as ordens foram decretadas e se todas já foram cumpridas.

Os números do CNJ divergem dos apresentados pelo Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), que mostra que, na verdade, 190 mil presos podem deixar a prisão caso os ministros do STF mudem o entendimento.

Segundo o CNJ, esse número do BNMP não vale, pois "reflete a soma de todos os presos, já sentenciados, porém ainda sem trânsito em julgado. Ele inclui também o universo de prisões cautelares aplicadas em sentença de primeiro grau ou mesmo em segunda instância, o que não está em julgamento nas referidas ADCs. São casos de prisão cautelar previstos na legislação processual penal como, por exemplo, para garantia da ordem pública, por conveniência da instrução penal ou para assegurar a aplicação da lei penal  (art. 312 do Código de Processo Penal), que podem inclusive ser aplicadas em qualquer fase do processo, até mesmo antes de sentença de primeiro grau."

Na última terça-feira (15), a Defensoria Pública de São Paulo enviou ao STF manifestações em que fornece dados a respeito do impacto dessas prisões sobre a população carcerária, sobretudo aos pobres.

Os dados defendem o acesso a tribunais superiores para correção de decisões equivocadas de primeiro ou segundo grau: em 2018, foram recebidas 24.365 intimações de decisões só em São Paulo e 61,84% foram alteradas no STJ, o que significa que aproximadamente 15.000 pessoas estavam cumprindo pena de maneira ilegal.

Toffoli pressionado

Dias Toffoli agendou o julgamento depois de muita pressão
Marcelo Camargo/ABr
Dias Toffoli agendou o julgamento depois de muita pressão

O ministro Dias Toffoli estudava uma data mais adequada para julgar os processos sobre segunda instância desde setembro do ano passado, quando tomou posse na presidência do STF. No fim de 2018, chegou a dizer que agendaria os casos para antes da Páscoa, mas recuou da própria decisão. Agora, diante da pressão de colegas, disse a interlocutores que o momento é favorável para se debater o assunto em plenário.

Além disso, há expectativa entre os ministros que a Segunda Turma da Corte, formada por cinco ministros, retome o julgamento de um recurso de Lula. Em junho, durante a análise do caso, o ministro Gilmar Mendes pediu vista e interrompeu a discussão. Ele poderá liberar o processo para julgamento ainda neste mês. Em seguida, caberá à presidente da turma, ministra Cármen Lúcia, agendar uma data.

Os dois processos começaram a se movimentar nos bastidores um dia depois da divulgação da carta em que Lula afirma que não vai “barganhar” sua liberdade – ou seja, não vai aceitar migrar do regime fechado para o semiaberto. O ex-presidente aposta na mudança de entendimento do plenário sobre a prisão em segunda instância . E também na possibilidade de ter sua condenação anulada na Segunda Turma. No recurso, a defesa alega que o então juiz Sergio Moro não era isento o suficiente para conduzir os processos do ex-presidente.

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!