Grupo que estudará mudanças na legislação trabalhista será composto por membros do governo e do Judiciário, além de acadêmicos e advogados
Arquivo/Agência O Globo
Grupo que estudará mudanças na legislação trabalhista será composto por membros do governo e do Judiciário, além de acadêmicos e advogados

Centrais sindicais e confederações patronais decidiram se antecipar aos planos do governo e enviar ao Congresso Nacional uma proposta de reforma sindical. As diretrizes do plano foram definidas durante uma reunião entre essas lideranças e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). As mudanças devem afetar principalmente as regras que definem quantos sindicatos representam cada categoria. Também estão em análise propostas para substituir o imposto sindical, extinto pela reforma trabalhista.

Estão sobre a mesa ao menos três planos, segundo o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah. Um deles mantém a chamada unicidade sindical, que garante que apenas uma entidade negocie em nome de uma categoria de determinada região. A proposta com mais força na equipe econômica prevê que cada empresa possa ter seu próprio sindicato, o que multiplicaria o número de instituições. Essa alternativa é criticada por representantes trabalhistas a patronais, porque poderia dificultar as negociações coletivas.

Uma terceira via é instituir o chamado pluralismo por categoria. Nesse modelo, trabalhadores de um mesmo setor poderiam ser representados por vários sindicatos, mas as entidades seriam nacionais e não municipais, como é hoje. A ideia é inspirada no modelo alemão, onde há de 20 a 30 sindicatos. No Brasil, são mais de 12 mil instituições desse tipo em funcionamento.

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As propostas devem ser enviadas ao Legislativo por meio de proposta de emenda à Constituição (PEC). Segundo Patah, a melhor alternativa, defendida pela UGT, é a que prevê sindicatos nacionais. Ele critica a ideia de permitir que cada empresa tenha um sindicato próprio de trabalhadores.

"Seria o sindicato dos empresários, eles que iriam eleger os trabalhadores que vão ser os representantes", afirma.

O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, acrescenta que o objetivo das entidades é que as representações sejam, ao menos, municipais. Na avaliação da Força Sindical, a proposta do governo fragmenta e enfraquece a representação dos trabalhadores.

"Dá impressão que o governo quer fragmentar a luta sindical no nosso país. Isso é interferência na organização sindical. A OIT (Organização Internacional do Trabalho) recomenda a liberdade sindical. Tem que ser opção dos trabalhadores o tipo de sindicato que eles querem", diz.


Segundo Juruna, o plano que permite que mais de um sindicato da mesma categoria atue numa cidade prevê que a entidade alcance um nível mínimo de representatividade para firmar acordos coletivos, ou seja, um determinado número de trabalhadores filiados. Ainda não há, porém, um percentual definido.

O arcabouço deixaria de ser gerido pelo governo federal para responder à uma estrutura bipartite, composta por trabalhadores e empregadores. Essa mesma estrutura ficaria responsável por definir o nível de representatividade dos sindicatos e as taxas a serem pagas.

Alternativa ao imposto sindical

As centrais pretendem ainda aproveitar o debate para aparar o que consideram arestas deixadas pela reforma trabalhista, aprovada durante o governo do ex-presidente Michel Temer. A nova legislação acabou com imposto sindical, que era obrigatório e ajudava a financiar os sindicatos. Além disso, obrigou que contribuições às entidades sejam autorizadas individualmente pelos trabalhadores — e não em assembleias da categoria. Patah, da UGT, defende que as assembleias sejam autorizadas a criar contribuições. Caso isso não seja autorizado, propõe que os resultados dos acordos sejam válidos apenas para os trabalhadores que contribuem.

"Se numa assembleia o trabalhador pode resolver se pode dividir as férias em três, diminuir o salário, optar pelo trabalho intermitente, por que não pode decidir quanto vai contribuir para o sindicato?", afirma Patah.

Juruna acrescenta que a reforma criou um ambiente de incerteza para o movimento sindical:

"Virou uma confusão generalizada entre interpretações de juízes e do Ministério Público, e os sindicatos acabam trabalhando de graça para aqueles que não são associados. Isso cria um impasse porque o empresariado também fica numa situação difícil, eles também recolhem taxa para os sindicatos (patronais). Com a reforma, estabeleceu-se a valorização da negociação coletiva. A tendência agora é fortalecer as convenções e acordos coletivos.

O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, frise que o objetivo não é a volta do imposto sindical, no entanto:

"Não é a volta do imposto sindical, é importante deixar claro isso. Não estamos discutindo isso, sabemos que já morreu."

Grupo do governo

Se concretizada, a articulação entre centrais sindicais e parlamentares pode atropelar os planos da equipe econômica. No início do mês, o governo criou um Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet). O colegiado é formado por 11 integrantes, nenhum deles ligado diretamente aos trabalhadores.

"Tem um entendimento de que nós temos que ter uma proposta. Do jeito que está, não está. E não dá para esperar a reforma que o governo quer fazer, que é uma reforma totalmente sem discussão com os atores. Formaram um grupo de altos estudos, mas não tem um trabalhador lá", critica Torres.

O governo afirma que as sugestões dos sindicatos são levadas em consideração, mas disse que a proposta final será montada pelo Executivo. “O governo já vinha ouvindo as centrais sobre o tema. Inclusive tem reunião do Gaet marcada dia 17 com as centrais e dia 18 com as entidades patronais. O Gaet foi instalado no dia 5. Um dos grupos tem como tema a liberdade sindical”, disse a pasta, em nota.

O Gaet apresentará em até três meses um conjunto de propostas sobre o tema ao Congresso Nacional, entre elas o fim da unicidade sindical.

Embora o setor produtivo também esteja participando das negociações, as entidades preferiram não se posicionar. Procurada, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que ”ainda não existe proposta concreta sobre a qual a CNI pode firmar posição". 

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