Indicação polêmica do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR), o subprocurador Antônio Carlos Simões Soares se referiu à democracia como "um verdadeiro embuste", em artigo escrito para a revista Justiça & Cidadania. Publicado em 2014, o texto diz ainda que a maioria dos meios de comunicação só a defende "mais por interesses próprios do que por convicção ideológica".
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Seu nome na sucessão de Raquel Dodge na PGR ganhou força na semana passada. Até então, ele era pouco conhecido dentro e fora do Ministério Público Federal (MPF) . Intitulada "A farsa da democracia ", a resenha de Soares recuperada pela "Folha de S. Paulo", tem trechos que fazem crítica direta ao sistema político e classfica a democracia "tal com é hoje praticada nos países ocidentais uma imposição ao resto do mundo", e um "modelo de regime político que se apresenta como um verdadeiro embuste".
Em outro parágrafo, Soares sustenta que "a começar pelo acesso aos mandados eletivos, passando pelo espaço nos veículos de comunicação, a disputa entre candidatos se mostra inteiramente desigual".
Ao longo do texto, publicado quando Soares ocupava o cargo de procurador regional da República do Rio, ele sugere cumplicidade "espúria"entre a democracia e a imprensa. "O acesso e a manutenção do poder nas democracias ocidentais depende decisivamente do desempenho da mídia nos períodos eleitorais, interação espúria entre eleitos e a imprensa audiovisual", de onde "nasce uma relação de cumplicidade, tornando ambos parceiros inseparáveis do jogo político".
Ele ainda tece críticas ao Congresso Nacional quando diz que "nosso corpo de legisladores nem é dado à reflexão e muito menos guiado pelo interesse público" e que "nunca foi tão importante em nossa história republicana questionar a lei como resposta aos conflitos sociais e interpessoais".
A divulgação de notícias sobre a possibilidade de que Soares possa ser indicado para o cargo de chefe do MPF provocou um forte clima de insatisfação entre procuradores. Integrantes do MPF ouvidos pelo GLOBO nesta segunda-feira sustentam que Soares não teria condições de chefiar o MPF num momento tão complicado do país.
Segundo esses procuradores, Soares está há apenas dois anos em Brasília como subprocurador-geral, nunca comandou uma grande investigação e permanece desconhecido entre boa parte dos colegas de instituição.
Subprocuradores e procuradores estão incomodados com a participação do filho de Bolsonaro, investigado pela Justiça, no processo de escolha do futuro procurador-geral. O advogado do senador teria sido um dos responsáveis pela indicação de Soares. Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, é alvo de uma investigação do Ministério Público do Rio sobre supostas fraudes no gabinete do parlamentar.
Esta semana é decisiva para a escolha do chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR). Bolsonaro havia afirmado que que anunciaria o nome para o cargo na última sexta-feira, o que não ocorreu. Ele vinha conversando apenas com candidatos que correm por fora da lista tríplice. A lista é organizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e desde 2003 vinha sendo respeitada pelos presidentes da República na indicação de um procurador-geral. A instituição argumenta que ela garante respaldo dos procuradores ao chefe da instituição e transparência na escolha, já que todos participam de debates nos quais têm que expor suas ideias.
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O presidente não é obrigado a seguir a indicação da ANPR, embora esta venha sendo a praxe desde 2003. Os integrantes da lista tríplice neste ano são Mário Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul.