Médico veterinário por formação, o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, parece não saber ministrar – na dose certa – o remédio capaz de amansar o Congresso Nacional. Na selva em que deveria reinar, ele acumula reveses. Não bastasse ser o mais esvaziado ministro da Casa Civil da história recente do País, Onyx virou um articulador que desarticula. Bate cabeça com o Legislativo, emite declarações desencontradas e desagrada a integrantes do próprio governo . “Onde já se viu um ministro desses na Casa Civil?”, abusou do trocadilho um colega de ministério que pediu para não ser identificado.
Parlamentares insatisfeitos com o estilo do ministro de conduzir as negociações com o Congresso já o apelidaram de Toque de Midas, ao contrário. Tudo em que ele toca, vira pó. Tudo sobre o qual ele fala, acontece o contrário. Não faltam exemplos. O mais recente deles custou muito caro ao governo, por se tratar de uma promessa de campanha. No dia 10, Onyx Lorenzoni disse acreditar que o Congresso não iria alterar o decreto editado pelo presidente Jair Bolsonaro que ampliava e facilitava o porte e a posse de armas de fogo no País. Bingo! Deu-se o inverso.
O tiro do chefe da Casa Civil saiu pela culatra. Quando a matéria chegou no Senado, ela foi derrubada tanto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, quanto no plenário . O núcleo da articulação política do governo ainda tentou reverter o cenário na Câmara, mas ao perceber que a situação era amplamente desfavorável, o ministro-chefe da Casa Civil resolveu recuar.
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Agora, a aposta do governo é a edição de um projeto de lei sobre o assunto, bem semelhante ao decreto presidencial . Em suma, o texto propõe, por exemplo, autorizar o porte de armas a qualquer pessoa que exerça atividade profissional de risco ou que comprove ameaça à sua integridade física. “Agora vai”, teria prometido Onyx ao presidente. O ministro pode morrer de novo pela boca. A nova cartada desagradou até mesmo integrantes da Frente de Segurança Pública, mais conhecida como bancada da bala, que reúne parlamentares de vários partidos que trabalham pela flexibilização das regras sobre posse e porte de armas.
“Que nível de confiança temos com o governo se o próprio presidente falou uma coisa e o ministro disse que houve má interpretação? Onyx está se comportando como um grande desarticulador”
Se nesse tema Bolsonaro e Onyx parecem relativamente afinados, no imbróglio sobre o bloqueio de recursos das universidades, o ministro falou uma língua e o presidente outra. Parlamentares da base governista logo ouviram a orquestra desafinar. “Que nível de confiança temos com o governo se o próprio presidente falou uma coisa e o ministro disse que houve má interpretação? Onyx está se comportando como um grande desarticulador e está prejudicando a reforma da Previdência”, lamentou Daniel Coelho (PE), líder do Cidadania (antigo PPS) na Câmara.
Apesar de bater ponto no Legislativo há mais de 15 anos, o ministro da Casa Civil parece não saber fazer o básico. Nem o bê-á-bá. Quem já esteve na cadeira ensina: o responsável pela negociação com o Congresso não deveria jamais se recusar a receber deputados da base governista. É da liturgia do cargo.
Não foi o que ocorreu com a senadora Selma Arruda (PSL-MT), uma das principais aliadas do governo. Quando ela tentou conversar com Onyx no Palácio do Planalto, o ministro se negou e recomendou que ela tratasse diretamente com um servidor de terceiro escalão. A forma como ela foi tratada acabou indo parar nos ouvidos do presidente Jair Bolsonaro e sua pasta foi esvaziada. Ele perdeu a função da articulação política . Ficará responsável, agora, pelas parcerias privadas.
O ministro ainda desfruta da confiança do presidente. Mas ao demonstrar ter compromisso com o erro, ao contrário do que pregava Juscelino Kubitschek, Onyx Lorenzoni coloca a própria cabeça a prêmio. Ainda durante a campanha presidencial, o então candidato a ministro vendeu uma ideia equivocada ao futuro presidente. A de que seria absolutamente simples e fácil dobrar o Congresso, teoricamente acuado pelo discurso da “Nova Política”, apenas com o que chamava de “boas ideias”. Ao ser questionado publicamente como ocorreria o meio-campo com o Legislativo, o então deputado federal repetia sempre a mesma ladainha – que hoje se revelou uma tragédia hamletiana: “Palavras, palavras, palavras, nada mais que palavras…”.