“São Paulo não perde um gestor. Ganha dois.” Foi com esse discurso que João Doria, escolhido por mais de 3 milhões de eleitores para ser o prefeito da capital paulista, confirmou que deixaria o cargo após 15 meses para disputar o governo do estado . Quem assume o comando da maior metrópole da América do Sul, já neste sábado (7), é o até então vice, Bruno Covas, o prefeito mais jovem que a cidade já teve desde a redemocratização.
Na última vez em que a capital paulista esteve sob a gestão de um representante da família Covas, a Prefeitura de São Paulo ainda estava sediada no Palácio das Indústrias, onde hoje funciona o Catavento Cultural. Mas gerenciar os problemas da cidade não é exatamente uma novidade para o neto do ex-prefeito e ex-governador Mário Covas, apesar da pouca idade de Bruno (38 anos, a serem completados justamente em seu primeiro dia como prefeito).
Durante a gestão Doria, Bruno Covas assumiu a prefeitura interinamente em ao menos 30 ocasiões devido à ausência do titular do cargo por conta de viagens para fora da cidade.
Nascido em Santos e torcedor do clube mais famoso de sua cidade (assim como Doria), Bruno é advogado formado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP) e economista formado pela PUC.
Seu histórico escolar registra ainda passagem pelo Colégio Bandeirantes, tradicional escola da zona sul de São Paulo que carrega o mesmo nome do palácio onde Bruno morou com o avô durante seu governo, na década de 1990.
“O Bruno era muito encantado com as influências do avô”, lembra o hoje coordenador de Ciências da Natureza do Colégio Bandeirantes, José Ricardo Lemes de Almeida, que foi professor do tucano. “Ele sempre foi muito antenado e preocupado com os colegas. Tinha uma característica bastante agregadora e não era bagunceiro.”
Outra característica do novo prefeito, segundo João Doria ressaltou ao iG , é o seu “bom humor”. “Ele será um excelente prefeito. É jovem, competente, dedicado e tem vínculos com a cidade e com a vida de São Paulo. Bruno tem também outra característica que eu aprecio muito: ele tem bom humor. Ele consegue manter a sobriedade com bom humor a qualquer momento do dia ou da noite. Isso facilita muito o relacionamento e é por isso que ele é muito querido”, disse o agora candidato a governador.
O referido "bom humor" do novo prefeito, no entanto, foi abalado em novembro do ano passado. Na ocasião, Bruno foi alvo de ação civil movida pelo Ministério Público estadual, que pediu a perda do cargo público e a suspensão dos direitos políticos do tucano por conta de irregularidades na contratação da empresa Dream Factory para a organização do carnaval de rua paulistano.
A promotoria alegou na ação que, conforme reportagem da rádio CBN , Bruno Covas passou orientações à Dream Factory sobre quais itens da planilha apresentada pela empresa deveriam ser alterados para que ela saísse vencedora do chamamento público. A prefeitura negou a existência de irregularidades na contratação.
Na Câmara, Bruno Covas defendeu impeachment e PEC do Teto de Gastos
Em sua carreira política, Bruno foi deputado estadual e secretário do Meio Ambiente no governo de Geraldo Alckmin – outro tucano que deixou seu cargo nessa sexta-feira (6) para tentar voos mais altos: a Presidência da República.
Bruno também foi deputado federal, eleito em 2014 com mais de 350 mil votos, sendo o quarto mais bem votado do estado. Na Câmara, o tucano votou a favor do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e também apoiou a PEC que impôs um teto de gastos públicos para os próximos 20 anos, proposta do governo Michel Temer (MDB).
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“A carreira política do Bruno vai bem. Ele tem todas as prerrogativas e condições para assumir a cidade", analisa o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP), que foi o líder da bancada tucana no período em que Bruno esteve por lá. “O Bruno tem um estilo próprio, mais cauteloso que o Doria. Ele tem uma atenção fantástica”, continua.
'Baladeiro' e amparado pelo exemplo de Macron na França
Morador da Barra Funda, na zona oeste paulistana, o novo prefeito é frequentador do parque do Ibirapuera e passou a ser adepto de dieta e de exercícios físicos regulares – combinação que o fez perder mais de 15 quilos. “Foi difícil, mas consegui”, comemorou o tucano em uma de suas postagens no Instagram (rede social que, por vezes, é palco de alguns bate-bocas do novo prefeito com opositores).
Bruno Covas por vezes é taxado como “baladeiro”, mas ele próprio não faz grande questão de mudar essa pecha: seu aniversário de 38 anos será comemorado neste sábado no Villa Country, a casa sertaneja mais badalada da cidade.
Questionado se a pouca idade e a inexperiência de Bruno em cargos no Executivo poderiam pesar contra ele à frente da prefeitura, Tripoli tomou como exemplo positivo o presidente da França, Emmanuel Macron (que tem 40 anos). “O sobrenome do Bruno e a sua idade só agregam. Se não fosse assim, não veríamos hoje o Macron na França. O Bruno tem história”, disse o deputado.
Quanto à influência do sobrenome Covas na carreira e no futuro de Bruno, quem comenta é o vereador e tio do novo prefeito, Mário Covas Neto, filho do ex-governador.
Recém-desgarrado do PSDB para se filiar ao Podemos, o parlamentar disse que a memória de seu pai – que morreu em 2001 em decorrência de um câncer – aumenta a responsabilidade sobre ele próprio e sobre o seu sobrinho.
“A questão de ter essa ligação de sangue não te faz mais ou menos próximo de uma liderança política como o meu pai. Podemos até dizer que o Alckmin é o herdeiro político do Mário Covas. Mas é óbvio que somos muito identificados e isso nos traz maior responsabilidade. Meu pai deixou uma marca muito positiva mesmo num país onde políticos são vistos com muita resistência. Para mim e para o Bruno, a responsabilidade é de ser fiel a essa memória e procurar não cometer equívocos para não manchá-la", comentou o vereador.
Apesar de se dizer "distanciado politicamente" do sobrinho, Mário Covas Neto se mostra otimista em relação à nova gestão na capital paulista uma vez que João Doria, em seu entendimento, tem um estilo de "dono da empresa" que não é bom.
"O Bruno é jovem, mas não é novidade. Não acho que ele seja inexperiente. Ele vem de uma família de políticos e, até por isso, a atuação dele é muito mais de negociação, de fazer as ações com conversas e articulação. O Doria atua em uma linha muito de quem é o 'dono da empresa'. Na relação pública, a imposição não é o melhor caminho. Vide o caso da reforma da Previdência Municipal", comentou o vereador, mencionando um dos principais desafios que Bruno Covas herda de Doria.
O projeto que pretende aumentar a alíquota de contribuição previdenciária para servidores municipais gerou protestos de professores em frente à Câmara no mês passado, situação que levou o presidente da Casa, vereador Milton Leite (DEM), a adiar sua votação em 120 dias.
“Eu imagino e espero que o Bruno tenha um trato bem diferente do que o Doria teve. É preciso mexer na Previdência, isso é claro. Mas, do jeito que o governo propôs, não satisfaz aos funcionários e isso só mudará com um político à frente da negociação. Com alguém acostumado a resolver as coisas por meio da imposição, não funciona mesmo", analisou Mário Covas Neto.
Bruno Covas terá cerca de 1.000 dias de gestão para promover a reforma da Previdência Municipal e concretizar outras promessas que João Doria deixou pelo caminho, como a de zerar a fila das creches na cidade e a de realizar uma série de concessões de equipamentos públicos à iniciativa privada. Serão 33 meses para o novo prefeito reescrever um dos lemas de seu antecessor e se provar tanto político quanto gestor.