Confissões de Funaro levam juiz a adiar depoimentos de Cunha e Henrique Alves

Únicos réus sem acordo de delação premiada, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves agora serão ouvidos somente na próxima segunda-feira (6) – pressionados por uma série de revelações sobre os desvios na Caixa

Segundo ex-vice-presidente da Caixa, era Eduardo Cunha quem decidia sobre financiamento de projetos
Foto: Lula Marques/Agência PT - 21.6.16
Segundo ex-vice-presidente da Caixa, era Eduardo Cunha quem decidia sobre financiamento de projetos

O juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, decidiu adiar para a próxima segunda-feira (6) a tomada dos depoimentos dos ex-presidentes da Câmara dos Deputados  Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves. As audiências dos peemedebistas no âmbito da ação penal decorrente da Operação Sépsis, que apura  pagamento de propina de empresas a agentes públicos mediante à liberação de aportes financeiros de fundos de investimentos controlados pela Caixa Econômica Federal, estavam previstas para ocorrer ainda hoje.

O adiamento se deve à retomada do depoimento do operador financeiro Lúcio Funaro , que já  havia falado por cerca de duas horas e meia na última sexta-feira (27) e também tomou todo o período desta manhã ao responder os questionamentos do advogado Délio Lins e Silva Júnior, que representa o ex-deputado Eduardo Cunha .

Acusado de cometer crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e quebra de sigilo funcional, Cunha vai depor presencialmente ao juiz Vallisney a partir das 9h da próxima segunda-feira. Já Henrique Alves será o último a falar, por videoconferência, a partir da sede da Justiça Federal em Natal (RN), onde ele está preso preventivamente. Caso não seja possível concluir as duas audiências no mesmo dia, foi escolhida a sexta-feira (10) para a retomada dos interrogatórios.

Cunha e Henrique Alves são os últimos a serem ouvidos e também são os únicos réus desse processo que não detêm acordo de colaboração com a Justiça. Desse modo, a dupla chega ao interrogatório pressionada pelas confissões do empresário Alexandre Margotto e principalmente pelos fatos narrados por Funaro e pelo ex-vice-presidente da Caixa Fábio Cleto .

O que disse Fábio Cleto

Cleto foi vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa no período de 2011 a 2015 e desempenhou papel fundamental para o esquema, uma vez que ele integrava o comitê que delibera sobre o financiamento de projetos pelo fundo de investimentos do FGTS (FI-FGTS), voltado a bancar projetos de infraestrutura nos setores de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, hidrovias, saneamento e energia.

O ex-executivo foi nomeado para o cargo com as bençãos de Cunha e Henrique Alves, que, no papel de líder da bancada do PMDB na Câmara, foi o responsável por levar o currículo de Cleto ao então ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. Após ser nomeado, Cleto disse que passou a se encontrar semanalmente com Eduardo Cunha para informar o deputado sobre os projetos que estavam em discussão no comitê do FI-FGTS. Era Cunha quem decidia como o executivo deveria encaminhar o projeto.

"Eu era um voto só, mas acredito que tinha uma relativa influencia por ser o representante da Caixa e pelo meu preparo técnico, de 20 anos de mercado financeiro. Eu conseguia jogar argumentos técnicos que os outros representantes, muitas vezes, entendiam como válidos e seguiam essa mesma linha. Meu voto não era o decisivo, mas eu tinha influência nesse comitê", disse Cleto em seu depoimento.

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O que disse Lúcio Funaro

Foto: Reprodução/JFDF
Eduardo Cunha (gravata verde) e Lúcio Funaro (com a pasta nas mãos) frente a frente durante depoimento à Justiça

Na última sexta-feira, Funaro reafirmou ao juiz de Brasília o papel de liderança de Cunha no esquema, que rendia aos seus integrantes propina de 0,5% a 1% do valor dos contratos. O lobista disse que se encontrou "mais de 680 vezes" com o ex-deputado, que era o responsável por fazer a divisão da propina.

Funaro reconheceu que o grupo atuou para liberar junto ao FI-FGTS recursos para as obras do setor portuário do Rio de Janeiro, o chamado Porto Maravilha, para as Olimpíadas de 2016. O projeto foi tocado por um consórcio constituído pelas empreiteiras OAS, Carioca Engenharia e Odebrecht. De acordo com Funaro, a divisão da propina definida por Cunha para esse projeto era de 80% para o deputado, 4% para Fábio Cleto, 4% para Alexandre Margotto e 12% para ele próprio (Funaro).

O lobista garantiu que, além de Cunha e Henrique Eduardo Alves, outros integrantes do PMDB tinham conhecimento do esquema criminoso no FI-FGTS. "O PMDB é um partido que não é homogêneo... São facções. E a maior facção... Facção não porque facção é criminal. A maior ala do PMDB... Era a liderada pelo deputado Eduardo Cunha".

Perguntado sobre quem mais sabia do esquema, Funaro listou: "Geddel com certeza. O Lúcio, irmão dele, com certeza. O Henrique [Eduardo Alves]... Michel Temer... Moreira Franco... Washington Reis".

Funaro também rechaçou o argumento da defesa de Henrique Alves no sentido de que o ex-deputado desempenhou apenas atividade política ao encaminhar, enquanto líder do PMDB na Câmara, a indicação de Fábio Cleto para ser nomeado para a vice-presidência da Caixa.

"Ele foi levar o currículo para o Palocci e, quando tinha operação, ele participava da divisão. Você vai falar 'Você deu dinheiro para o Henrique?' Dei", garantiu Funaro.

Preso há um ano em decorrência da Lava Jato, Cunha foi transferido no mês passado do Complexo Médico Penitenciário de Pinhais (PR) para Brasília , justamente para participar das audiências da Operação Sépsis. O juiz Vallisney havia determinado que o ex-presidente da Câmara retornasse ao Paraná até quarta-feira (1ª), mas, devido ao reagendamento dos depoimentos, o magistrado estendeu a permanência do peemedebista em Brasília.