Eduardo Cunha (PMDB), ex-presidente da Câmara dos Deputados, foi condenado a 15 anos e quatro meses de prisão por crimes apurados na Operação Lava Jato. A sentença foi proferida na manhã desta quinta-feira (30) pelo juiz federal Sérgio Moro, que entendeu que o principal algoz da ex-presidente Dilma Rousseff cometeu os crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão fraudulenta de divisas.
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A ação penal na qual Eduardo Cunha foi condenado se referia ao uso de contas na Suíça para receber propina de R$ 5 milhões referente à operação de compra pela Petrobras do Bloco 4, campo de petróleo no Benin, na África, em 2011.
A defesa já anunciou que irá recorrer da decisão do juiz Moro, da 13ª Vara Federal, ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Além da pena de 15 anos e quatro meses de prisão, o ex-deputado também foi condenado a pagar US$ 1,5 milhão à Petrobras. O Ministério Público Federal pedia multa de US$ 77,5 milhão , que se refere ao valor total do prejuízo da Petrobras na compra do campo de Benin.
"O condenado recebeu vantagem indevida no exercício do mandato de deputado federal, em 2011. A responsabilidade de um parlamentar federal é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele deposita para obter ganho próprio. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada", escreveu Moro em sua decisão.
A sentença
A condenação de Eduardo Cunha se dá apenas três dias após os advogados do ex-deputado enviarem à 13ª Vara Federal de Curitiba um documento com 188 páginas contendo as alegações finais da defesa
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Assim como praticado pelos integrantes da Câmara dos Deputados na ocasião da cassação do mantato de Cunha, o juiz Sérgio Moro também refutou a alegação do peemedebista de que ele não poderia ser considerado o dono das contas na Suíça.
"Não há nenhum documento avaliando o trust Orion SP como algo independente do cliente Eduardo Cosentino da Cunha. A conclusão óbvia é que Cunha é o titular, controlador e beneficiário da conta em nome do trust Orion SP, apesar da figura jurídica utilizada para a abertura da conta", considerou o juiz.
Segundo os procuradores da Lava Jato, a conta Orion SP aportou, em 2011, cinco transferências feitas pelo lobista João Augusto Rezende Henriques. Os depósitos totalizaram US$ 1,5 milhão.
Em abril de 2014 (um mês após a deflagração da Lava Jato), Cunha encerrou a conta Orion SP e transferiu o saldo para a conta Netherton, também controlada por ele.
Essas movimentações financeiras estão registradas em documentos que o Ministério Público da Suíça compartilhou com as autoridades brasileiras. A defesa de Cunha queria que essas provas fossem descartadas, pois a obtenção delas não teria seguido as determinações da Constituição Federal do Brasil, mas Moro desconsiderou o pedido.
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O magistrado rechaçou ainda a alegação de que os US$ 1,5 milhão recebidos por Cunha tinham como origem um empréstimo que ele havia concedido ao falecido deputado Fernando Alberto Diniz.
"O alegado [Cunha] não encontra um único elemento probatório documental. Seria de se esperar um contrato ou alguma referência nas transações ou pelo menos prova documental de que Eduardo Cosentino da Cunha repassou algum dinheiro previamente a Fernando Alberto Diniz, já que, em empréstimo, se devolve somente o que se recebeu antes."
Sobre o envolvimento do peemedebista na indicação de Jorge Luiz Zelada para a diretoria da Área Internacional da Petrobras, os advogados de Cunha alegavam que não existe na denúncia "qualquer elemento que demonstre que o acusado tinha conhecimento acerca da atividade de Jorge Zelada desempenhada para aquisição do Bloco 4 em Benin".
"O Sr. João Henriques não diz que a indicação [de Jorge Zelada] partiu de Eduardo Cunha . Diz apenas que foi o Partido, sem nominar ninguém! A conclusão de que o Partido seria Eduardo Cunha nada mais é do que simples ilação do Ministério Público Federal", escreveram os advogados.
A alegação também não convenceu o juiz Moro, que teceu a seguinte argumentação:
"Eduardo Cosentino da Cunha era figura importante no PMDB no mesmo período e a nomeação e manutenção de Jorge Luiz Zelada como Diretor da Petrobrás também teve o seu apoio, motivo pelo qual, em contrapartida, recebeu parte da vantagem indevida acertada no contrato de aquisição pela Petrobrás do Bloco 4 de Benin. É o suficiente para caracterizar o crime de corrupção passiva, já que este se configura se o agente público solicita para si ou para outrem a vantagem indevida em decorrência do cargo."
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Intimidação
O juiz Sérgio Moro alegou em sua decisão que nem mesmo a prisão do ex-deputado, ocorrida em outubro do ano passado, foi capaz de "fazê-lo abandonar o modus operandi, de extorsão, ameaça e chantagem".
Esse 'hábito', lembra o magistrado, já havia sido percebido em episódios anteriores, como quando o delator Júlio Camargo, primeiro a relatar a participação de Cunha no esquema criminoso na Petrobras, disse que chegou a esconder em juízo fatos relacionados ao peemedebista "por medo das consequências".
Moro diz que Eduardo Cunha tentou "intimidar e constranger" o presidente Michel Temer ao questioná-lo sobre sua relação com o ex-assessor José Yunes e suposto esquema de repasses ilegais a campanhas do PMDB em 2014.
"A pretexto de instruir a ação penal, Eduardo Cosentino da Cunha apresentou vários quesitos dirigidos ao Exmo. Sr. Presidente da República que nada diziam respeito ao caso concreto", escreve o juiz. "Tais quesitos, absolutamente estranhos ao objeto da ação penal, tinham por motivo óbvio constranger o Exmo. Sr. Presidente da República e provavelmente buscavam com isso provocar alguma espécie intervenção indevida da parte dele em favor do preso, o que não ocorreu."
"A conduta processual do condenado no episódio apenas revela que sequer a prisão preventiva foi suficiente para fazê-lo abandonar o modus operandi, de extorsão, ameaça e chantagem", complementa Moro, que ratifica que "não há qualquer registro" de que Michel Temer tenha cedido à tentativa de intimidação de Eduardo Cunha.