O Ministério Público do Rio (MPRJ) afirmou no final da manhã desta quinta-feira que vai enviar todas as armas apreendidas com policiais militares na Operação Mercenários para uma perícia balística. A ação, deflagrada na manhã desta quinta-feira, teve com o objetivo prender 11 PMs que, segundo investigações, são acusados por corrupção, tortura, peculato e concussão — quando um funcionário público usa o cargo para obter vantagens indevidas. Até o momento, nove foram presos. A promotoria acredita que as armas ilegais encontradas possam ter sido usadas por agentes do estado para assassinar pessoas na Baixada Fluminense e na capital fluminense.
"Essas armas aprendidas, que são irregulares, serão submetidas à perícia. Elas serão periciadas em confronto balístico para apurar se esses homicídios - que eles registraram como alto de resistência — foram, na verdade, homicídios cometidos por eles. Se comprovado, eles serão responsabilizamos, disse o promotor Matheus Rezende.
Os promotores investigam o assassinato de um homem — que seria traficante — na comunidade da Vila Rute, em São João de Meriti. Em conversa por aplicativo de mensagem com policiais militares, obtidas por autorização judicial, um PM afirma que o suspeito foi morto dormindo.
"Em relação ao caso do traficante da Vila Rute, muitas das vezes existe um auto de resistência. Nesse caso, há indícios que não houve auto de resistência e sim execução. Vamos apurar se houve ou não. Se não comprovar o auto de resistência, eles serão indiciados por homicídio. Eles falam em menções de pegar ele dormindo. Essa operação precisou ser rápida porque eles são perigosos", disse o promotor Eduardo Pinho.
O sargento da PM Adelmo da Silva Guerini Fernandes é quem escreve a mensagem que sugere, segundo o MPRJ, que um traficante foi morto enquanto dormia. O homicídio ainda teria motivado um outro criminoso passar a ser informante do grupo de agentes. O policial militar que recebe a mensagem pelo aplicatvo do celular comemora.
Ainda de acordo com o promotor Matheus Rezende, em conversas de um grupo de mensagens instantâneas, os policiais falavam em matas criminosos e até divulgavam imagens de pessoas sendo torturadas.
"Eles falavam em assassinatos. No telefone do Adelmo encontramos mensagens e vídeos de um cidadão sendo torturado em uma viatura policial. Ele leva socos, tapas e usando um saco preto. Nessas imagens, eles falam que a pessoa usou muito saco preto."
PM tentou dispensar armas, munições e dinheiro jogando material para casa de vizinho
Segundo o MPRJ, durante as buscas na casa do subtenente Antônio Carlos dos Santos Alves, o Santinho, o militar tentou se desfazer de armas, munições e dinheiro, jogando o material escondido em mochilas para a casa de um vizinho. Os agentes apreenderam armas pesadas, munição, radiocomunicadores, joias e R$ 120 mil em espécie no local, sendo esse apenas um dos endereços de buscas
"Na casa do Antônio Carlos, o Santinho, ele tentou não receber os agentes e, logo em seguida, a esposa abriu a porta e vimos ele jogando mochilas para os vizinhos. Tínhamos vários materiais, oito tipos de munições, silenciadores. Ele admitiu que o material foi arrecadado nas comunidades", disse a promotora Juliana Mônica Cabaleiro.
Ainda de acordo com a promotora, uma camisa com inscrições da Polícia Civil, além de uma balaclava, estavam nos objetos dispensados. Segundo Cabaleiro, o material era usado para extorsões
"A camisa e a touca da Polícia Civil eram usados para esses crimes."
Um dos endereços de buscas dos promotores durante a operação foi o 15º BPM (Duque de Caxias). No local, na sala do chefe do Serviço Reservado (P2) do batalhão, o capitão Anderson Santos Orrico, foram encontrados R$ 37 mil em dinheiro, escondidos embaixo de um sofá. Antes, na casa do militar os agentes retiveram R$ 96 mil. Orrico era um dos alvos da operação, e contra ele haviam mandados de busca e apreensão.
Operação terá segunda fase
A participação de policiais civis na quadrilha de PMs que são acusados na ação desta quinta-feira não está descartada, segundo o Ministério Público do Rio. De acordo com a promotoria, esses agentes da Polícia Civil serão alvos de uma segunda fase da investigação da Operação Mercenários.
Segundo a denúncia do MP, que culminou nesta ação, no dia 7 de abril de 2020, os sargentos da PM Adelmo da Silva Guerini Fernandes, Mário Paiva Saraiva, Denilson de Araújo Sardinha e o subtenente Antônio Carlos dos Santos Alves, além de policiais civis não identificados, exigiram R$ 1 milhão de Leonardo Serpa de Jesus, conhecido como Leo Marrinha, chefe do tráfico do Cantagalo-Pavão-Pavãozinho, entre Copacabana e Ipanema, não fosse detido.
Em seguida, o policial da UPP respondeu ao colega, informando o apelido do chefe da favela vizinha, além de fotos de Leo Marrinha. O sargento Adelmo confirmou a prisão do traficante com a mensagem: "está na minha mão", complementando: "está totalmente diferente". O diálogo prossegue com Diego, que o parabeniza pela prisão: “bingou bonitão”.
Um dia depois da prisão, o policial da UPP pergunta a Adelmo se “deu bom”. O sargento afirma: “bom demais”. Adelmo sonda o colega para saber se ele tem notícias da favela (Chapéu Mangueira-Babilônia, que é da área de atuação da UPP de Diego), provavelmente, referindo-se à prisão do chefe do tráfico, e pede contato de alguém do Cantagalo-Pavão-Pavãozinho. Diego informa que não soube de nada a respeito e que não conhecia ninguém da comunidade vizinha.
De acordo com a denúncia, os investigadores interpretaram uma mensagem que, para eles, foi "simbólica". Depois de escrever o "bom demais", Adelmo enviou um texto pelo aplicativo com o número “1” seguido da imagem de um “milho”. Além disso, o denunciado relatou que metade do valor ficou com sua equipe e a outra “metade pra PC”. Para os promotores do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, Adelmo revela com isso que sua equipe e policiais civis conseguiram R$ 1 milhão do chefe do tráfico para não levá-lo à delegacia e prendê-lo, como determina a lei.
Agora, os promotores vão aprofundar as investigações para saber quem são esses policiais.
"Vamos analisar quem seriam esses policiais civis e de quais delegacias eles pertencem. Identificados, serão denunciados e terão que pagar por seus crimes", destacou o promotor Eduardo Pinho.
Procurada, a Polícia Civil enviou uma nota em que afirma que a informação não passa de “ilações sem comprovação de investigação, tanto que a Polícia Civil não foi alvo da operação”. A corporação destacou ainda que o policial militar “não tem credibilidade nenhuma e desqualifica a imagem da instituição”.
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