No último domingo (28), o presidente da Venezuela Nicolás Maduro chegou ao Brasil após receber o convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para participar da cúpula dos países sul-americanos, a Unasul, nesta terça-feira (30), em Brasília. O governante venezuelano foi para capital federal brasileira para ter uma reunião bilateral com o petista na segunda (29).
Maduro não pisava no Brasil desde 2015, quando o Palácio do Planalto ainda era ocupado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT). No ano seguinte, Michel Temer (MDB-SP) passou a tratar o presidente venezuelano como inimigo e, a partir de 2019, Jair Bolsonaro (PL-RJ) cortou relações com a Venezuela.
Com o retorno do PT ao poder, o governo venezuelano voltou a se relacionar com o Brasil. Na segunda, Maduro e Lula se encontraram e o presidente brasileiro chegou a dizer que era “um momento histórico”.
"Você sabe a narrativa que se construiu contra a Venezuela. Da antidemocracia, do autoritarismo… Então eu acho que cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa, para que possa efetivamente fazer as pessoas mudarem de opinião. (...) E eu acho que, por tudo que nós conversamos, a sua narrativa vai ser infinitamente melhor que a narrativa que eles têm contado contra você", falou o presidente brasileiro em entrevista no Palácio do Planalto, ao lado de Maduro.
O encontro, porém, não agradou a todos. A oposição acusou o petista de apoiar um “ditador” e protocolou uma série de requerimentos exigindo do governo respostas sobre o encontro. Parlamentares que são contra a gestão Lula também apresentaram notas de repúdio contra a vinda de Maduro a Brasília.
O cientista político especializado em relações internacionais e professor do Insper, Leandro Consentino, diz que o tratamento com "tapete vermelho" dado por Lula a Maduro pode prejudicar o presidente brasileiro em vários aspectos políticos.
"Na política interna, Lula fortalece a oposição e passa recibo de que defende mais a questão ideológica do que a democracia, algo que sempre foi acusado pelos seus opositores", analisa.
Quem é Nicolás Maduro?
Maduro nasceu em 23 de novembro de 1962 em Caracas, capital venezuelana. Ele iniciou sua carreira política na década de 1990, integrando o Partido Socialista Unido da Venezuela. Tornou-se uma liderança influente no país ao ser Ministro das Relações Exteriores.
Passou a ser visto como uma figura de total confiança de Hugo Chávez, ex-presidente do país, tanto que se tornou vice-presidente em 2012. No mesmo ano, assumiu interinamente a presidência, porque Chávez enfrentava um câncer e precisou se afastar do governo.
Em 2013, Hugo Chávez morreu e Maduro foi nomeado oficialmente presidente da Venezuela.
Foi em suas mãos que a economia venezuelana passou por enorme declínio, encolhendo 75% nos últimos 10 anos. Cerca de sete milhões de venezuelanos deixaram o país na última década por conta das dificuldades financeiras.
Na ocasião, Maduro chegou a dizer que a saída de venezuelanos do país era uma “campanha da direita” e garantiu que todos iriam voltar com as medidas adotadas pelo governo.
Em 2018, o presidente da Venezuela foi reeleito para mais seis anos de governo. Porém, o processo eleitoral recebeu acusações de fraudes e teve alta taxa de abstenção. A oposição não reconheceu o resultado e ganhou o apoio de dezenas de países, como Estados Unidos, Canadá, membros da União Europeia e o Brasil.
Sem reconhecer a vitória de Maduro, vários países passaram a tratar o opositor Juan Guaidó como presidente legítimo da Venezuela. O prestígio de Guaidó, no entanto, se perdeu ao longo do tempo, principalmente depois que Joe Biden venceu a eleição norte-americana em 2020.
A Casa Branca então aplicou fortes sanções contra a Venezuela, piorando ainda mais a vida da população. Apagões, taxa de desemprego alcançando quase 65%, escassez de alimentos, violência urbana, violação de direitos humanos, perseguição e censura são alguns dos problemas que ocorrem por lá.
Maduro é narcotraficante?
Em 2020, o governo dos Estados Unidos acusou formalmente Maduro de ser narcotraficante. A declaração foi feita pelo então chefe do Departamento de Justiça, William Barr, que prometeu uma recompensa de US$ 15 milhões para quem capturasse o presidente venezuelano.
“O povo venezuelano merece um Governo representativo responsável e transparente a serviço das necessidades das pessoas, que não traia a confiança do povo ao perdoar ou empregar funcionários públicos envolvidos no tráfico ilegal de narcóticos”, afirmou em nota o então secretário de Estado, Mike Pompeo.
Além de Maduro, outras 14 pessoas ligadas ao governo venezuelano são acusadas pelos Estados Unidos por suposta ligação com o cartel Los Soles, incluindo o ministro da Defesa e o presidente da Suprema Corte Venezuelana.
Maduro, por sua vez, acusa os EUA e a Colômbia de conspirar contra o seu país.
“Ratifico minha denúncia! EUA e Colômbia conspiram e deram a ordem de levar a violência à Venezuela. Como chefe de Estado, sou obrigado a defender a paz e a estabilidade de toda a pátria, em qualquer circunstância. Não puderam nem poderão!”, respondeu Maduro.
Lula e Maduro
Em 2016, Maduro se posicionou contra o impeachment de Dilma e criticou Michel Temer. Em contrapartida, o PT defendeu o presidente venezuelano em 2018, alegando que o Brasil não poderia romper relações com a Venezuela e que se negou a chamar de Guaidó de governante do país vizinho.
Em 2022, Maduro demonstrou apoio a Lula nas eleições do Brasil. Com a vitória petista, o governo venezuelano afirmou estar ansioso para que pudesse retomar as relações comerciais com os brasileiros.
Em 2023, ao tomar posse, Lula retomou de imediato as relações diplomáticas e convidou o governante venezuelano para estar no Brasil no começo desta semana.
“A Venezuela sempre foi um parceiro excepcional para o Brasil, mas, por conta das contingências políticas e os equívocos, o presidente Maduro ficou oito anos sem vir ao Brasil, e o Brasil ficou muito tempo sem ir a Venezuela, e nós temos um pequeno problema de ordem política, de ordem cultural, de ordem econômica e de ordem comercial”, falou o petista em coletiva de imprensa no Palácio do Planalto.
O momento mais polêmico do discurso de Lula foi quando declarou que a Venezuela é “vítima de uma narrativa de antidemocracia e autoritarismo”.
Carolina Jiménez Sandoval, presidente do Escritório de Washington para a América Latina (Wola), organização não-governamental (ONG) baseada na capital Washington, nos Estados Unidos, rebateu. “Graves violações de direitos humanos não são uma ‘narrativa’. A dor das vítimas não é uma ‘narrativa'”.
Oposição a Lula também não aprovou o comportamento do presidente e apresentou uma série de requerimentos repudiando a declaração.
O professor Leandro Consentino também enxerga como um equívoco a postura adotada pelo mandatário brasileiro em relação a Venezuela.
"Lula se prejudica internacionalmente ao tentar emplacar a narrativa que a Venezuela é uma democracia. O regime de Maduro fere os direitos humanos e persegue opositores. O presidente brasileiro, ao se colocar do lado do governo venezuelano, perde liderança ao discursar sobre defensor da democracia", aponta.
"Ao puxar a Venezuela, e não mudar a falsa narrativa sobre democracia no país, Lula joga o jogo de China e Rússia, que também não são democracias", acrescenta.
A vinda de Maduro ao Brasil
O presidente venezuelano está em Brasília porque foi convidado para participar da reunião da Unasul (União das Nações Sul-americanas), que ocorreu nesta terça, no Palácio do Itamaraty. Ele também se reuniu na segunda com Lula para um encontro bilateral.
A Unasul teve sua primeira reunião em 2008 por conta de Lula e Hugo Chávez, responsáveis por governar o Brasil e a Venezuela, respectivamente. O encontro do grupo serve para que lideranças de 12 países da América do Sul, exceção neste ano do Peru, discutam medidas de cooperação em diversas áreas como educação, saúde, meio ambiente, segurança nas fronteiras, entre outras.
O professor Leandro relata que Lula se reaproxima dos venezuelanos por alinhamento ideológico e porque quer ter um discurso diferente do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ). "Ele tenta mudar a narrativa de que a Venezuela não é uma ditadura".
Mas que o posicionamento não funcionará, pois lideranças internacionais sabem que o país vive uma ditadura. "É uma visão do Luis Alberto Lacalle, presidente do Uruguai, que é de direita, e também de Gabriel Boric, presidente do Chile, que é de esquerda", pontua.
Por fim, Consentino diz que é importante o Brasil manter relações diplomáticas e comerciais com os venezuelanos, porque o país vizinho tem influência, principalmente na América Latina por ter reservas de petróleo. Porém, ele acredita que Lula deveria tentar fazer com que a Venezuela siga o caminho da democracia.
Perguntas e respostas
1. Quem é Nicolás Maduro?
– Presidente da Venezuela desde 2013
2. Nicolás Maduro tem quantos anos?
– Ele nasceu em 23 de novembro de 1962, ou seja, tem 60 anos
3. Nicolás Maduro é casado e tem filhos?
– O presidente venezuelano é casado com Cilia Flores. O casal tem um filho.
4. Qual o partido de Maduro? Antes de ser político, o que ele fazia?
– Maduro era maquinista. Ele parte do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) desde a década de 1990.
5. Como ele chegou ao poder?
– Após ser ministro das Relações Exteriores do governo Hugo Chávez, tornou-se vice-presidente em 2012. Com a morte de Chávez em 2013, Maduro assumiu o poder.
6. A Venezuela é uma ditadura?
– Órgãos internacionais, como a ONU, diz que a Venezuela vive atualmente em uma ditadura. O governo Maduro é acusado de violar os direitos humanos, censurar a imprensa, não autorizar a independência entre os poderes, usar órgãos estatais de segurança e inteligência, aparelhar as Forças Armadas ao governo e não ter feito eleições justas em 2018.
Já Maduro e países que defendem o governo venezuelano, como a Rússia e a China, dizem que a Venezuela é vítima de uma narrativa negativa dos Estados Unidos.
7. Maduro é narcotraficante?
Os Estados Unidos acusaram Maduro em 2020 de ser chefe de um grupo que vende drogas internacionalmente. O presidente Venezuela nega as acusações e afirma ser vítima de perseguição.
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