Após meses de afastamento "por questões ideológicas", as relações bilaterais entre Brasil e Estados Unidos atravessam um "estágio positivo", afirmou o Itamaraty nesta sexta-feira. De acordo com a diplomacia brasileira, o saldo da primeira reunião do presidente Jair Bolsonaro com seu par americano, Joe Biden, foi bom e abre caminho para maiores colaborações futuras.
Em nota, o Ministério de Relações Exteriores afirmou que Bolsonaro "agradeceu o convite" para a Cúpula das Américas, em Los Angeles, e para o encontro a portas fechadas— que ocorreu porque "a agenda foi acertada" anteriormente, conforme declarou o presidente brasileiro. A reunião, disse o ministério, permitiu "ampla troca de opiniões sobre temas da agenda bilateral, regional e internacional".
"Brasil e Estados Unidos mantêm quase dois séculos de relações diplomáticas, relacionamento baseado em princípios e valores compartilhados, como a democracia, o estado de Direito, a liberdade econômica e os direitos humanos", diz o comunicado.
A relação entre os líderes era fria desde antes da posse do democrata, em 20 de janeiro de 2021, após o presidente brasileiro declarar apoio à reeleição de Donald Trump. Até o ínicio desta semana, Bolsonaro mencionava suspeitas de fraude nunca comprovadas na eleição americana de 2020, ponto-chave da a retórica falsa de que a eleição foi roubada.
O próprio Bolsonaro reconheceu na quinta que o afastamento ocorreu por "questões ideológicas", mas boa recepção americana, sem saias justas, parece ter mudado a atmosfera. Segundo informações apuradas pelo GLOBO, fontes do governo brasileiro asseguraram que nas conversas bilaterais não houve cobranças sobre democracia, meio ambiente, ataques ao Supremo Tribunal Federal ou eleições.
As relações bilaterais, disse o Itamaraty nesta sexta, "passam por estágio positivo, havendo amplas possibilidades de aprofundar a cooperação em temas como energia, defesa, espaço, ciência e tecnologia e comércio e investimentos". Haverá ênfase, continuou a diplomacia brasileira, numa maior integração de cadeias de suprimentos em setores chaves para as duas economias.
A viagem de Bolsonaro a Los Angeles aconteceu após Biden enviar a Brasília um representante para convencer o presidente brasileiro a participar, evitando assim que o encontro de presidentes fosse um total fracasso para a Casa Branca. A ausência do presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, em particular, foi um golpe duro para o governo americano.
López Obrador disse que só iria se os EUA convidassem todos os países latino-americanos, mas Washington deu o braço a torcer e deixou de fora Cuba, Nicarágua e Venezuela, três regimes que não considera democráticos. Também se ausentaram os chefes de Estado de Honduras, El Salvador, Uruguai, Guatemala e Bolívia, entre outros.
Segundo o Itamaraty, o presidente brasileiro expressou também desejo de "seguir trabalhando com os Estados Unidos em prol dos valores democráticos no hemisfério". Apesar de dar declarações domésticas pondo em xeque, sem qualquer evidência, a lisura do sistema eleitoral brasileiro e indicando que pode questionar uma possível derrota, Bolsonaro disse pessoalmente a Biden que quando deixar o governo, "também será de forma democrática".
Contar com a participação do Brasil era fundamental para derrubar a narrativa de que os EUA não conseguiram trazer países de peso até Los Angeles. A reunião bilateral, ofertada na tentativa de convencer Bolsonaro a viajar, tratou ainda da importância da cooperação bilateral em assuntos como o combate à pandemia, segurança alimentar e questões relacionadas à transição energética e ao desenvolvimento sustentável.
A nota do Itamaraty disse que os presidentes trataram da "importância de manter diálogo reforçado entre os dois países em foros internacionais", apesar das críticas ferrenhas da política externa de Bolsonaro ao multilateralismo, em particular durante o período do ex-ministro Ernesto Araújo no Itamaraty. Entre as organizações citadas nominalmente estão a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a qual o Brasil deseja aderir, e o Conselho de Segurança das Nações Unidas, cuja presidência caberá à delegação brasileira a partir de julho.
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