A destruição da Amazônia por queimadas acelerou fortemente e está 30% acima da média histórica, superando as projeções mais sombrias. O total de floresta queimada em 2022 já supera o do mesmo período de 2021, mostra o sistema de alertas do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ).
O desastre nada tem de natural. É resultado da ação humana, afirma a coordenadora do Lasa, Renata Libonati.
Até a última quarta-feira, dia 13, já haviam sido queimados 622 mil hectares. No mesmo período de 2021, 490 mil hectares de florestas haviam sido transformados em cinzas na Amazônia. Tanto 2021 e ainda mais 2022 estão acima da média histórica dos últimos 10 anos, que é de 440 mil hectares destruídos pelo fogo, no período de 1º de janeiro a 13 julho em relação ao mesmo período de 2021.
Libonati frisa que os dados não se referem a focos de calor, como os emitidos pelo sistema de detecção de queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Assim, como o Deter, outro sistema do Inpe, que emite alertas de desmatamento, o Lasa, fornece alertas de área queimada, em tempo quase real.
“Foco de calor é informação pontual de onde está queimando naquele momento. Os dados do Lasa são de quantidade de área de afetada pelo fogo. É o quanto já foi perdido para o fogo só em 2022”, explica Libonati.
O Lasa, pioneiro em alerta e análises de incêndios do Pantanal, implantou este ano um sistema de alarme para a Amazônia. Os mapas de área queimada são produzidos diariamente com resolução espacial de 500m para Cerrado, Pantanal e Amazônia.
O sistema usa imagens do sensor Visible Infrared Imaging Radiometer Suite (VIIRS), focos de calor do mesmo sensor, e técnicas de aprendizado profundo (deep learning). Funciona em paralelo aos sistemas de detecção de desmatamento e queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Nos últimos sete dias, houve uma média de 10 mil hectares de floresta destruídos pelo fogo por dia. Na última semana queimaram por dia 10 mil campos de futebol na Amazônia. Isso comparado a uma média de 15 dias, eram 9 mil hectares por dia. Há 30 dias, 8,5 mil hectares por dia. Há 60 dias, pouco mais de 6,5 mil hectares por dia.
A média móvel semanal da Amazônia está aumentando à medida que o período seco avança. Como o auge da seca, é nos meses de julho, agosto e setembro, a perspectiva é de uma destruição recorde da floresta.
Libonati que diz que este ano, até agora, as queimadas têm afetado a região que tem sido chamada de Amacro, acrônimo para Amazonas, Acre e Rondônia. Essa é a região é uma fronteira agrícola relativamente nova, com aumento descontrolado de desmatamento.
Outra região que está queimando bastante em julho é o norte do Mato Grosso. Também há áreas incendiadas no Pará, seguindo a BR-163, conhecida como a rodovia do desmatamento.
Terras indígenas e unidades de conservação estão com focos de incêndio A mais afetada é a Reserva Extrativista Ipê, no município de Novo Airão (AM), dentro da Amacro.
O fogo em florestas úmidas como a Amazônia está ligado à ação humana. Ele é usado no desmatamento ou para limpar áreas de pastagens.
Libonati explica que o desmatamento usa o fogo como parte de seu processo. Primeiro, se derruba a mata. Depois, o material é empilhado, se espera a madeira secar e se coloca fogo para descarta-la. Isso quase sempre foge de controle e passa para a floresta adjacente.
O escape de fogo é mais perigoso e frequente no período de seca. Isso ficou claro em períodos de seca extrema, como em 2005, 2010 e 2015. As condições meteorológicas são importantes, mas não são suficientes.
A ação humana é necessária para que o fogo ocorra. Não haveria fogo sem isso. O fogo de origem natural só ocorreria por descargas atmosféricas, mas isso não é frequente e no período seco é ainda mais difícil.
“Fogo na Amazônia só acontece por ação humana. Sem alguém para começar o incêndio, não há fogo na Amazônia. E ação humana relacionada ao fogo é sobretudo o desmatamento”, enfatiza Libonati.
O melhor exemplo, diz ela, é a seca de 2015 e 2016, a mais severa registrada na Amazônia. Aconteceram incêndios, mas eles não foram tão devastadores quanto agora porque as taxas de desmatamento eram menores.
“Não havia muita ignição. Mas desde então, o desmatamento veio aumentando, sobretudo a partir de 2019. Este ano já estamos vendo um grande aumento”, salienta a cientista.
Os dados do Lasa se somam aos do Inpe e de outros sistemas de detecção e reforçam as projeções de que a Amazônia poderá sofrer uma destruição sem precedentes nos próximos meses.
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