
O Colégio Santa Cruz, uma das escolas mais tradicionais de São Paulo, localizada no Alto de Pinheiros, na Zona Oeste, suspendeu 34 alunos por praticarem bullying contra os colegas em um grupo no WhatsApp. Após a repercussão do caso, internautas foram às redes sociais para cobrar a expulsão dos envolvidos.
"Os estudantes do ensino médio que praticaram racismo e homofobia via grupos de WhatsApp, deveriam ser expulsos, né, gente? A sociedade não aguenta mais esse monte de projeto de opressores virando opressores de fato na vida adulta. Suspender foi cafuné, poxa", diz um dos comentários.
"Expulsem os alunos que cometeram crime", diz outro usuário.
Um dos internautas parabeniza a escola pela atitude tomada. "Parabéns pela suspensão dos alunos por ter praticado bullying! Espero que os pais deles coloquem a mão na consciência do tipo de merda de ser humano que estão criando", diz.
Outro usuário respondeu: "suspensão? Deveriam ser EXPULSOS!! Racismo, homofobia, bullying É CRIME!!! Se fosse escolinha de zé ruela até os pais estavam respondendo processo!".
Em nota enviada ao Portal iG, a escola esclarece que está "tomando as medidas educacionais cabíveis e comunicando-as aos alunos e às famílias envolvidas." Além disso, afirma que "repudia qualquer forma de violência e lamenta profundamente que tais atos tenham ocorrido entre estudantes da escola". (Confira a nota completa abaixo).
Entenda o que aconteceu
Apesar do número de alunos suspensos ser 34, seriam 200 estudantes que participavam do grupo, em que trocavam mensagens de cunho racista, homofóbico e misógino, inclusive com ameaças de estupro.
A dinâmica consistia nos alunos mais velhos praticando uma espécie de "trote" contra os calouros, conforme revelado pela coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo.
Por exemplo, os alunos mais novos eram 'proibidos' de usar um banheiro que, segundo os agressores, era reservado para eles. Além disso, eram obrigados a pagar coisas para os veteranos, inclusive com transações via Pix.
A direção do colégio apura o nível de envolvimento de cada aluno. Alguns dos estudantes identificados foram suspensos por tempo indeterminado, enquanto outros ficarão longe das aulas por apenas dois dias.
Escola afirma ter missão 'ética' e tem programa de diversidade
No site da instituição, consta que sua missão é "contribuir para a educação de cidadãos críticos, com sólida formação acadêmica e cultural, eticamente comprometidos com os valores humanistas e cristãos em um ambiente escolar plural, vigoroso e criativo".
Além disso, afirma que o projeto educa os alunos e alunas para que "sejam capazes de conciliar as próprias escolhas com a construção de uma sociedade mais igualitária e sustentável, que respeite os direitos humanos e a diversidade de ideias".
O portal também destaca o Programa Santa Plural, que busca "combater o racismo estrutural e promover uma educação antirracista para nossos estudantes". De acordo com a assessoria da escola, a iniciativa abrange apenas os alunos da educação básica e não se estende ao ensino médio.
Impacto "devastador", diz especialista
No caso do Colégio Santa Cruz, a violência virtual dos alunos se estendeu para o ambiente escolar: as mensagens tiveram efeitos reais no cotidiano dos estudantes, considerando os relatos de segregação e de extorsão descobertos pela investigação.
De acordo com a Dra. Francine Marciano, especialista no combate ao bullying, quando o bullying e o cyberbullying se misturam, há um impacto "devastador" na vida das vítimas.
"A vítima não consegue encontrar refúgio. (...) Isso pode levar a danos emocionais profundos, como ansiedade, depressão e síndrome do pânico, além de prejudicar diretamente o desempenho acadêmico e a socialização do aluno", diz.
Além disso, ela explica que não é correto pensar que apenas os alvos do bullying são afetados: na verdade, os efeitos colaterais da prática abrangem toda a comunidade escolar.
"Os espectadores, os alunos que assistem ao bullying, podem desenvolver medo, culpa e insegurança. Os professores e funcionários sofrem com um ambiente de trabalho tenso, afetando sua motivação e capacidade de ensino. E a própria instituição pode ter sua reputação manchada, enfrentar processos judiciais e perder credibilidade perante a comunidade", diz a especialista.
Quando questionada se apenas a suspensão seria uma medida contundente, Francine defende que a solução não se resume a punições mais severas, como o que os internautas têm sugerido nas redes das escolas.
"Estamos lidando com crianças e adolescentes em processo de formação, não com criminosos. Punir sem educar não previne novos casos, apenas afasta os alunos sem trabalhar a raiz do problema", explica, listando quatro fatores que, segundo ela, realmente "transformam vidas". São eles:
- Prevenção e conscientização: a escola precisa atuar antes que a violência escale, evitando consequências mais graves
- Diálogo e mediação: conversas estruturadas com os envolvidos para que entendam o impacto de seus atos
- Intervenção imediata: a escola deve agir rapidamente, mas com foco em educação, e não apenas punição
- Acompanhamento psicológico e socioemocional: tanto para as vítimas quanto para os autores, prevenindo novas ocorrências.
Confira a nota da escola na íntegra
"Recebemos denúncias de agressões em grupo de WhatsApp envolvendo alunos do ensino médio do colégio. Prontamente, iniciamos a apuração dos fatos e estamos tomando as medidas educacionais cabíveis e comunicando-as aos alunos e às famílias envolvidas.
O Colégio Santa Cruz, instituição pautada pelo respeito ao ser humano, repudia qualquer forma de violência e lamenta profundamente que tais atos tenham ocorrido entre estudantes da escola."
A escola também divulgou uma carta aberta à comunidade:
"Caras famílias e caros educadores,
Expressamos nossa tristeza e profunda indignação em relação às agressões entre alunos do ensino médio do colégio, em grupos de WhatsApp, das quais tomamos conhecimento esta semana e que ferem valores estruturais do Colégio Santa Cruz, de convivência ética e respeito ao próximo, trabalhados cotidianamente pelos educadores junto aos estudantes da escola.
Esclarecemos que, após receber denúncias, começamos prontamente a apuração dos fatos, o que nos levou a realizar uma série de ações, entre as quais a de suspender 34 alunos diretamente envolvidos no caso e a de ampliar um trabalho com todos os estudantes do ensino médio no sentido de conscientizá-los sobre a violência das relações entre eles e implicá-los na construção de um ambiente mais respeitoso, também nas redes digitais. Esse trabalho e essa discussão estão sendo estendidos para outros grupos de estudantes.
Estamos promovendo também reuniões com todas as familias do curso, pois acreditamos que a confiança e a parceria no trabalho educativo dos estudantes são condição para enfrentarmos juntos os desafios da vida em sociedade, em tempos tão complexos.
Agradecemos as mensagens recebidas de familias, ex-alunos e educadores neste momento dificil e contamos com o cuidado de todos para proteger a identidade dos nossos alunos.
Continuaremos firmes com o propósito de educar nossos estudantes de acordo com os principios humanistas e cristãos do Colégio Santa Cruz, ancorados no respeito, na empatia e na dignidade.
Equipe de Direção do Colégio Santa Cruz".