Pressionado após a decisão de manter a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para os dias 1 e 8 de novembro, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) anunciou o adiamento das datas e prorrogou as inscrições.
Apesar do desfecho, a maneira como o Ministério da Educação (MEC) conduziu a questão levantou um debate sobre a necessidade de que a pasta atue com mais transparência.
Para Nora Krawczyk , integrante do Grupo e Pesquisa em Políticas Públicas, Educação e Sociedade (GPPES), as decisões do MEC causaram um estresse desnecessário aos candidatos.
A situação poderia ter sido menos dramática se houvesse um diálogo direto com profissionais da educação, como reitores, e, principalmente, com o Ministério da Saúde , que segue sob o comando interino de Eduardo Pazuello, após as saídas de Nelson Teich e Henrique Mandetta.
"Para definir uma situação dessa importância, primeiro tem que ter um ministro de Saúde, uma política de Saúde. Porque dentro da indefinição da situação, da imprevisibilidade, nós podemos ter diferentes cenários possíveis nos próximos meses ou semanas. Sem uma política de saúde estamos totalmente à deriva. Dentro deste cenário, se houvesse uma conversa entre Educação e Saúde, isso permitiria criar a possibilidade do que fazer com relação ao Enem", diz Krawczyk.
"Seria preciso conversar com uma equipe que tivesse uma política de saúde, conversar com reitores das universidades para ver, conjuntamente, as possibilidades frente a essa situação, e a partir daí tomar uma decisão fundamentada e explicar aos jovens a fundamentação", completo.
Integrante do Conselho Nacional de Educação (CNE) e presidente da Associação Brasileira de Avaliação Educacional (Ababe) , Maria Helena Guimarães também acredita que as estratégias adotadas pelo MEC e pelo Inep foram precipitadas. Ela considera, inclusive, que não estabelecer data alguma no momento seria o caminho mais adequado dentro do contexto da pandemia de Covid-19.
"Eu entendo que é preciso ter transparência, respeito pelas famílias, pela sociedade, e abrir a possibilidade de um diálogo, entendendo a circunstância, que é muito imprevisível, portanto não faz sentido ter uma data", avalia Guimarães, que já foi Secretária de Educação de São Paulo.
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Pressão
O Inep anunciou, na última quarta-feira (19), que fará uma enquete com os inscritos, até o final de junho, para saber quanto tempo de adiamento eles preferem, com limite de 60 dias.
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Inicialmente, o exame estava marcado para os dias 1 e 8 de novembro. Diante dessa definição, o Enem deve ser realizado no máximo até os primeiros dias de janeiro.
A medida foi anunciada um dia depois de o Senado aprovar um projeto de lei, assinado pela senadora Daniella Ribeiro (PP-PB), que previa o adiamento. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já havia avisado que agilizaria a votação do PL, ainda na quarta, mas a decisão do Inep freou essa necessidade.
Maia revelou, posteriormente, que aconselhou Bolsonaro a adiar os exames. Além disso, afirmou que não confia no Ministro da Educação, Abraham Weintraub , e que só vai aceitar a decisão quando for publicada alguma portaria a respeito.
"O ministro, desculpa, não posso acreditar nesse ministro. O que eu proponho é que a gente vote a urgência e espere a posição do presidente da República”, disse Maia.
Depois do adiamento das provas, Weintraub , mais uma vez pressionado, anunciou a prorrogação das inscrições, que se encerrariam nesta sexta-feira (22). Agora, os estudantes podem se inscrever até às 23h59 do dia 27 de maio, próxima quarta-feira.
Riscos ainda existem
Maria Helena Guimarães defende que, no momento, sejam levantadas informações sobre a real condição dos candidatos do Enem , para que os danos sejam reduzidos.
"Uma tragédia acontecendo com o Brasil, a situação é dramática. Eu acho absolutamente inadequado nós nos fixarmos em uma data para os alunos que estão frequentando o Ensino Médio e fazendo EJA (Educação de Jovens Adultos) de Ensino Médio agora. Isso causa uma ansiedade brutal nestes alunos, não sabemos se eles estão aprendendo, com condições de acessar algum curso preparatório", afirma.
A presidente da ABAVE também acredita que vale ser discutida a adoção de datas diferentes de acordo com o perfil do aluno, uma vez que uma parcela significativa dos candidatos é formada por pessoas que já concluíram o Ensino Médio e, na maioria dos casos, estudam em cursinhos pré-vestibular.
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"Eu imagino, pelos dados que normalmente nós temos de participação, que seria desejável, por exemplo, manter o Enem em dezembro ou janeiro para os alunos que já concluíram o Ensino Médio. E fazer um outro Enem em março de 2021, ou até em maio, para os alunos que estão no terceiro ano para que eles tenham essa oportunidade", explica.
Atenção
Já a professora Nora Krawczyk considera que é necessário que educadores, alunos e universidades permaneçam atentos para reivindicar alterações caso a pandemia tome proporções ainda maiores.
"Estão acontecendo coisas muito mais sérias do que a dificuldade de planejamento, está morrendo gente, sem uma política de Saúde. Diante de uma realidade tão grave , a chance de planejar com data é simplesmente negar o que está acontecendo", afirma.