Vinicius Lummertz, ex-ministro do Turismo do Brasil
Alan Morici
Vinicius Lummertz, ex-ministro do Turismo do Brasil

Logo após a divulgação dos resultados do primeiro turno das Eleições 2022 na noite de domingo na Globo News, o jornalista, escritor e talvez o mais lúcido integrante da esquerda brasileira, Fernando Gabeira, foi questionado por suas colegas de estúdio sobre os motivos que levaram o bolsonarismo a ser o grande vencedor no dia 2 de outubro – mesmo que o presidente Jair Bolsonaro tenha ficado em segundo lugar na corrida presidencial, 5,23 pontos abaixo do ex-presidente Lula. Assim como o próprio resultado das urnas, também a resposta de Gabeira provocou visível surpresa nas âncoras do estúdio – e é dessa resposta que retiro a argumentação para esta coluna.

De acordo com Gabeira, neste segundo turno o petismo e o lulismo terão de conquistar votos dos evangélicos – travando maior diálogo e convivendo mais com eles, coisa que não aconteceu no primeiro turno. Mas, disse ele, PT e Lula não devem interpretar a votação do Interior de São Paulo, a votação no meu Estado de origem, Santa Catarina, e no Sul de forma geral, e mesmo em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e estados produtores do Agro mais ao norte, como “regiões evangélicas”, até porque não são necessariamente evangélicos.

Para Gabeira, a questão é outra: ela está ligada aos valores do capitalismo, ao PT aceitar o sucesso do capitalismo nessas regiões e a reação negativa ao socialismo que este sucesso causa; ao PT e a esquerda aceitarem que essas regiões pensam diferente. Assim, aproveitando essa afirmação de Gabeira, acrescento que a história dessas regiões também é outra: é a história de um capitalismo incipiente – no caso de São Paulo após a libertação dos escravos, com a vinda dos imigrantes italianos e depois de outras nacionalidades, com a ocupação dos espaços no interior do Estado pelos produtores, que vieram a crescer e desenvolveram uma economia agrícola pujante, que acumulou recursos para uma industrialização também primeiro incipiente, depois crescente.

No caso do Sul do país, a história é semelhante: são os colonos, pessoas que vieram construir uma vida no campo, com a família e com a enxada, criaram pequenas cidades, iniciando uma produção agrícola em escala, pequenas empresas, produção integrada, pequenas indústrias – esse empreendedorismo é capitalista. Esse ambiente, esse ‘ethos’, o conjunto de costumes e hábitos fundamentais, ele seguiu pelos interiores dos três estados do Sul, para o Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, Goiás, Tocantins, sul do Pará, oeste da Bahia, Tocantins.

Ou seja, são fundamentalmente as regiões onde o bolsonarismo ganhou – e ganhou esse tipo de ‘capitalismo autóctone’ brasileiro que hoje se destaca nas áreas do Agronegócio e também em áreas industriais, como no caso do Sul – especialmente em Santa Catarina.

Voltando a Fernando Gabeira, em resumo o que ele disse é que o petismo e o lulismo não entendem, não buscam entender, e não buscam aceitar esse fato. E eu acrescento que a divisão social do PT e de Lula é a divisão tradicional, a do conflito de classes, que reflete muito mais outros fenômenos do que este que Gabeira chamou a atenção, ou seja, que o capitalismo nesses lugares deu certo. O PT tem dificuldade de entender essa realidade porque esbarra também nos dogmas da velha esquerda latino-americana.

Portanto, assim não só é possível compreender porque o bolsonarismo foi vitorioso nesses estados e regiões, como prever que elas vão ampliar o apoio ao presidente no segundo turno. PT e Lula estão equivocados na leitura de um Brasil que muitos da esquerda chamam de ‘conservador’ e até ‘reacionário’, esquecendo que este é o Brasil mais desenvolvido, que deu certo, e que ficou na parte ‘azul’ do mapa de apuração das Eleições. E que será decisivo para definir quem será o próximo presidente da República.

Por fim, não há alternativa para o Brasil dar certo que não passe pelas partes do Brasil onde ele está dando certo. Para a parte do Brasil que ainda não deu certo – tem enormes desigualdades sociais e de onde continuam emigrando milhares de famílias – é preciso fazer com urgência com que ele também funcione para que todo o Brasil dê certo.

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