Vinícius Lummertz é ex-ministro do Turismo do Brasil
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Vinícius Lummertz é ex-ministro do Turismo do Brasil

Três informações, aparentemente desconectadas, relevaram um paradoxo da dimensão chamada Viagens e Turismo. Como atividade econômica, foi uma das mais castigadas pelo coronavírus. Pelo lado da oferta, empresas fechadas, empregos perdidos, destinos de lazer ou negócios com atividades zeradas; na ponta da demanda, ansiedade para exercer o direito de viajar, independente do destino, tipo de passeio ou motivação.

Bastou a retomada dar sinais de aquecimento e, no intervalo de poucas semanas, a italiana Veneza anunciou que passará a cobrar de 3 a 10 euros dos turistas a partir do ano que vem; a comunidade europeia (Espaço Schengen, a área criada por convenção entre países europeus na qual não há controles fronteiriços ou alfandegários) confirmou que implantará, em 2023, conforme vinha sendo discutido, o ETIAS (Sistema Europeu de Informação de Viagem e Autorização) para viajantes de países isentos de vistos: formulário online e pagamento de 7 euros.

Do lado de cá do Atlântico, na paulista Ubatuba, litoral norte, a sigla é outra: TPA - Taxa de Proteção Ambiental, a ser paga partir de junho, variando de R$ 3,50 (motos) a R$ 92 (ônibus). TPA é cobrada em Bombinhas, Santa Catarina, na alta temporada - por sinal, reajustada em 1º de janeiro: moto, R$ 4; automóvel R$ 33; ônibus, R$ 165.

Os países europeus justificam as preocupações com a segurança para implantar o ETIAS. No caso veneziano o foco são os chamados “turistas pendulares”, eufemismo para o visitante “bate-volta”, que não se hospeda e, portanto, gasta menos. Já para os ubatubenses, o resumo do paradoxo: o objetivo é arrecadar recursos para investir na compensação dos impactos gerados pelo grande fluxo de visitantes.

Ao que tudo indica, a dor da ausência dos turistas vai sendo esquecida. Antes da pandemia os destinos mundiais clássicos – basicamente europeus, como Barcelona – se debatiam com o chamado “overtourism”, ou seja, turistas demais. O excesso que incomodava, a ponto de cidadãos fazerem campanhas que beiravam a xenofobia. “Queremos nossa cidade de volta” era quase um lema.

Na busca de equilíbrio em uma realidade complexa, a decisão tomada foi a de taxar. Querem vir, então paguem. Como se já não o fizessem ao consumir em lojas, restaurantes e atrativos, por exemplo. Em não havendo solução fácil para problema difícil, o risco do “overtourism” e dos excessos continuarem é grande, europeu ou praiano de São Paulo e Santa Catarina.

Antes da pandemia Veneza chegava a receber 590 turistas para cada morador anualmente. Considerando que a Praça de São Marcos ou as pontes não são expansivas, o incômodo é geral – inclusive para os turistas que, quase certo, procurarão outros lugares.

Enquanto isso, milhares de destinos querem receber mais turistas sem estabelecer um pedágio ou qualquer tentativa de criar categorias de visitantes mais bem aceitos (com mais dinheiro, em outras palavras).

No começo do ano, o Centro de Inteligência da Economia do Turismo, que criamos na Secretaria de Turismo e Viagens de São Paulo, divulgou um estudo – “Percepção do Turismo” – que mostrava, em destinos litorâneos, uma certa insatisfação dos moradores com o excesso de turistas nos feriadões e festas de final de ano – mesmo reconhecendo a importância na economia e empregos. As queixas são objetivas: lixo nas ruas, trânsito e falta de segurança.

Enfim, se cobrar taxas pode ser uma fórmula para desestimular fluxos muito concentrados como nas cidades histórias europeias, ao mesmo revelam uma limitação na estratégia de melhorar o turismo em destinos alternativos. No caso de destinos como Veneza ou Barcelona, sendo uma demanda mundial, de fato a hipótese de diminuir o fluxo talvez seja compatível.

No caso brasileiro, as respostas podem estar na ampliação de investimentos em infraestrutura e criação de destinos alternativos pois, de fato, destinos alternativos litorâneos no Brasil não são escassos, muito pelo contrário.

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