Ataque no Centro Educacional Cantinho do Bom Pastor, em Blumenau
Reprodução/TV RBS - 05.04.2023
Ataque no Centro Educacional Cantinho do Bom Pastor, em Blumenau

No momento em que o governo fazia uma pausa na implantação do Novo Ensino Médio, a sociedade foi abalada por mais um massacre em um ambiente educacional. O atentado, que matou quatro crianças em uma creche em Blumenau, Santa Catarina, ocorreu logo após outro ato extremista que resultou na morte de uma professora de 72 anos em São Paulo.

Crime que não acontecia no Brasil...

Esse era um caso que parecia fictício para os brasileiros. Apenas acompanhávamos através de filmes, documentários e pelo distante noticiário internacional. Não imaginávamos que esse tipo de atentado extremista se tornaria tão comum ao ponto de a imprensa, que nunca havia se preocupado em criar um protocolo para cobertura desse tipo de evento, improvisasse uma forma de tratamento para esses casos com a apuração em pleno andamento em Blumenau.

Tragédia anunciada
Não podemos esquecer que sinais estão sendo dados há algum tempo e nós não queríamos enxergar. A violência escolar contra professores e entre estudantes vem aumentando progressivamente. O desrespeito dos pais e das autoridades governamentais em relação aos professores é outro sinal de enfraquecimento do ambiente escolar. A demonização de ícones da educação reconhecidos internacionalmente, como Paulo Freire ou Anísio Teixeira, é outro ponto de corrosão. Isso sem falar na desvalorização profissional, com a deterioração dos salários e das condições de trabalho.

Tudo isso, ao ser colocado em uma mesma panela, resulta em uma pressão que se torna inevitavelmente explosão.

Revisão do Novo Ensino Médio
Não resta a menor dúvida de que o novo Ensino Médio precisa ser rediscutido. É quase um consenso entre os educadores. Porém, o governo atual não pode cair na tentação política de desfazer tudo somente porque foi instituído na gestão passada. Existem muitos pontos positivos, assim como vários que merecem ser reavaliados.  

O modelo proposto não trabalha com alinhamentos entre as escolas principalmente entre as públicas e as privadas. Insistindo no modelo proposto, registraríamos, na verdade, um retrocesso, ao aumentar ainda mais a desigualdade de condições entre estudantes.Essa reforma que estava sendo implantada tende a aprofundar essas diferenças.

E a implantação do novo modelo veio na sequência de outro abismo colossal que se abriu, provocado pelo isolamento por conta da Covid-19 em que as instituições particulares mantiveram seus conteúdos transmitidos no modelo online.  Enquanto isso, muitas públicas sequer possuem computadores e internet. O mesmo panorama se repete entre seus professores e alunos. 

Violência Escolar
Os colégios do Ensino Médio, em maioria pertencentes às redes estaduais, que costumam pagar menos do que as municipais e as federais aos profissionais de ensino, obriga muitos a submeterem-se a dupla regência para sobreviver. Fora isso, ainda convivem com o temor da escalada da violência escolar.

A reforma impõe aos professores e pedagogos profundas mudanças em suas rotinas de trabalho, alteração de suas cargas horárias e mudanças de conteúdos trabalhados, sem que estes tenham sido efetivamente ouvidos, participado da construção do novo "arcabouço" educacional ou ao menos requalificados para adotarem o novo formato.

Arcabouço Educacional
Montaram essa nova matriz em cima de um "mundo do faz de conta" em que colocam todo o ensino num mesmo balaio, quando sabemos que as diferenças e condições são gritantes. Se as mudanças prometem itinerários educacionais promissores para os filhos das classes mais altas, em contrapartida, são poucas as opções de currículos efetivos para os alunos pobres. Ou seja, o Novo Ensino Médio pode ser bom, mas somente para os estudantes das escolas privadas de ponta, que ganham combustível para aumentar ainda mais a distância da desigualdade das redes públicas. Essa diferença remonta à obra "Casa Grande e Senzala" lançada por Gilberto Freyre, em 1933. Fica bem definida a linha da imobilidade social na hora desses jovens disputarem o espaço no mercado de trabalho.

Outro agravante dessa desigualdade é que, pela nova ordem, várias disciplinas generalistas são substituídas por outras direcionadas à escolha profissional feita pelo aluno, ainda muito novo, para assumir essa responsabilidade sobre seu futuro. Enquanto os estudantes das escolas particulares podem contar com psicólogos, orientadores vocacionais e educacionais para ajudarem a encontrar seu itinerário, o mesmo não acontece com a maioria que estuda nas instituições públicas. E ainda, se faltam professores para as disciplinas básicas, como conseguir para as novas criadas?

A reforma desenhada tende a aprofundar as desigualdades educacionais. Por outro lado, é quase uma unanimidade a opinião de que o ensino médio precisa ser modificado. 

Fake News
Como característica dos tempos atuais, as contrainformações acabam tumultuando os processos comunicacionais, com algumas dessas Fake News repetidas por autoridades e até reproduzidas pela imprensa.

O Novo Ensino Médio não foi revogado. Em momento algum o atual governo ameaçou rasgar a reforma! Cautelosos, eles definem como uma suspensão para promoção de ajustes dando um prazo inicial de dois meses para rediscussão. 
É melhor o governo fazer agora esse freio de arrumação do que seguir acelerando em um erro arbitrário. Não se pode politizar na quebra de braço entre direita e esquerda. A formação do adulto de amanhã depende da reavaliação que está ocorrendo agora.

No entanto, sabemos que temas para serem democraticamente decididos precisam ser abordados com cuidado. O temor é que esses dois meses de reavaliação não sejam suficientes para passar a limpo o projeto.

Enquanto isso, os alunos em formação têm pressa, o que acaba afetando e provocando uma incógnita sobre a elaboração do Exame Nacional do Ensino Médio. Embora o Mec tente tranquilizar afirmando que vai manter a base do próximo, não consegue tranquilizar os envolvidos. Os alunos dependem dessa prova para ingressar nas universidades. Por sua vez, as instituições de ensino superior estão cada vez mais dependentes do ENEM como forma de seleção  e ingresso de alunos repercutindo em sua sobrevivência financeira, principalmente as particulares. 

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