Nuno Vasconcellos
Daniel Castro Branco/Agência O Dia
Nuno Vasconcellos


Este domingo de Páscoa nos oferece uma oportunidade que, nos anos anteriores, talvez tenha passado por nós sem que nos déssemos ao trabalho de aproveitá-la. É hora, sim, de comemorar a vida! Da mesma forma, é hora de refletir sobre o sentido do que estamos vivendo. A pandemia provocada pelo coronavírus nos impõe novos hábitos e nos coloca diante de uma realidade até aqui desconhecida. Nesse cenário, o risco trazido pelo coronavírus iguala a todos, independentemente da posição social, da ideologia política ou do clube para o qual torcemos.


Dias atrás, o cônsul-geral da China do Rio de Janeiro, Li Yang, num artigo que pode ser encontrado no site da Câmara de Comércio Brasil-China, referiu-se às mais de três mil vítimas fatais da Covid-19 em seu país com uma frase que nos obriga à reflexão. Segundo ele, as vidas perdidas "não podem renascer, não importa quanto dinheiro você tenha".

Essa realidade, porém, não é admitida por gente que se apoia no vírus para defender suas posições políticas. Pela primeira vez na história, um vírus e uma droga passaram a ter nacionalidade e ideologia. É preciso combater esse tipo de visão.

SEM PRECONCEITOS

Nem o vírus é chinês nem a cloroquina, o remédio que vem sendo recomendado para combate-lo, é de direita. Ponto final. Da mesma maneira, o isolamento social também não foi proposto com a intenção de aprofundar a crise econômica e desestabilizar o governo do presidente Jair Bolsonaro. Essa medida é indicada pela OMS e adotada em sua forma mais radical em Portugal e em outros países que têm conseguido com sucesso conter o ritmo de disseminação da doença.

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Estamos diante de um inimigo que não marcou uma data para ir embora. No dia em que isso acontecer, poderemos assumir nossas diferenças e resolvê-las no ambiente mais adequado. Ou seja, nas urnas eleitorais. Agora, não é hora para isso. O momento exige que as ideologias sejam postas de lado. É preciso, também, nos despirmos de preconceitos e darmos ouvidos à Ciência. Já passou da hora de seguirmos por esse caminho.

Precisamos, por exemplo, parar de fazer da cloroquina um objeto de disputa ideológica. Estudos recentes têm demonstrado que a droga, criada em 1934, pode ser utilizada no tratamento ambulatorial da Covid-19 e tem se mostrado especialmente eficaz na fase inicial da doença. É preciso remover os obstáculos no acesso ao medicamento e deixar a decisão final sobre seu uso para o médico que atua na linha de frente. Ele, apenas ele, no contato direto com o paciente, pode decidir se o remédio deve ser ministrado ou não. Se o paciente fosse eu ou alguém da minha família, eu gostaria, sim, de contar com esse medicamento.

PASSAPORTE CHINÊS

Outra discussão que precisa ser encerrada já diz respeito à nacionalidade do corona. Chamá-lo vírus chinês não o torna menos letal nem o estimula a perguntar a ideologia da vítima antes de infectá-la. Esse tipo de postura, além de contraproducente, nos afasta de possíveis aliados na luta contra a pandemia.

Decisões equivocadas tomadas na origem do problema podem, sim, ter contribuído para agravá-lo. Se elas de fato aconteceram, foram motivadas mais por desconhecimento do que por negligência. Perder tempo discutindo se o vírus viaja pelo mundo com passaporte da República Popular da China serve apenas para desviar o foco de um debate que, agora que já se conhece um pouco mais da doença, pode apressar a solução tão aguardada.

A China tornou-se, por tudo o que enfrentou, o principal centro de conhecimento sobre o coronavírus do mundo. Também é o maior produtor de equipamentos destinados ao tratamento da Covid-19. É preciso desobstruir os canais de comunicação de Brasília com Beijing e cuidar de mantê-los abertos. Vamos aproveitar a Páscoa para pensar sobre isso e parar de nos deixar levar por um papo que até aqui não produziu nem produzirá nada de bom.

 Siga o colunista no Twitter: @nuno_vccls


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