Nuno Vasconcellos
Daniel Castro Branco/Agência O Dia
Nuno Vasconcellos


Para os funcionários públicos do Rio de Janeiro, que imaginavam ter deixado para trás o tempo em que seus salários nunca eram pagos em dia — como aconteceu no tempo de Luiz Fernando Pezão —, o sinal de alerta acaba de ser aceso. Na quarta-feira passada,  O DIA  publicou na Coluna do Servidor, assinada pela jornalista Paloma Savedra, que o estado já admite que a falta de dinheiro atingirá a folha de pagamentos — e que precisa do governo federal para cumprir suas obrigações.


Atrasos como esse são graves em qualquer lugar. No Rio, onde o funcionalismo é uma força vital para o consumo, mais ainda. Com os atrasos, os supermercados vendem menos, o movimento nos bares cai e as mercadorias encalham nas lojas. Sendo assim, e para evitar uma calamidade maior, é fundamental que Brasília inclua o pagamento dos salários do funcionalismo entre as medidas emergenciais para amenizar os efeitos da crise.
Dito isto, é hora de refletir um pouco sobre as providências que levaram as finanças do Rio a esse estado deplorável que, convenhamos, é bem anterior ao primeiro caso de covid-19 diagnosticado no mundo. Além da corrupção, as despesas de custeio, inclusive com o funcionalismo, foram infladas sem que se procurasse saber se, no futuro, haveria dinheiro para cobri-las. Agora, o dinheiro acabou e não adianta se queixar da redução dos royalties do petróleo nem na recessão que se abateu sobre todo o país.

SOBRECARGA FISCAL — O dinheiro ficou mais difícil para todo mundo e, com o caixa da União exaurido pela necessidade de ajudar o país inteiro, o Rio terá que reduzir sua dependência federal e buscar novas fontes de receita própria. A solução mais óbvia, como foi dito aqui há duas semanas, seria o aumento de impostos. Isso, no entanto, teria um efeito tão ou mais devastador do que o do atraso de salários. Com o aumento da sobrecarga fiscal, muitas empresas seriam simplesmente riscadas do mapa e levariam junto os empregos que geram. Não se pode pedir dos empresários qualquer sacrifício adicional ao que eles já têm feito para manter seus negócios funcionando. A questão, portanto, permanece: de onde sairá o dinheiro?

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O melhor que pode acontecer com o Rio neste momento é reconhecer que o modelo atual fracassou e começar tudo outra vez. Essa é, talvez, a grande oportunidade oferecida pela crise: poder zerar tudo e recomeçar em bases diferentes. É preciso rever imediatamente os critérios para contratação de funcionários e impedir que a folha continue inchando. Isso seria um bom começo, mas também não é suficiente para resolver a situação.

PODER PARALELO — O Rio precisa reconstruir a base industrial que teve no passado e fortalecer a que ainda tem. Isso ampliará a oferta de empregos no setor privado e evitará que o estado e o município vivam de pires na mão, esperando a ajuda federal. Um aspecto evidenciado pela crise, que deve ser aproveitado pelo Rio antes que outros larguem na frente, é a necessidade de o país produzir em casa os equipamentos e insumos que hoje vêm do exterior. Não se trata de defender, como no passado, o fechamento do mercado nacional aos artigos importados. Pelo contrário, é preciso escancarar as fronteiras e fazer do Rio um competidor mundial nesses e em outros tipos de equipamentos que serão cada vez mais demandados pelo mundo daqui por diante.
Ninguém está dizendo que será fácil. Para que aconteça, são necessárias medidas que hoje parecem impossíveis — mas não são. Qualquer pessoa sabe, por exemplo, que as milícias e o tráfico em larga escala desestimulam a atração de capitais para o Rio. É obrigatório enfraquecer os criminosos até eliminar seu poder.

Paralelamente a esse esforço, será necessário buscar quem financie os investimentos. O BNDES precisa ser chamado à responsabilidade e ter a decência de cumprir a missão para a qual foi criado: ser um banco de fomento capaz de apoiar o empresário que o procure com um projeto consistente para um negócio viável. E não apoiar apenas os protegidos de Brasília, como fez no passado, nem negar oxigênio a quem trabalha no limite de suas forças, como faz atualmente. Isso será bom para o Rio e para o Brasil.

É preciso, ainda, que o país rompa com o passado populista e adote regras fiscais e trabalhistas diferentes das atuais que, como já está mais do que provado, inviabilizam a implantação de negócios saudáveis no Brasil. Parece muito para ser feito ao mesmo tempo e é mesmo. Mas outra oportunidade como esta, de construir uma casa sólida a partir do alicerce, ao invés de erguer os puxadinhos habituais, talvez não apareça novamente. Se aproveitarmos a terra arrasada pela pandemia e construir sobre ela as bases de uma nova economia, o sol voltará a brilhar e o Rio sorrirá outra vez.

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