A proteção à propriedade intelectual
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A proteção à propriedade intelectual


Anthony Levandowski foi uma figura central na  tecnologia de veículos autônomos, trabalhando inicialmente para o Google em seu projeto de carro autônomo, que mais tarde se tornou a Waymo. 

Em 2016, ele deixou o Google para fundar sua própria startup, Otto, focada em caminhões autônomos, que foi rapidamente adquirida pela Uber. Levandowski foi acusado de baixar mais de 14.000 arquivos confidenciais do Google antes de sua saída, envolvendo segredos comerciais cruciais relacionados à tecnologia LiDAR, utilizados posteriormente para beneficiar a Uber. 

Em 2019, ele foi formalmente acusado de 33 crimes de furto, e tentativa de furto de segredos comerciais, dos quais ele se declarou culpado de um, em 2020. Levandowski foi condenado a 18 meses de prisão, mas para sua sorte a sentença foi adiada devido à pandemia de COVID-19. Antes de cumprir a sentença, em janeiro de 2021, ele recebeu um perdão presidencial de Donald Trump. Mesmo assim, cabe a pergunta: quantos países dariam duras sentenças por concorrência desleal? 

O sistema de proteção da  propriedade intelectual, como o sistema de patentes, vive um eterno paradoxo. Imagine uma empresa hipotética que investiu, durante 20 anos, dez bilhões de dólares para desenvolver uma fórmula para curar uma determinada doença que atinge principalmente as zonas mais pobres do país. 

Após a autorização comercial da fórmula, políticos e outras partes da sociedade, motivados por interesses de curto prazo, podem ser incentivados a legislar ou criar mecanismos que burlam as proteções legais da empresa, sob o pretexto de proteger a população afetada pela doença. Se você ou eu tivéssemos um filho que precisasse de um remédio além da nossa capacidade financeira, com certeza pensaríamos da mesma forma.  

Porém, reduzir a segurança jurídica das empresas inovadoras aumenta a percepção de risco, diminui a expectativa de ganhos futuros e, consequentemente, compromete o incentivo para investir em projetos arriscados, mas potencialmente revolucionários para a sociedade.

Esta situação pode ser analisada através do dilema do prisioneiro na teoria dos jogos, onde a melhor solução coletiva é a cooperação para proteger a propriedade intelectual. No entanto, os benefícios de médio e longo prazo desta cooperação frequentemente não se traduzem em ganhos eleitorais imediatos. 

Do ponto de vista individual, um político pode se beneficiar ao "trair" o sistema, buscando ganhar a simpatia de um eleitorado significativo, apesar de que tais ações podem prejudicar a inovação futura e o bem-estar coletivo a médio e longo prazo. Diferente de outros séculos, nós estaremos vivos neste longo prazo.

Vivemos em uma era que irá definir se nós, seres humanos, seremos extintos ou não. Seja por mudanças climáticas, pandemias globais, guerra nuclear, inteligência artificial hostil, esgotamento de recursos, engenharia genética fora de controle, entre outros fatores. 

Existe uma variedade de desafios que não são categorizados como riscos existenciais, mas são problemas que impactam a vida de bilhões de pessoas. Guerras, crises econômicas, pobreza, desastres naturais, resistência a antibióticos, novas doenças, migração e crises de refugiados, desinformação, ataques cibernéticos e alterações demográficas são alguns exemplos.  

O mecanismo de proteção à propriedade intelectual é a forma que temos para incentivar as pessoas a darem o melhor de si, se empenhando para solucionar a diversidade de questões que afligem os seres humanos.  

As boas notícias é que conhecemos como o sistema deve funcionar. Então, onde está o problema? Os desafios da proteção da propriedade intelectual são amplificados pelo comportamento de certos países que são frequentemente citados como grandes infratores. 

Nações como China e Rússia, por exemplo, têm sido destacadas em relatórios internacionais por suas insuficiências em controlar a pirataria e a contrafação de produtos variados, desde softwares até bens de consumo. 

A eficácia do  law enforcement  contra o contrabando e a contrafação ainda enfrenta sérias limitações. A capacidade de aplicar leis relativas à propriedade industrial (PI) é desigual ao redor do mundo, com alguns países possuindo recursos e infraestrutura limitados para combater esses crimes de forma efetiva. 

O sistema legal atual tende a favorecer grandes empresas que possuem os recursos para registrar e defender suas patentes e direitos autorais internacionalmente, deixando pequenas e médias empresas, assim como indivíduos, em uma posição vulnerável.

A falta de uniformidade nas leis de PI entre diferentes países cria uma paisagem complexa para empresas que desejam ou operam internacionalmente. O processo de registro e proteção muitas vezes caros e burocráticos desincentiva o empreendedorismo. 

É extremamente difícil para uma sociedade que enfrenta tantos desafios no presente, imaginar que a solução deve ser criada e aprimorada por mecanismos sistêmicos que permitam investir em pesquisa e desenvolvimento com segurança jurídica, de forma eficiente e acessível. Infelizmente, é um pensamento abstrato que poucos se conectam. 

Para melhorar a proteção da propriedade intelectual globalmente, é fundamental cessar a produção em países que não garantem essa proteção. Uma abordagem estratégica seria formar um bloco de nações com padrões de sistemas de propriedade intelectual adotados através de acordos internacionais robustos. A implementação de tecnologias como o blockchain pode ser crucial para otimizar e tornar mais eficientes os processos de registro e gestão de propriedade intelectual, trazendo maior transparência e segurança.

Além disso, a privatização do sistema jurídico pode contribuir para aprimorar a capacidade de resposta e inteligência deste sistema. Os países que fazem parte deste bloco devem estabelecer padrões rigorosos de aplicação das leis de propriedade intelectual, incluindo um orçamento mínimo dedicado, indicadores de desempenho chave (KPIs) para avaliar a eficácia, divulgação pública desses indicadores e penalidades claras para o não cumprimento dos mecanismos de execução pelo estado ou entidades privadas responsáveis (como no mecanismo de concessão).

É também vital que as empresas recebam proteção robusta no que diz respeito aos contratos de confidencialidade, especialmente em relação a colaboradores que migram para concorrentes ou se envolvem em práticas de concorrência desleal. PI também depende de uma cultura robusta, que tenha vergonha de usar algo contrabandeado e contrafeito, que entende que para ter uma sociedade melhor, precisamos dessas normas sociais. 

Assegurar um ambiente no qual os direitos de propriedade intelectual sejam respeitados e protegidos eficazmente é essencial para fomentar o desenvolvimento econômico sustentável e para criar soluções aos desafios que enfrentamos e aqueles que estão por vir. É nossa obrigação moral com as próximas gerações. 

Parte da razão que Anthony foi solto é que ele mostrou o total arrependimento de suas ações. Ele descobrirá, se já não o fez, que é possível competir e vencer concorrendo dentro das regras do jogo, e que isso beneficia toda humanidade, no presente e no futuro. 

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