A ausência brasileira, em alto nível, na COP-26, a mais importante conferência sobre o clima dos últimos tempos, converteu o Brasil em objeto do desprezo internacional. Desta vez saímos da condição de pária, para a de inimigo.
O chefe do governo britânico, Boris Johnson, perguntado abertamente no evento sobre o que aconteceria caso o Brasil não cumprisse as metas previstas e acordadas na conferência, foi direto ao dizer "temos meios comerciais de responder a qualquer país desobediente nesse sentido".
Todos sabem que não há nada legítimo ou sério nas promessas governamentais para redução total do desmatamento até 2030.
A aliança com grileiros, garimpeiros, madeireiros e fazendeiros é mais importante para a sobrevivência da diplomacia miliciana do que os interesses nacionais e globais.
Ao menos durante os próximos quatorze meses, os esforços seguirão na direção contrária, pois não há a menor preocupação no Planalto com as mudanças climáticas ou com as consequências dos desastres ambientais.
A hipocrisia da diplomacia miliciana não engana ninguém em Glasgow, e o Brasil segue na contramão da história.
Cada um dos líderes e cientistas das principais nações e praticamente todos os agentes globais que cuidam do meio ambiente estavam presentes. Menos, naturalmente, o Brasil do Messias que se ausentou propositadamente de maneira covarde.
Assim continuamos desgastados e desprezados após décadas de protagonismo desde a Rio 92, já que nenhum plano efetivo de controle da devastação, na Amazônia e no Pantanal, foi apresentado no encontro internacional.
A expectativa mundial de o Brasil ter uma estratégia consolidada e eficiente para acabar com as explorações ilegais nessas regiões foi frustrada apesar das declarações de chefes indígenas.
Sobre a guerra promovida pelo garimpo e a inércia das autoridades locais para pôr fim ao embate fechamos os olhos aos abusos.
O trágico isolamento brasileiro promovido pela diplomacia miliciana, demonstra as evidências do desprezo pela causa da conservação ambiental.
Numa iniciativa paralela, uma coalizão de empresários e ONGs, além de governadores, tentaram salvar o país de um completo fiasco. Esse grupo levou à reunião alternativas locais e independentes de combate aos crimes ambientais.
A coalizão tentou adotar um tom propositivo, embora saiba que não estão descartadas as iniciativas punitivas contra países em desenvolvimento que, como o Brasil, romperam as metas acertadas.
A pedalada climática, promovida desde o ano passado, tentando empurrar para a frente as taxas de redução das emissões de gases, soou como um alarme para a comunidade internacional que reduziu as emissões em sete por cento.
O Brasil seguiu aumentando o volume das emissões de gases em um ritmo de novo por cento em 2020.
Graças à diplomacia miliciana, o país deverá levar anos para ser visto novamente de forma positiva e recuperar a reputação perdida nos últimos três anos.
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Os efeitos dos gases estufa lançados na atmosfera brasileira, nos últimos dois anos, praticamente dobraram graças ao descaso nacional.
O desgoverno apoia o avanço dos garimpeiros sobre terras indígenas e desmontou completamente as agências fiscalizadoras do meio ambiente ao deixar correr soltas as práticas do desmatamento além das queimadas.
A Amazônia teve um território, do tamanho dos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, devastado enquanto se tenta vender uma falsa imagem de preservação ambiental.
A retórica negacionista do Planalto acarretou mais uma humilhação internacional e vai exigir, a partir de 2023, grandes esforços da diplomacia brasileira.
Creio que não estamos condenados, pois já há extraordinárias mudanças em curso, apesar da resistência de pessoas como Trump e o Messias, e estamos no caminho certo apesar de certos grupos negacionistas.
Até quando vamos, no Planalto, ignorar as mudanças climáticas que já começam a incidir diretamente na agricultura, afetando colheitas ou alterando o plantio?
Até quando vamos negar que o futuro surge do presente (ou até do próprio passado) e não é algo ao acaso, vindo milagrosamente do nada?
Os combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, estão aquecendo o planeta muito acima dos limites máximos toleráveis, mas continuamos a explorá-los, porque são monetariamente "baratos" e tecnicamente "fáceis".
Nos últimos anos, sentimos a expansão das ondas de calor, estiagens prolongadas alternadas com tempestades e inundações brutais e alagamentos, além do aumento dos incêndios florestais e até secas na chuvosa região amazônica.
Grileiros e garimpeiros, apoiados pelo Planalto, continuam a desmatar a Amazônia em busca de ouro, poluindo rios com mercúrio.
Até o estratégico Instituto Nacional de Pesquisas Especiais sofreu consequências da funesta política ambiental do atual grupo no poder em Brasília.
O contrabando de madeira amazônica se intensifica com a conivência dos que deveriam combater esse crime como o anterior titular da pasta do Meio Ambiente.
A retórica de confrontação, adotada pela diplomacia miliciana, aliena o Brasil das relevantes decisões internacionais e nos faz perder o nosso lugar no mundo.
Parece-me impossível que haja uma reversão da política climática brasileira até o fim do próximo ano. No ano de 2022, podemos ter novos recordes de queimadas e emissões, assim como de devastação florestal.
Em um futuro, não muito distante, países que contribuem para as mudanças climáticas estarão sujeitos a sanções internacionais afetando o agronegócio brasileiro. O Congresso norte-amareicano está analisando um projeto de lei nesse sentido, assim como o Parlamento europeu.
Há um ceticismo generalizado e desconfiança em relação à atual administração instalada em Brasília. Como dizia George Orwell, "quanto mais a sociedade se distancia da verdade, mais ela odeia aqueles que a revelam".