Astrobiologia e a procura científica por vida em outros planetas

Como o estudo por procura por vida em outros planetas tem mudado e quais os próximos passos?

Foto: NASA/ESA/CSA/STScI
Imagens tiradas pelo James Webb

Quando falamos em buscar vida em outros planetas, algumas imagens mentais já são formadas em nossas mentes — principalmente no fértil imaginário popular brasileiro. A imagem de olhos brilhantes e um repórter entrevistando o saudoso ‘ E.T. Bilú ’, ou a mais recente aparição de corpos de seres minúsculos mumificados no México , logo pipocam, trazendo um sabor agridoce sobre o que se espera sobre a temática.

Mas se distanciando desses exemplos, o estudo por vida fora da Terra vem ganhando cada vez mais espaço na academia, com estudos sérios para conseguir compreender como, onde e de que forma esses seres vivos poder estar se desenvolvendo em outros astros. 

Dentre os principais campos científicos que visa estudar a possibilidade de vida extraterrestre está a astrobiologia. 

O que é astrobiologia?

A definição do termo astrobiologia, segundo a Academia Brasileira de Letras é: “Área de pesquisa científica que estuda a origem e a evolução da vida na Terra e investiga a presença de formas de vida no Universo”. 

Inicialmente, o estudo da Astrobiologia surge em meados dos anos 1950 e 1960, com o nome Exobiologia. A data é marcada pela corrida espacial, e, consequentemente, a chegada do homem a outros astros por meio de equipamentos de observação. 

O momento da chegada do homem ao espaço quebra uma barreira que antes era puramente especulativa, que girava em torno de teorias conspiratória e ufologia, e ganha um caráter científico com a possibilidade de estudar e provar algo. 

O estudo da Exobiologia então se estende até meados dos anos 1970, com foco em achar vestígios de vida em Marte, por ser um alvo ‘fácil’. O professor doutor do Departamento de Química Fundamental da USP, Fabio Rodrigues, explica que a falta de sucesso nas missões feitas em Marte vira uma chave na maneira que o estudo por vida fora da Terra são feitos. Eis que surge a questão: “elas não têm sucesso em encontra vida porque não existe vida, ou porque a gente não sabe como procurar, onde procurar e o que procurar?”

Então, no final do século XX, surge a Astrobiologia com outro enfoque. Agora, procura-se entender a vida como ela é no nosso planeta —  surgimento, condições evolucionárias e condições para a sobrevivência —, e entender os ambientes extraterrestres. Dessa forma, consegue-se entender se os ambientes extraterrestres são habitáveis, “capazes de abrigar vida e não necessariamente habitados”.

O campo da Astrobiologia junta pesquisadores de diferentes áreas —  Geologia, Química,  Física, Astronomia, Biologia, Ciência Atmosférica, Oceanografia, Ciências Planetárias, entre outros — visando fazer um estudo complexo sobre essas condições.

“[O pesquisador] precisa ter uma abordagem multidisciplinar, conversar com diferentes áreas e entender as diferentes linguagens. Por exemplo, eu não sei fazer pesquisa em exoplanetas, eu sou pesquisador que foque em química, eu não sei fazer uma pesquisa que um astrônomo faz no planeta. Mas eu sei usar o resultado da pesquisa que eles fazem, para eu conseguir entender [a minha área de pesquisa]”.

Desafios técnicos

Foto: Foto: Reprodução/Northrop Grumman/NASA - 08.07.2022
O telescópio James Webb vai investigar Júpiter e algumas de suas luas

O avanço tecnológico é primordial para o avanço dos estudos. Para o professor, “quando novas tecnologias surgem, novas visões de mundo surgem”. Um exemplo disso são as imagens do Telescópio Espacial James Webb da Nasa , que vem detectando pistas sobre vida em outros planetas além do Sistema Solar.

As missões marcam uma nova “corrida espacial”, de pesquisadores que estão na constante busca pela maior descoberta científica de todos os tempos. 

Os telescópios espaciais surgem com a capacidade de analisar as atmosferas dos planetas, o que gera novas informações para os pesquisadores conseguirem avançar nas pesquisas dentro do campo da Astrobiologia. 

Recentemente, foi descoberto um possível sinal de um gás comum na Terra, que é produzido por organismos marinhos simples, em um planeta chamado K2-18b, a 120 anos-luz do nosso Sistema Solar . Além do possível gás, o planeta se encontra em uma zona chamada pelos astrônomos de “Cachinhos Dourados”, que se refere a distância ideal entre o planeta e a estrela em que orbita, evitando que a superfície do astro não seja nem muito quente, nem muito fria. Ideal para o surgimento de vida.

Ainda que o James Webb tenha uma grande aproximação para detectar os exoplanetas, ele ainda não consegue detectar pequenos astros ou que estejam muito próximos a sua estrela, devido ao brilho intenso. Por isso, a NASA está criando o Observatório de Mundos Habitáveis, que está previsto para ser lançado nos anos 2030. O equipamento deverá solucionar tais problemas, e avançar nas questões sobre procura de exoplanetas.

Estudos na Astrobiologia

O professor explica que os estudos laboratoriais e de observação são o primeiro passo nas pesquisas, para que então as missões espaciais sejam efetuadas, sendo elas o último passo no estudo.

Rodrigues também ressalta que pela proximidade e pelo fato de serem extremamente interessantes, as pesquisas em Astrobiologia atualmente são bastante focadas em Marte e em algumas luas de Saturno, como Europa . “Temos focado em ambientes mais ou menos do tamanho da Terra, rochosos  não — adianta um planeta gasoso, pois achamos que não suportam a vida — temperaturas amenas, que tenha água, carbono, matéria orgânica e energia”.

Além de missões para as luas geladas de Saturno para exploração e o retorno de amostras de Marte , o professor cita os grandes telescópios como alguns dos meios de estudo que estão sendo desenvolvidos. “Na Terra, temos a miniaturização de equipamentos — tanto estudos em campo como poder ter mais equipamentos que vão para Marte —, o aprofundamento do estudo da biodiversidade do planeta e dos limites da vida e dos mecanismos de vida”, completa Rodrigues.

“Hoje estamos em pensando mais na exploração espacial, em usar micro-organismos, por exemplo, para levar para uma colônia em Marte, e produzir oxigênio. Então, está se pensando, não para agora, mas para o futuro, para nós podermos explorar outros planetas.”

Quando questionado sobre o que poderia significar o surgimento de vida em outros planetas, Rodrigues explica: “Toda vida da terra é muito parecida, a gente acredita teve uma origem em comum. Então, desde uma grande baleia, até uma planta e até uma bactéria, a vida é muito parecida. Então, quando a gente fala em achar um outro modelo de vida, talvez a gente consiga ter uma teoria mais completa do que é vida! Se ela for parecida com a Terra, entenderemos que a vida é uma solução única. Agora se ela tem um jeito diferente, ela tem um funcionamento muito diferente, poderemos entender que vida é uma coisa mais ampla!”

Ufologia e aliens na mídia

Foto: Reprodução/@Astronomiaum/ND
Suposto extraterrestre exibido por ufólogo no México

Como em diversas áreas, em um determinado momento em que sai da especulação e se passa para a experimentação, há uma quebra do que é tratado como científico e o que é pseudociência. Alguns exemplos são a química e a alquimia, a astronomia e a astrologia, e, neste caso, a ufologia e a astrobiologia.

A ufologia trabalhava em um campo muito mais filosófico e especulativo sobre a possibilidade de vida extraterrestre. Mas, com o avanço das tecnologias, surgimentos de telescópios e a possibilidade de se aplicar o método científico na área de pesquisa, elas começam a se distanciar cada vez mais.

“Essas teorias conspiratórias, elas acabam surgindo até pelo próprio método científico, pois ciência demora para dar resposta [...] Então, normalmente isso surge como uma tentativa até de aplacar essa grande ansiedade”, explica o professor. 

“A Sociedade Brasileira de Astrobiologia, tem bastante ciência disso. Sabemos que é uma área  que traz muito interesse, e se a gente não produz divulgação científica de qualidade, vão ter materiais que não são de qualidade. Então o que é importante é a divulgação científica, é importante explicar o método científico, para que não pareça uma teoria da conspiração que se propague de forma mais forte do que as teorias científicas”.

O professor finaliza dizendo que a nova corrida espacial em que o mundo passa, com novos agentes surgindo constantemente, será o início de nos dilemas para as futuras gerações. “Tá crescendo a área do direito espacial, então o ser humano vai se deparar com essas questões que vão ter que respondê-las. O que a gente quer: preservamos Marte para buscar vida, ou fazemos missão de fazer uma colônia, ‘contaminando’ o planeta, em um esquema de se a gente achar a vida vai ser a vida que a gente mesmo colocou lá?”