Caminhão usado na manifestação de 7 de setembro
Reprodução/YouTube Denilso Castro 14.08.2022
Caminhão usado na manifestação de 7 de setembro

Youtubers e candidatos bolsonaristas que disseminam discursos de teor golpista, lideranças evangélicas e do agronegócio articulam o financiamento dos atos do 7 de setembro, com pautas alinhadas ao presidente Jair Bolsonaro (PL), que busca a reeleição. Na plataforma de vídeos, além de frases evocando a participação das Forças Armadas para assegurar “eleições limpas”, são divulgadas chaves Pix, para turbinar as manifestações.

A data, em que se celebra o Dia da Independência, já foi marcada no ano passado por manifestações de cunho antidemocrático com participação do chefe do Executivo. Desta vez, com a corrida eleitoral em curso, os diferentes grupos que pretendem ir às ruas variam entre iniciativas de apoio direto a Bolsonaro, como o aluguel de um trio elétrico pelo pastor Silas Malafaia no qual o presidente deve discursar no Rio, até a instalação de outdoors contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). No caso de influenciadores digitais do bolsonarismo, há convocações que citam a “ruptura institucional”.

No sábado, às vésperas dos atos, Bolsonaro chamou de “vagabundo” quem deu “canetada” autorizando operação da Polícia Federal contra empresários bolsonaristas, numa alusão ao ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No último mês, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão, autorizados por Moraes, contra empresários que compartilharam mensagens de caráter golpista no WhatsApp.

"Não é porque tem um vagabundo ouvindo atrás da árvore a nossa conversa que vai querer roubar nossa liberdade. Agora, mais vagabundo do que esse que está ouvindo a conversa é quem dá a canetada após ouvir o que ouviu esse vagabundo", disse Bolsonaro.

Ataques ao Judiciário são a tônica de publicações de youtubers bolsonaristas que pedem apoio financeiro para os atos. Em um desses vídeos, intitulado “Ruptura à vista” e postado na quinta-feira no Canal Ed Raposo, com 299 mil inscritos, o apresentador cita um eventual pedido de quebra de sigilo financeiro contra Bolsonaro por conta das denúncias envolvendo compra de imóveis em dinheiro vivo pela família do presidente. Ele, então, afirma, que, se Morares decretar a medida, haveria “um momento de ruptura institucional definitiva”.

O Pix tem sido usado por bolsonaristas que buscam uma estrutura mais robusta para os atos. Um dos candidatos que tem recebido doações para a manifestação é Alan Lopes Santana (PL), que disputa uma vaga na Assembleia Legislativa do Rio. Com a ferramenta, ele tem arrecadado por meio da ONG Instituto Intelectos, aberta em março de 2021 para, diz, “desmistificar o Brasil para os brasileiros”. Santana apresenta um programa no canal bolsonarista no YouTube Todo Poder Emana do Povo, com 149 mil inscritos, e também é o favorecido identificado na chave Pix divulgada no Canal Ed Raposo.

Os canais Vista Pátria (751 mil inscritos), de Allan Frutuozo, e Francisco Mello Oficial (126 mil inscritos) também buscam reforçar a estrutura do evento com doações via Pix. Os discursos de convocação incluem acenos às Forças Armadas para “garantir eleições limpas”, frase que costuma embutir a intenção de não aceitar um resultado que não seja a reeleição de Bolsonaro, segundo colocado nas pesquisas de intenções de voto.

"Imagine você, os militares desfilando, muito perto do povo, prestando continência, e as pessoas ali gritando ‘salva o Brasil, queremos eleições limpas’. A gente sabe que tudo isso vai mexer muito com as Forças Armadas, e eles sabem disso também", afirma Santana, em um de seus vídeos.

Na reunião entre a Polícia Militar e organizadores do ato de 7 de Setembro previsto para a Avenida Paulista, militantes sugeriram unificar a pauta de todos grupos que compareceram ao encontro em torno da punição de ministros do STF. Não se chegou, contudo, a um consenso, já que o major que conduzia a reunião interrompeu a fala.

A ideia vem de Marcos David Figueiredo de Oliveira, do grupo Moraliza, e tem respaldo entre outras lideranças que levarão caminhões de som para a avenida. É o caso do sargento Paulo Roberto Roseno Júnior, candidato a deputado federal pelo PRTB. Ele defende que Bolsonaro “acione as Forças Armadas para destituir os onze ministros do STF”.

"A ação que a gente prega é o cara (Lula) não assumir. Se o Bolsonaro der um chute no balde e acabar com tudo, eu estou dentro", afirmou ao GLOBO após a reunião.

Outro foco de mobilização para os atos está em entidades do agro. O Movimento Brasil Verde e Amarelo, que representa cerca de 200 associações rurais, e que tem entre seus motes pedidos de impeachment de ministros do STF, financiou outdoors espalhados por Brasília. Sob os dizeres “é agora ou nunca”, eles trazem convocações para o ato que ocorrerá na capital. No ano passado, antes de manifestações semelhantes, Moraes autorizou busca e apreensão contra o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja, Antônio Galvan, por estimular discursos antidemocráticos. Ele é uma das lideranças ligadas ao Movimento Brasil Verde e Amarelo.

Duas vertentes principais

Lideranças evangélicas, em sua maioria com discursos menos voltados para o enfrentamento com o Judiciário, também têm feito seus chamados pelas redes sociais para os atos de quarta-feira. Um dos mais envolvidos na convocação, porém, é um crítico habitual do STF: o pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo e aliado próximo a Bolsonaro.

Malafaia, que também participou da mobilização em 2021 e recentemente chamou Moraes de “desgraçado que rasga a Constituição”, pretende receber Bolsonaro em um trio elétrico em Copacabana, ponto central da mobilização bolsonarista no Rio. Haverá no local um palco, montado pela prefeitura, para que autoridades acompanhem demonstrações militares. Bolsonaro, contudo, deve deixar o palco para discursar no veículo de Malafaia.

Ainda que discursos em tom golpista sigam ecoando nas redes, a ação do Poder Judiciário conteve parte do ímpeto. Segundo dados da Novelo Data, houve redução nas menções ao 7 de setembro no grupo dos maiores canais da extrema-direita no YouTube: foram 438 citações em agosto, contra 623 no mesmo mês em 2021. Para Guilherme Felitti, autor do levantamento, o bolsonarismo procurou mobilizar sua base de formas menos expostas, focadas em comunidades fechadas:

"Para a convocatória mais direta, o bolsonarismo explora duas principais vertentes: uma que defende que o evento será o maior da história do Brasil e outra que compara os manifestantes a Dom Pedro."

Procurados, Alan Lopes, Allan Frutuozo e Éder Câmara não responderam. 

Já conhece o canal do Último Segundo no Telegram ? Entre e veja as principais notícias do dia no Brasil e no Mundo.   Siga também o  perfil geral do Portal iG 

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!