No fim de junho, poucos dias após o aborto legal ter sido realizado com sucesso na menina de 11 anos grávida, em Santa Catarina – num imbróglio que durou mais de um mês e teve repercussão internacional –, o caso, que parecia ter caminhado para um desfecho satisfatório para a família, teve ainda um novo desdobramento.
Isso porque a promotora Mirela Dutra Alberton, do Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC), conseguiu na Justiça uma autorização para que o feto fosse recolhido por policiais científicos do Instituto Geral de Pesquisas (IGP) no Hospital Universitário de Florianópolis, para realização de uma perícia encomendada por ela.
O movimento foi o último de Mirela Alberton na trama. No último dia 30 de junho, ela alegou suspeição e pediu para deixar o caso, que corre sob sigilo, com a justificativa de garantir a imparcialidade no decorrer das investigações. O processo que investiga sua conduta no decorrer do caso, no entanto, segue em andamento na Corregedoria-Geral do órgão.
O GLOBO apurou com fontes que uma das questões que o MP ainda busca solucionar é em relação à paternidade. Apesar da investigação da delegacia de Tijucas (SC) ter concluído que a menina engravidou de uma outra criança, de 13 anos, que vivia na mesma casa, um teste de DNA busca comprovar ou não de vez a história.
O padrasto da menina, com quem ela convive a vida inteira, desde que o pai biológico abandonou a família, chegou a ser suspeito de ter cometido crime contra ela, mas, no bojo da investigação original, teve sua participação descartada pelo delegado Alison Rocha, que conduziu o caso.
Uma outra questão levantada por Mirela, de acordo com uma reportagem publicada nesta quarta-feira pelo The Intercept, é em relação à "causa da morte" do feto – apesar de todo o procedimento realizado ter sido legal.
De acordo com o portal, a promotora, em ofício de requerimento de urgência enviado ao IGP, pontuou a importância de a perícia averiguar "se houve a aplicação de cloreto de potássio para a parada dos batimentos cardíacos ainda no útero", ou seja, se foi realizada a assistolia fetal.
A garota de 11 anos tinha o direito ao aborto legal, já que por lei qualquer ato sexual praticado contra uma criança com idade menor que 14 anos é tido como estupro de vulnerável. Além disso, o procedimento foi realizado com autorização judicial e sob orientação do Ministério Público Federal, e a metodologia foi escolhida pelos médicos com base no tempo avançado de gestação.
As perícias encomendadas junto ao Instituto Geral de Pesquisas de Santa Catarina costumam levar cerca de 1 mês para ficarem prontas, segundo fontes ouvidas pelo GLOBO. A expectativa, então, é de que o resultado da análise do feto seja entregue ao Ministério Público de Santa Catarina no fim deste mês.
Em nota, o IGP disse não ter informações para divulgar sobre o caso, mas que, se a perícia foi acionada, entregará o resultado exclusivamente ao órgão competente (MP-SC). A Secretaria de Segurança Pública também disse não poder revelar detalhes sobre a investigação, por conta do segredo de justiça.
Procurado, o Ministério Público de Santa Catarina também reforçou que o processo está em segredo de Justiça e que, portanto, nem Promotoria de Justiça e nem o Ministério Público podem repassar quaisquer informações.
O MPF ponderou que a promotora poderia ter aberto o requerimento, mas, sobre as investigações, afirmou que o órgão não deve explicações ao MP estadual, já que também atuou dentro de suas atribuições constitucionais.
O Hospital Universitário, por sua vez, não comentou sobre a entrega do feto aos peitos, mas enviou uma nota, onde afirmou que "todos os atendimentos realizados no âmbito do hospital são tratados de forma ética, profissional e responsável, guardado o devido sigilo, com base nos respectivos códigos de ética profissional e em consonância com a Constituição Federal, Código Civil e Lei Geral de Proteção de Dados, e que tem cumprido integralmente as determinações do Poder Judiciário sobre o caso.
A defesa da família da menina de 11 anos não quis se pronunciar até a publicação da reportagem.
Vídeo gerou indignação
Alberton é a promotora que, em vídeo publicado pelo portal The Intercept, no mês passado, aparece ao lado da juíza Joana Ribeiro Zimmer tentando convencer a criança e a mãe dela a continuarem com a gravidez durante uma audiência.
Com foco desviado do tema central do encontro, que era a discussão sobre a manutenção ou não da menina num abrigo para preservar sua segurança, elas perguntaram se a garota aceitaria "ficar mais um pouquinho" com a gestação e, em dado momento, Mirela prestou informação equivocada à família, quando disse que, após a interrupção da gravidez, o feto sairia com vida e sofreria até a morte sob a observância da equipe médica.
Após a repercussão do caso, Joana Zimmer foi atuar em Brusque, após, segundo ela, ter recebido uma promoção no TJSC.
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