Escritório de Direitos Humanos da ONU em Genebra, na Suíça
Jean-Marc Ferré/Onu
Escritório de Direitos Humanos da ONU em Genebra, na Suíça

A decisão do Comitê de DDHH da ONU, comunicada ao governo brasileiro na semana passada, chancela não apenas as teses da defesa do ex-Presidente Lula – de que ele sofreu perseguição política travestida de processo jurídico –   como também põe em cheque a legalidade das eleições de 2018 e tudo o que veio depois.

Ao menos do ponto de vista da memória histórica, a decisão da ONU traz a possibilidade de imaginar que, se não fosse a Lava Jato e a conexão com a mídia, viabilizada pela complacência de instituições e de setores do poder judiciário em diferentes instâncias, não haveria Jair Bolsonaro. Todos os cenários daquele ano apontavam para a vitória de Lula e a continuidade do projeto de sociedade por ele iniciado em 2003, apenas interrompido pelo golpe de novo tipo sofrido por Dilma Rousseff em 2016.

Ressalvo que não significa defender a plenitude do mandato, se acertado ou não, mas a fórmula da abreviação do mandato atentou contra a Constituição de 1988 e contra a lei específica que autoriza a realização do juízo político quando presentes as condicionantes jurídicas, colocando a perder a estabilidade das regras do jogo democrático.

Sabemos que qualquer reparação do Estado ao ex-Presidente Lula por força da decisão internacional nunca poderá restituir os direitos que lhe foram usurpados em 580 dias de cárcere, sem falar nos especiais momentos de dor que viveu e na tentativa de apagar, em vida, sua biografia e seu legado político.

Também à sociedade brasileira não serão restituídos os direitos coletivos de participação política que lhe foram negados. Não há o que possa compensar os golpes dentro de golpes facilitados pela aliança de setores oportunistas, que organizaram as reformas e armadilhas legislativas para operar a sonegação de direitos e da soberania.

Se há uma mensagem da ONU para as instituições do Estado é a de que brincar com o descumprimento de regras essenciais do Estado é perigoso: uma vez que se instaura o caos, não há como parar, ficamos reféns do precedente.

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Então, as eleições de 2022 ganham uma importância muito maior, pois as instituições reguladoras das regras eleitorais estarão muito pressionadas e, como democratas, não há que se hesitar sob nenhum pretexto.

Se as instituições foram negligentes em 2018, agora já não cabe alegar qualquer descuido para que a democracia ganhe passo. Isso vale no repúdio contundente e explícito a qualquer um que atente contra a normalidade das instituições, de parlamentares a militares boquirrotos, e a qualquer esforço de naturalizar golpes e desestabilização.

Isso vale para qualquer espaço, do grupo da família às entidades profissionais, como a minha, a jurídica, que por vezes cai na tentação de defender a neutralidade quando se apresentam projetos mutuamente excludentes de sociedade. 

Não são tempos para a covardia e menos ainda para temer golpes de militares em pijamas. É chegada a hora de defender inclusive as Forças Armadas, em franco processo de desmoralização pela incompetência manifesta em todas as áreas que deveriam ser de atribuição civil.

O que nos resta, como processo restaurativo visando o futuro, são as eleições deste ano e a lição que duramente aprendemos como sociedade que definha, que padece em todas as frentes e que encontrará no processo eleitoral a única saída para recolocar a bola no meio do campo e recomeçar a jogar a partida da democracia.

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