Caso Flordelis: conheça a família e veja quem é quem no banco dos réus

Dois herdeiros já foram condenados, e outros três vão a julgamento nesta terça-feira, ao lado de ex-PM e sua esposa; já a ex-deputada será julgada daqui um mês

Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil - 23.11.2021
Caso Flordelis: de filhos de pastora a ex-PM, saiba quem é quem no banco dos réus

Da numerosa família de Flordelis dos Santos de Souza, nove pessoas estão presas, incluindo a ex-deputada, acusadas de envolvimento na morte do pastor Anderson do Carmo e em tentativas de atrapalhar as investigações do caso. Do total de 55 filhos que a pastora afirma ter, sete estão atrás das grades, além de uma neta.

O plano envolveu ainda pessoas fora da família: um ex-policial militar que ficou preso junto com dois filhos de Flordelis, além da mulher dele. Anderson do Carmo foi assassinado a tiros na madrugada de 16 de junho de 2019, na garagem da casa da família em Pendotiba, Niterói. As investigações demonstraram que, antes mesmo da execução, o grupo já vinha tentando matar a vítima por envenenamento.

A motivação do crime, segundo as autoridades, foi o controle que a vítima fazia das finanças e a administração rigorosa da casa, o que desagradava Flordelis e outros integrantes da família. Veja, abaixo, quem são os acusados de participação nessa trama.

1 – Flordelis dos Santos de Souza

Pastora e ex-deputada federal, Flordelis, de 61 anos, é acusada de ser a mandante da morte do marido, o pastor Anderson do Carmo, com quem era casada desde abril de 1998. De acordo com a denúncia, Flordelis "arquitetou toda a empreitada criminosa, arregimentou, incentivou e convenceu" os filhos e neta envolvidos no crime, simulando tratar-se de um latrocínio (roubo com resultado morte). Flordelis está presa desde 13 de agosto de 2021, dois dias após ter perdido o cargo na Câmara.

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Flordelis em sessão na Câmara dos Deputados

A ex-parlamentar é acusada também de ter financiado a arma usada no crime, além de ter, segundo as investigações, feito com que chegasse a Flávio a informação de que Anderson estava chegando em casa na madrugada do crime. Na delegacia, Flávio relatou a alguns irmãos que foi avisado por uma de suas irmãs, Marzy, sobre a chegada de Anderson. Flordelis enviou para Marzy, sua filha afetiva, uma mensagem às 3h02 do dia 16 de junho pedindo para ser acordada no dia seguinte. Para os investigadores, era apenas um código, uma vez que Marzy sequer estava em casa. Flordelis e Anderson chegaram às 3h25.

2 – Simone dos Santos Rodrigues
Filha biológica de Flordelis com o primeiro marido, o pastor Paulo Rodrigues Xavier, é considerada a fiel escudeira da mãe. Até o crime, Simone morava com quatro de seus cinco filhos na casa, com todas as despesas custeadas por Flordelis e Anderson. Há relatos de que Simone e seus filhos eram as pessoas com mais privilégios na residência.

Foto: Reprodução/O Globo 12.4.2022
Simone dos Santos Rodrigues

Simone, presa desde 24 de agosto de 2020, é acusada de ter prestado auxílio a Flordelis no plano para matar Anderson, ajudando a convencer o irmão biológico, Flávio, a cometer o crime. Ela também responde pelas tentativas de envenenamento contra a vítima e de integrar a associação criminosa comandada pela mãe. Depois do crime, uma revelação veio à tona: a filha biológica de Flordelis tinha namorado o padrasto antes de ele começar a se relacionar com a mãe.

Em 22 de janeiro do ano passado, Simone admitiu, pela primeira vez, ter planejado a morte de Anderson do Carmo. Segundo ela, tudo ocorreu sem que sua mãe soubesse. Ela afirmou, primeiro, ter cometido o crime devido às investidas sexuais da vítima e, depois, por ter sofrido abusos sexuais. As declarações na tentativa de inocentar Flordelis foram repetidas por Simone no fim de abril ao Conselho de Ética na Câmara. Apesar da confissão, Flordelis continua sendo considerada mentora do crime pelo Ministério Público e Justiça.

Simone foi casada com um irmão afetivo, André Luiz de Oliveira, que chegou à casa de Flordelis quando a deputada ainda morava no Jacarezinho. O casal, que começou a se relacionar no início dos anos 90, registrou como filha, em 1993, a primeira criança acolhida por Flordelis, Rayane dos Santos, que a deputada diz ter tirado de um lixão. André e Rayane também estão presos, acusados de envolvimento no plano para matar Anderson.

3 – Marzy Teixeira da Silva

Filha afetiva de Flordelis e Anderson, foi morar na casa da família em 2007, quando frequentava o Ministério Flordelis. Segundo Marzy, o convite  para fazer parte da família partiu de Anderson do Carmo. Ela tinha adoração por Flordelis e, em sua lista de contatos, a ex-deputada estava salva como "minha rainha". De acordo com testemunhas, Marzy seria capaz de qualquer coisa para agradar Flordelis e ter seu amor.

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Marzy Teixeira da Silva

A própria Marzy admitiu à polícia ter tentado cooptar o irmão, Lucas Cézar dos Santos, para matar o pastor Anderson do Carmo, mas o rapaz se negou a cometer o crime. A investigação aponta que ela agiu a mando de Flordelis, o que a filha afetiva da ex-deputada nega. Para os investigadores, Marzy auxiliou Flordelis no plano para assassinar a vítima, além de ter tentado matar o pastor por envenenamento. Ela ainda é acusada de fazer parte da associação criminosa comandada por Flordelis.

Testemunha do caso, Luana Vedovi Pimenta, esposa de Wagner Andrade Pimenta, o Misael, revelou que Marzy lhe confidenciou que iria presa, mas jamais entregaria Flordelis. Ela tinha um relacionamento conturbado com pastor Anderson do Carmo, já que foi acusada de cometer furtos na casa e chegou a confessar um deles.

Ela foi punida pelo pastor, que a retirou das funções da igreja e chegou a vetar a sua participação em eventos da família. Anderson costumava reclamar da postura de Marzy inclusive na frente de pessoas de fora da família, despertando o ódio da filha afetiva. Atualmente, os advogados de Flordelis também defendem Marzy, atrás das grades desde agosto de 2020.

4 – Rayane dos Santos Oliveira

Primeira criança acolhida por Flordelis, ainda no início dos anos 90, Rayane era considerada o xodó de Anderson do Carmo e constantemente tinha sua história contada em pregações da vítima. Rayane foi registrada como filha por Simone, filha biológica de Flordelis, e por André Luiz, por quem ela foi criada. A jovem nunca passou por um processo de adoção formal.

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Rayane dos Santos Oliveira com Flordelis

Rayane, também presa desde agosto de 2020, era muito próxima de Flordelis e Anderson. Após a eleição da avó, se mudou para Brasília com o marido, que ganhou um cargo no gabinete de Flordelis. O casal vivia no apartamento funcional da pastora na capital federal, onde Rayane foi presa.

Rayane é acusada de também ter tentado cooptar Lucas Cézar dos Santos, seu tio, para matar Anderson do Carmo após o rapaz ter recusado a proposta da irmã Marzy. Ela ainda é acusada de ter pedido contato de um criminoso para outra tia, Érica dos Santos.

A filha de Simone é também acusada de ter sido a responsável por contratar um matador de aluguel que chegou a ir até a porta da igreja para matar Anderson, mas o plano precisou ser abortado. Rayane responde por homicídio triplamente qualificado, por ter participado do plano para executar a vítima, e associação criminosa. A jovem também é defendida pelos mesmos advogados de Flordelis.

5 – Flávio dos Santos Rodrigues

Filho biológico de Flordelis com o primeiro marido, Paulo Rodrigues Xavier, tinha grande proximidade com a mãe, mas não com o padrasto. Foi preso no dia seguinte à morte de Anderson por causa de um mandado de prisão do Juizado de Violência Doméstica. Por ter descumprido uma medida protetiva que o proibia de manter contato com a ex-mulher, teve a prisão decretada e estava foragido. A Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo, ao investigar a morte do pastor, descobriu o mandado contra Flávio, que foi capturado no enterro do padrasto.

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Flávio dos Santos Rodrigues

Dois dias após sua prisão, ele admitiu em depoimento ter matado Anderson. A confissão aconteceu depois de os policiais terem encontrado a arma do crime em seu quarto, na casa de Flordelis. Flávio afirmou ter ficado com raiva de Anderson após ter ficado sabendo que ele tinha abusado de uma de suas sobrinhas. Logo após a confissão, a defesa do filho de Flordelis passou a afirmar que o rapaz tinha sido torturado para fazer a revelação.

Durante o primeiro julgamento do caso, em novembro do ano passado, Flávio foi condenado a 33 anos e dois meses de prisão por ser o executor do pastor Anderson do Carmo. Ele ainda respondeu por porte de arma de fogo de uso restrito e associação criminosa. No mesmo júri, foi condenado Lucas Cézar dos Santos Rodrigues, filho adotivo de Flordelis e Anderson. Ele foi acusado de ajudar Flávio a comprar a arma do crime.

6 – Lucas Cézar dos Santos de Souza

O rapaz de 20 anos é filho adotivo de Flordelis e Anderson e chegou à casa da família quando tinha 12. Lucas foi adotado com seus quatro irmãos biológicos, que moravam com uma tia em Itaboraí após a morte da mãe.

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Lucas Cézar dos Santos de Souza (ao centro, de branco) durante reconstituição do crime

Quando ainda era adolescente, o rapaz se envolveu com o tráfico de drogas e saiu da casa da família em Pendotiba, passando a morar sozinho. A partir de então, Lucas passou a ter muito atritos com Anderson, que não aceitava seu envolvimento com a venda de drogas.

Lucas foi capturado em flagrante pela Polícia Civil em março de 2019, três meses antes do assassinato do pai. Liberado para responder em liberdade, deixou de se apresentar à Justiça, que decretou sua busca e apreensão. Dessa forma, o rapaz passou a ser considerado foragido.

Lucas foi preso horas após a morte do pastor Anderson por causa do mandado de busca e apreensão que havia contra ele. O rapaz tinha completado 18 anos na semana anterior ao crime. Na delegacia, foi ele quem começou a dar aos investigadores informações de que Flávio poderia estar envolvido no assassinato do pai.

Lucas afirma que Marzy e Rayane tentaram convencê-lo a matar Anderson do Carmo, o que ele teria negado. Ele foi acusado por ter ajudado o irmão Flávio na compra da pistola utilizada para matar a vítima. Ele admite ter auxiliado o irmão na aquisição da arma, mas mudou de versão sobre saber ou não que ela seria usada para matar Anderson. O filho de Flordelis foi condenado a nove anos de prisão por sua participação no crime.

7 – André Luiz de Oliveira

Faz parte do primeiro grupo de adolescentes que chegaram à casa de Flordelis, ainda na favela do Jacarezinho. André chegou como filho afetivo da ex-deputada e acabou se casando com Simone, filha biológica de Flordelis.

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André Luiz de Oliveira

André continuava morando na casa da família em Pendotiba, mesmo após ter se separado de Simone. Segundo familiares, ele auxiliava Misael na gestão das finanças do Ministério Flordelis. Ele também foi nomeado secretário parlamentar no gabinete de Flordelis quando a pastora se tornou deputada federal.

As trocas de mensagens no WhatsApp entre Flordelis e André são, para os investigadores, as provas mais contundentes da participação da ex-deputada na morte do marido. Nos diálogos, de acordo com as investigações, Flordelis deixa claro a existência do plano para envenenar a vítima e matá-la.

André é acusado de envolvimento no homicídio de Anderson e nas tentativas de envenenamento. Ele responde por tentativa de homicídio duplamente qualificado (por motivo tope e com emprego de veneno), homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, meio cruel e à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido) e associação criminosa.

8 - Carlos Ubiraci Francisco de Oliveira

Junto com André, faz parte do primeiro grupo de adolescente da favela do Jacarezinho. Ex-usuário de drogas, Carlos costuma relatar que foi salvo do vício por Flordelis e Anderson do Carmo. Mais velho do que Anderson, ele não tinha relação de pai e filho com o pastor e via a vítima apenas como uma liderança na casa.

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Carlos Ubiraci Francisco de Oliveira

Na família, Carlos tinha papel fundamental nos cuidados às crianças. Era ele quem levava todos à escola, ao médico e para tomar vacinas, por exemplo. Carlos casou com uma filha afetiva de Flordelis, Cristiana, que também chegou à casa da pastora na época do Jacarezinho.

Carlos Ubiraci é pastor e era responsável por uma das filiais das igrejas de Flordelis, a de Piratininga.  Ele também foi nomeado secretário parlamentar no gabinete da mãe  quando a pastora se tornou deputada federal.

Carlos era bem próximo a Flordelis, com quem tinha relação de mãe. Em um de seus depoimentos, ele afirmou à polícia não acreditar no envolvimento da ex-deputada no crime, mas ressaltou que se ela estivesse, "não viraria as costas nem deixaria de estar do lado dela, pois é sua mãe e ela o ajudou muito". Uma das filhas de Carlos, em seu depoimento à Justiça, afirmou que a postura de Carlos em relação à Flordelis era de submissão e dependência à ex-deputada.

André também é acusado de envolvimento no homicídio de Anderson e nas tentativas de envenenamento. Ele responde por tentativa de homicídio duplamente qualificado (por motivo tope e com emprego de veneno), homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, meio cruel e à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido) e associação criminosa.

9 – Adriano dos Santos Rodrigues

É o filho biológico caçula de Flordelis, também fruto do casamento com Paulo Xavier. Era muito próximo à mãe, a quem tentava sempre proteger nas aparições públicas após a morte do pastor Anderson. Adriano também era considerado um dos filhos mais próximos à vítima.

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Adriano dos Santos Rodrigues

O rapaz é acusado de envolvimento em uma trama na qual foi escrita uma carta, em setembro de 2019, mudando a versão dada até então para o crime. Adriano é acusado de ter sido o responsável por pegar a correspondência e levá-la até a ex-deputada.

A carta foi escrita por Lucas Cézar dos Santos, filho adotivo de Flordelis que já foi condenado por ter ajudado o irmão Flávio dos Santos Rodrigues na compra da arma usada para matar Anderson do Carmo. Flávio também já foi condenado por ter sido o autor dos disparos contra a vítima.

Na carta, Lucas assumiu a responsabilidade pela morte do pastor e isentou Flávio de participação no assassinato, apesar de o irmão ter confessado na delegacia ter sido o executor da vítima. Na carta, Lucas acusou dois outros irmãos — Wagner Andrade Pimenta, o Misael, e Alexander Felipe Matos Mendes, o Luan — de envolvimento na morte de Anderson. Tanto Misael quanto Luan acusaram Flordelis de envolvimento no crime.

Em 1o de novembro de 2019, durante audiência do caso, Lucas acabou revelando que a carta era uma farsa. Lucas acusou sua mãe de ser a responsável por escrever a carta, e afirmou que apenas copiou o texto dentro do Presídio Bandeira Stampa, no Complexo de Gericinó, Zona Oeste do Rio, onde estava preso junto com Flávio. Lucas afirma que reconheceu a letra de Flordelis no texto original e alega que o documento também estava assinado pela mãe.  Adriano responde por associação criminosa e uso de documento falso.

10 – Marcos Siqueira

Ex-policial militar, foi condenado a 480 anos e seis meses de prisão por ter participado de uma chacina na Baixada Fluminense que deixou 29 mortos. Ele está preso desde 2005. Siqueira estava no presídio Bandeira Stampa, o mesmo onde encontravam-se os filhos de Flordelis.

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O ex-PM Marcos Siqueira

De acordo com as investigações, o ex-policial militar participou do plano da confecção da carta para atrapalhar as investigações do caso. Ele é acusado de pressionar Lucas para que o rapaz copiasse o texto da correspondência e também de auxiliar Flávio e Flordelis na escolha das informações falsas que foram inseridas no documento.

11 - Andrea dos Santos Maia

A Polícia Civil e o Ministério Público apontam que a esposa de Marcos, Andrea dos Santos Maia, foi a responsável por entrar no presídio com a carta que deveria ser copiada por Lucas e de sair da unidade com a correspondência escrita pelo rapaz. Adriano foi quem buscou a carta com Andrea e levou até Flordelis. "Sua vitória está nas mãos do Adriano. Seu filho mandou", escreveu Andrea para Flordelis no dia 15 de setembro de 2019.

Foto: Reprodução/O Globo 12.4.2022
Andrea Santos Maia durante depoimento

As trocas de mensagens entre Andrea e Flordelis levaram a polícia a acusar a ex-deputada de ter armado para manipular as investigações. As conversas foram encontrados no celular da pastora, apreendido pela polícia em 17 de setembro de 2019. Nas mensagens, Flordelis e Andrea tratavam detalhes sobre a confecção da carta.

"Mas agora na hora que pegar essas provas é o advogado fazer o papel dele muito bem feito porque eles vão fazer de tudo para não dar importância, né. Então a gente tem que movimentar todas as estratégias certas para desbancar. Porque tu vai destruir a carreira dessa delegada da DH. Você sabe, né?”,  afirmou Andrea para Flordelis em um dos áudios, referindo-se à delegada Bárbara Lomba, que conduzia as investigações do caso.

Marcos e Andrea sempre negaram qualquer participação no plano, mas também respondem pelos crimes de associação criminosa e uso de documento falso. Andrea alega que seu contato com Flordelis ocorreu apenas para ajudar a ex-deputada a prestar auxílio aos filhos na prisão. A mulher do ex-PM faz parte de um grupo que ajuda familiares dos presos a levarem itens como comida, itens de higiene e roupas.

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