Filho que será julgado hoje trocou mensagens que incriminam Flordelis
André Luiz de Oliveira sentará no banco dos réus nesta terça-feira, assim como os irmãos Carlos Ubiraci Francisco de Oliveira e Adriano dos Santos Rodrigues
A partir das 9h desta terça-feira, no plenário do Tribunal do Júri de Niterói, começam a ser julgados mais dois filhos de Flordelis dos Santos de Souza acusados de envolvimento na morte do pastor Anderson do Carmo. André Luiz de Oliveira e Carlos Ubiraci Francisco de Oliveira são acusados de participação no plano para executar a vítima e foram presos em agosto de 2020, na segunda fase das investigações do caso. Além da dupla, vão a julgamento nesta terça outras três pessoas, mas por terem participado do plano de produzir uma carta para atrapalhar as investigações do caso. Junto com André e Carlos serão julgados Adriano dos Santos Rodrigues, também filho da ex-deputada, o ex-policial militar Marcos Siqueira e sua esposa, Andrea Santos Maia.
Flordelis, duas netas e uma filha, rés no mesmo processo, tiveram o julgamento marcado para o dia 9 de maio deste ano. Dois filhos da ex-deputada – Lucas Cezar dos Santos e Flávio dos Santos Rodrigues – já foram condenados pelo crime.
Anderson do Carmo foi assassinado a tiros na madrugada de 16 de junho de 2019, na garagem da casa da família em Pendotiba, Niterói. No total, Flordelis, seis filhos e uma neta são acusados de envolvimento no assassinato. Um filho da ex-deputada é ainda acusado de participação em um plano para atrapalhar as investigações do caso, com a fraude de uma carta.
André Luiz, o André Bigode
André e Carlos são filhos afetivos de Flordelis e moram com a pastora desde a época da favela do Jacarezinho, nos anos 90. Para o Ministério Público, ambos prestaram “apoio moral aos demais denunciados, incentivando e reforçando os seus planos de matar a vítima”. As trocas de mensagens no WhatsApp entre Flordelis e André são, para os investigadores, as provas mais contundentes da participação da ex-deputada na morte do marido. Nos diálogos, de acordo com as investigações, Flordelis deixa claro a existência do plano para envenenar a vítima e matá-la.
Na primeira conversa, no dia 13 de outubro de 2018, Flordelis afirma estar revoltada com uma atitude de Anderson, que teria se negado a dar carona para dois filhos e uma neta em um dia de chuva. “Por isso que passa mal. É maldade demais”, escreveu a ex-deputada. “Caramba, mãe. Na boa. Eu não tenho pena. Se morre hoje, acho que nem choro de tanta revolta que estou”, responde André.
No mesmo dia, mais tarde, Flordelis suplica pela ajuda de André. Para o delegado Alan Duarte, responsável pelas investigações, o pedido era para que o filho a ajudasse com o assassinato da vítima. “André, pelo amor de Deus me ajuda. Vamos dar um fim nisso. Me ajuda. Cara, to te pedindo, te implorando. Até quando vamos suportar esse traste no nosso meio. Independência financeira é pouco. Falta pouco, me ajuda. Por amor a mim”, escreve a pastora.
A resposta de André, para a polícia, confirma que ele aceitou fazer parte do plano de Flordelis. “Mãe, eu tô com a senhora. Não dá pra eu fazer muita coisa, mas tô com a senhora”. Ainda para o delegado Alan Duarte, durante o diálogo Flordelis se coloca como mentora do plano. “Dá. Vou te explicar, vem comigo”. Mais adiante, para a polícia, a ex-deputada faz referência ao plano para envenenar a vítima colocando substâncias em suas comidas e bebidas. “Só essa ajuda que preciso que você faça ele comer ou beber alguma coisa”, escreveu Flordelis.
Para justificar o diálogo, a defesa de Flordelis já alegou que as mensagens não foram escritas por ela, uma vez que era comum diversas pessoas usarem seu telefone celular na casa. O delegado Allan Duarte rebate essa tese, já que, segundo ele, no dia da troca de mensagens a ex-deputada voltava sozinha do Maracanã com Anderson, depois de terem assistido a um jogo do Flamengo.
Em uma outra conversa, no dia 10 de dezembro de 2018, Flordelis demonstra insatisfação com o casamento com Anderson, mas descarta uma separação, afirmando que ia “escandalizar o nome de Deus”. As mensagens foram enviadas a André pelo celular de Marzy, mas a polícia e MP afirmam ser Flordelis, uma vez que a interlocutora, no início do diálogo, identifica-se como “a mãe”.
André também é apontado por uma testemunha, Luana Vedovi Pimenta, como responsável por ter feito o pagamento de um homem contratado para matar o pastor Anderson do Carmo. Segundo Luana, o plano falhou, mas o homem exigiu o valor prometido a ele. De acordo com a testemunha, a quantia foi dada ao pistoleiro por André a mando de Flordelis. Luana é mulher de Wagner Andrade Pimenta, o Misael, filho afetivo de Flordelis também da época do Jacarezinho e que virou uma das principais testemunhas do caso.
Carlos Ubiraci, o Neném
Já em relação a Carlos Ubiraci, os investigadores afirmam ter encontrado provas de que o filho de Flordelis sabia do plano para matar Anderson, o que nunca relatou em seus depoimentos à polícia ou na Justiça. Em 18 de fevereiro de 2019, quatro meses antes do crime, Carlos recebeu uma mensagem de Anderson com o texto encontrado pela vítima em seu Ipad com um plano para matá-lo. A mensagem foi recuperada pela polícia.
De acordo com a investigação, o texto foi escrito por Flordelis para Marzy, sua filha afetiva que também é acusada de envolvimento na morte de Anderson, e encontrada pela vítima em seu IPad. Na ocasião, segundo a polícia, elas planejavam matar Anderson em uma ida do pastor ao Rio para comprar um carro. O plano acabou não sendo levado adiante porque o novo veículo não foi comprado.
No texto, os investigadores apontam que há uma menção a Carlos, que era chamado pelo apelido de Neném. ““Mas liga para o Neném e vê se está acordado e se vai fazer. Ou liga para o Lucas e coloca o terror”, diz o texto. Para a polícia, o trecho fazia menção a quem executaria Anderson.
“O que fica evidenciado nesse conteúdo, e que pode ser confirmado nos termos colhidos, é que fica claro que quem digita a mensagem é Flordelis, a qual orienta como Marzy deveria falar com Lucas ou Neném para realização do crime”, escreveu o delegado Allan Duarte em seu relatório final de inquérito.
Os investigadores apontam ainda que Carlos tinha também conhecimento do plano de envenenamento de Anderson. Luana e Misael afirmaram em depoimento à polícia e audiência na Justiça de que foram alertados por Carlos a não comer nada na casa que fosse destinado a Anderson, uma vez que estavam tentando envenená-lo.
Tanto Carlos quanto André são acusados de envolvimento no homicídio de Anderson e nas tentativas de envenenamento. Eles respondem por tentativa de homicídio duplamente qualificada (por motivo tope e com emprego de veneno), homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, meio cruel e à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido) e associação criminosa.
O Ministério Público estadual do Rio chegou a pedir à Justiça que Carlos não fosse levado a júri popular por acreditar não haver provas suficientes de sua participação nos crimes. No entanto, a juíza Nearis dos Santos Carvalho Arce discordou do pedido do MP e determinou o julgamento de Carlos.
Adriano dos Santos Rodrigues, o Pequeno
Além de Carlos e André, Adriano dos Santos Rodrigues, filho biológico caçula de Flordelis também será julgado nesta terça. O rapaz é acusado de envolvimento em uma trama na qual foi escrita uma carta, em setembro de 2019, mudando a versão dada até então para o crime. Adriano é acusado de ter sido o responsável por pegar a correspondência e levá-la até a ex-deputada.
A carta foi escrita por Lucas Cézar dos Santos, filho adotivo de Flordelis que já foi condenado por ter ajudado o irmão Flávio dos Santos Rodrigues na compra da arma usada para matar Anderson do Carmo. Flávio também já foi condenado por ter sido o autor dos disparos contra a vítima.
Na carta, Lucas assumiu a responsabilidade pela morte do pastor e isentou Flávio de participação no assassinato, apesar de o irmão ter confessado na delegacia ter sido o executor da vítima. Lucas ainda acusou dois outros irmãos — Wagner Andrade Pimenta, o Misael, e Alexander Felipe Matos Mendes, o Luan — de envolvimento na morte de Anderson.
No texto, Lucas afirmou que Misael, na presença de Luan, lhe ofereceu vantagens para “dar um susto” no pastor. Ele relatou que pediu a um amigo para fazer o serviço. “O moleque já sabia o que ia fazer, mas deu ruim”, escreveu, justificando o fato de o pastor ter sido morto. Misael e Luan não tinham sido citados por qualquer outra testemunha como suspeitos de terem participado da morte do pastor Anderson.
Em 1 de novembro de 2019, durante audiência do caso, Lucas acabou revelando que a carta era uma farsa. Lucas acusou sua mãe de ser a responsável por escrever a carta, e afirmou que apenas copiou o texto dentro do Presídio Bandeira Stampa, no Complexo de Gericinó, Zona Oeste do Rio, onde estava preso junto com Flávio. Lucas afirma que reconheceu a letra de Flordelis no texto original e alega que o documento também estava assinado pela mãe. A carta foi exibida por Flordelis ao “Fantástico”, da TV Globo, e entregue por sua defesa à polícia e Ministério Público.
Adriano responde por associação criminosa e uso de documento falso
Ex-PM Marcos Siqueira e a mulher, Andrea dos Santos Maia
De acordo com as investigações, o ex-policial militar Marcos Siqueira, também preso no Bandeira Stampa, participou do plano da confecção da carta. Ele é acusado de pressionar Lucas para que o rapaz copiasse o texto da correspondência e também de auxiliar Flávio e Flordelis na escolha das informações falsas que foram inseridas no documento.
Além disso, a Polícia Civil e Ministério Público apontam que a esposa de Marcos, Andrea, foi a responsável por entrar no presídio com a carta que deveria ser copiada por Lucas e de sair da unidade com a correspondência escrita pelo rapaz. Adriano foi quem buscou a carta com Andrea e levou até Flordelis. “Sua vitória está nas mãos do Adriano. Seu filho mandou”, escreveu Andrea para Flordelis no dia 15 de setembro de 2019.
As trocas de mensagens entre Andrea e Flordelis levaram a polícia a acusar a ex-deputada de ter armado para manipular as investigações. As conversas foram encontrados no celular da pastora apreendido pela polícia em 17 de setembro de 2019. Nas mensagens, Flordelis e Andrea tratavam detalhes sobre a confecção da carta.
“Mas agora na hora que pegar essas provas é o advogado fazer o papel dele muito bem feito porque eles vão fazer de tudo para não dar importância, né. Então a gente tem que movimentar todas as estratégias certas para desbancar. Porque tu vai destruir a carreira dessa delegada da DH. Você sabe, né?”, afirmou Andrea por Flordelis em um dos áudios, referindo-se à delegada Bárbara Lomba, que conduzia as investigações do caso.
Marcos e Andrea sempre negaram qualquer participação no plano, assim como Adriano, que afirma não saber do que se tratava a carta que foi pegar para a mãe. Marcos e Andrea também respondem pelos crimes de associação criminosa e uso de documento falso.
Marcos Siqueira era policial militar e foi condenado a 480 anos e seis meses de prisão por ter participado de uma chacina na Baixada Fluminense que deixou 29 mortos. Ele está preso desde 2005.
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