Bolsonaro reduz 'expediente', ignora crises e promove agenda de campanha

Segundo levantamento, presidente da República possui uma média de trabalho de 5h45 de compromissos públicos; em 2019, o tempo dedicado ao cargo era de 7h40

Foto: REPRODUÇÃO/AGÊNCIA BRASIL
Bolsonaro reduz 'expediente', ignora crises e se dedica a agenda de campanha

Apesar do Brasil sofrer com diversas crises ao mesmo tempo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem reservado cada vez menos do seu dia para compromissos públicos , ou seja, aqueles ligados à administração. Desde 2019, quando assumiu o cargo, o tempo de "expediente" do presidente vem caindo ano após ano.

Segundo um levantamento feito pelo Globo, em 2019, o presidente passou, em média, 7h40 do seu dia em agendas públicas. O tempo diminuiu em 2020, com a pandemia do coronavírus, para 6h10 ao dia. E, nesse ano, em meio a diversos problemas enfrentados pelo governo, como a inflação, a tensão entre os poderes, a crise hídrica e ainda o coronavírus, Bolsonaro passa, em média, 5h45 em compromissos oficiais.

O valor foi obtido por meio da subtração entre o horário final da última agenda do dia e o horário inicial do primeiro compromisso público do presidente nos meses de janeiro a agosto de cada ano. Mesmo contabilizados todos os meses de 2019 e 2020, a diminuição é praticamente equivalente.

A mudança de foco ficou visível nas últimas duas semanas: se antes o presidente reservava os finais de semana para saídas fora da agenda ou atos claramente políticos, agora Bolsonaro tem realizado manifestações ou discursos durante a semana, como motociatas. Esses atos, de caráter político ou até eleitoral, não entram na agenda pública do presidente.

Nos últimos 15 dias, Bolsonaro realizou uma motociata em Goiânia durante a sexta-feira. Na última terça-feira, repetiu a dose em Uberlândia. Em horário comercial, o presidente aproveitou para insuflar as manifestações de 7 de setembro. Durante os eventos, Bolsonaro costuma ser acompanhado de ministros e outros auxiliares.

"Lá mandaremos um retrato para o Brasil e para o mundo, dizendo para onde esse país irá. Esse país irá para onde vocês apontarem. Todos nós do Executivo, Legislativo e Judiciário tem a obrigação de estar ao lado do povo Brasileiro", afirmou Bolsonaro em Uberlândia.

A agenda pública minguando ocorreu enquanto o governo federal foi se envolvendo cada vez mais em diversas crises que atingiram o país desde o começo do ano: em primeiro lugar, a segunda onda da Covid-19, entre março e abril deste ano. Logo depois, Bolsonaro entrou em rota de conflito com outros poderes, principalmente o Judiciário. Já há alguns meses, o presidente vem atacando de forma recorrente os ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral.

O principal foco dos ataques do presidente girou em torno da tentativa de adoção do voto impresso no país, proposta rejeitada pela Câmara dos Deputados. A tensão entre os poderes, entretanto, persistiu após Moraes incluir Bolsonaro como um dos investigados no inquérito das fake news.

Além disso, nas últimas semanas, outra crise ganhou relevância: sem chuvas, o Brasil corre o risco de sofrer com apagões nos próximos meses. Até agora, Bolsonaro tem resistido a admitir a necessidade de racionamento. Por enquanto, o governo tem reajustado a tarifa de energia repetidamente como forma de conter a demanda, a chamada "bandeira vermelha". Analistas, entretanto, tem elevado o risco do país sofrer com falta de eletricidade até o fim do ano com a previsão da seca persistir até dezembro.

Apesar disso, Bolsonaro tem cada vez mais priorizado agendas particulares ou políticas. Nesta terça-feira, durante as comemorações de 7 de setembro, o presidente deve participar de apenas um evento público, o hasteamento da bandeira. Durante a manhã, Bolsonaro participará das manifestações em Brasília. Logo depois, irá embarcar para São Paulo onde, na parte da tarde, participará da manifestação na capital paulista.


Segundo Bolsonaro, as manifestações servirão como ultimato para "um ou dois" ministros do Supremo. Sem citar nomes, o presidente tem usado essa expressão para se referir aos ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso.

"Essas uma ou duas pessoas têm que entender o seu lugar. E o recado de vocês povo brasileiro na próxima terça-feira será um ultimato para essas duas pessoas. Curvem-se à Constituição. Respeitem a nossa liberdade. Entendam que vocês dois estão no caminho errado. Porque sempre dá tempo para se redimir", afirmou o presidente na semana passada.